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Duas deputadas comunistas definem pauta do governo chileno

Eduardo Thomson e Daniela Guzman

20/08/2019 16h07

(Bloomberg) -- Em um país que há muito tempo se destaca como garoto-propaganda dos princípios do livre mercado na América Latina, duas jovens comunistas recebem enorme atenção dentro do governo chileno.

Um projeto de lei de reforma trabalhista apresentado por Camila Vallejo e Karol Cariola ? que ficaram famosas como líderes do movimento estudantil há oito anos ? está obtendo apoio amplo e coloca as duas parlamentares do Partido Comunista em rota de colisão com o presidente de direita, Sebastián Piñera.

O plano da dupla é reduzir a jornada semanal máxima de 45 para 40 horas de trabalho. Para Piñera, o projeto é inconstitucional e ele prometeu contestar na Justiça se a proposta for aprovada. O presidente tem uma proposta própria que não avança.

O bilionário de 69 anos ocupa a presidência pela segunda vez. A disputa em torno da legislação trabalhista e o impasse no Congresso não são o que ele esperava para a metade de seu mandato. Ele foi eleito no final de 2017 prometendo grandes reformas que desencadeariam uma fase de grande expansão econômica. Agora, a expectativa é de redução do crescimento e as propostas de reforma tributária e da previdência estão emperradas. Enquanto isso, a guerra comercial entre EUA e China prejudica o preço do cobre, principal produto de exportação do país.

"O governo deveria estar definindo a agenda e usando seu capital político", disse Macarena Lobos, que foi vice-ministra de Finanças da antecessora de Piñera, Michelle Bachelet, em entrevista à rádio Pauta Bloomberg. "Em vez disso, está sendo empurrado para escanteio nas principais reformas."

A economia já mostra sinais de fraqueza. O banco central baixou a estimativa de crescimento em 2019 de 3,6% no início do ano para 2,8%. O principal índice do mercado acionário, o IPSA, acumula queda de 6% neste ano, enquanto o índice MSCI para mercados emergentes da América Latina tem pouca variação.

Protestos estudantisA ascensão das duas comunistas surpreende porque o presidente tem poder para decidir o que o legislativo discute.

Vallejo, hoje com 31 anos, ganhou fama quando liderou manifestações pela educação durante o primeiro governo de Piñera, que tiveram adesão de centenas de milhares de pessoas, que foram protestar também contra a desigualdade. Em resposta à movimentação popular, Piñera trocou gente no alto escalão e iniciou um novo fundo educacional, mas os estudantes não se deram por satisfeitos. A taxa de aprovação dele desabou enquanto Vallejo despontava para o estrelato no Partido Comunista e fora dele. Pesquisas realizadas em 2011 mostraram que ela era mais admirada que Bachelet ou que a revolucionária compositora Violeta Parra.

Cariola, 32 anos, outra jovem ativista do Partido Comunista, viajou pelo mundo com Vallejo também representando o movimento estudantil. Eleitas deputadas em 2014, elas se tornaram importantes figuras políticas de esquerda ? e adversárias de Piñera.

Repórteres da matéria original: Eduardo Thomson em Santiago, ethomson1@bloomberg.net;Daniela Guzman em N York, dguzman26@bloomberg.net