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Análise: Fluxo do pré-sal afunda o dólar e traz debate sobre BC

Josue Leonel, Marisa Castellani e Sabrina Valle

28/10/2019 12h09

(Bloomberg) -- O mercado debate qual o potencial efeito sobre o câmbio do megaleilão da cessão onerosa, em 6 de novembro, que pode arrecadar R$ 106 bilhões em licenças de exploração entre este e o próximo ano. Grande parte deste valor virá do exterior e o fluxo esperado tem potencial de ampliar a queda do dólar. Após cair abaixo de R$ 4,00, o próximo suporte técnico do dólar é R$ 3,94.

O real teve o maior ganho entre as moedas emergentes na semana passada com a conclusão da reforma da Previdência e a expectativa para o leilão do pré-sal. A grande dúvida é sobre qual será o papel do Banco Central diante das entradas de recursos: se fará uma compra maciça, ancorando o dólar, ou se permitirá uma baixa maior da moeda. Atualmente, o BC está vendendo dólares das reservas.

Luiz Eduardo Portella, sócio e fundador da Novus Capital, diz que o BC deve ficar de fora, em linha com o discurso da autoridade monetária de que só atua para fornecer liquidez, e não para defender um nível.

Diante do movimento de pré-pagamento da dívida corporativa externa, embalado pelos juros baixos no Brasil, Portella acredita que haverá compra no mercado para os dólares que entrarem, mas ainda assim a divisa cairia para entre R$ 3,80 e R$ 3,90. "Acho que esse fluxo vai trazer o dólar para um patamar mais condizente com os fundamentos."

Se depender da maior empresa brasileira por valor de mercado, a pressão originada destes pagamentos de dívida pode ter um alívio. A Petrobras disse semana passada, em conferência com analistas, que vai tentar mitigar o impacto no câmbio por conta da rolagem de sua dívida. "Esse impacto pode ser inclusive negativo", disse a diretora financeira da estatal, Andrea Almeida.

Discurso do BC

"Nós temos uma perspectiva de ingresso de investimentos estrangeiros significativa", disse Fernando Rocha, chefe do departamento estatística do Banco Central na semana passada, ao comentar a cessão onerosa. O presidente do BC, Roberto Campos Neto, disse durante encontro do FMI em Washington, que a instituição sempre atua no mercado de câmbio se há disfuncionalidade ou uma volatilidade excessiva. Ao mesmo tempo, ele ressaltou que o câmbio é flutuante.

Mesmo com o discurso de Campos Neto, a possibilidade de intervenção leva parte do mercado a não esperar uma queda muito aguda do dólar mesmo com o fluxo relacionado ao pré-sal.

O BC não deve ter "o menor interesse" em deixar o dólar derreter, diz Luis Eduardo Assis, ex-diretor de política monetária do Banco Central. "O BC tem total condição de controlar a oscilação de câmbio, ainda que neste caso isto signifique um aumento, que pode ser temporário, das reservas."

Para Mariana Guarino, gestora de portfólio da Truxt Investimentos, é possível que os juros baixos também ajudem a reduzir o efeito do fluxo do pré-sal sobre o dólar. "Se de fato estamos caminhando para juro real próximo a zero ou negativo, como acredito, acho difícil vermos apreciação relevante do real no curto prazo."

Entradas

O timing da entrada de recursos também pesa na análise do câmbio. O governo arrecadará o equivalente a US$ 27 bilhões caso todos os quatro blocos ofertados sejam arrematados. Nem todos os recursos virão do exterior, mesmo que todos os blocos sejam vendidos. A Petrobras tem direito de preferência em dois blocos e pretende usar um crédito com o governo de R$ 34 bilhões para fazer seus lances.

Apenas em 27 de dezembro, mais de um mês após o leilão, vencerá o prazo para as empresas pagarem a primeira das duas parcelas da compra - a outra será em 26 de junho de 2020.

Além do valor da outorga, grandes petroleiras precisarão negociar uma compensação à Petrobras pelos investimentos já realizados na área e por parte de sua produção corrente. Esses pagamentos podem adicionar o equivalente a outros US$ 25 bilhões a US$ 45 bilhões ao preço, segundo autoridades familiarizadas com planos do governo que pediram para não serem identificadas porque as informações são privadas.

Este valor não necessariamente precisa ser pago em dinheiro. A Petrobras não informa quanto espera receber, mas descartou a possibilidade de ingresso destes recursos neste ano em coletiva na sexta-feira. As regras não estabelecem como o pagamento deve ser feito. Uma possibilidade é a combinação de dinheiro, petróleo e carrego de investimentos, ao longo de muitos anos. Os contratos têm cerca de 30 anos de duração.

Mesmo com dúvidas sobre a magnitude do fluxo, o papel do BC e o efeito dos juros baixos, prevalece a ideia de que, ao menos no curto prazo, o megaleilão da cessão onerosa terá um impacto positivo no câmbio.

"Espera-se fluxo muito forte de dinheiro", diz Solange Srour, economista da ARX Investimentos. Para ela, o BC só vai atuar se houver "sinal de anomalia" no mercado e não deverá intervir de uma forma a neutralizar todo o eventual fluxo de dólares.

--Com a colaboração de Mario Sergio Lima e Patricia Lara.