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'Multas podem gerar mais discriminação', diz presidente do TST sobre diferença salarial

Maria Peduzzi diz que aumentar as multas para empresas que praticam desigualdade salarial pode gerar insegurança - Giovanna Bembom/TST
Maria Peduzzi diz que aumentar as multas para empresas que praticam desigualdade salarial pode gerar insegurança Imagem: Giovanna Bembom/TST

Idiana Tomazelli

De Estadão Conteúdo, em Brasília

11/05/2021 08h57Atualizada em 11/05/2021 18h46

A presidente do Tribunal Superior do Trabalho (TST), Maria Cristina Peduzzi, afirma que ampliar a multa aplicada a empresas que praticam discriminação salarial contra mulheres pode prejudicar o caixa das companhias em um contexto já delicado devido à pandemia.

Defensora de uma discussão mais aprofundada do tema, ela reconhece que ainda há forte disparidade de gênero no mercado de trabalho e que a questão precisa ser atacada, mas sugere medidas "educativas" ou até mesmo estímulos tributários para combater a desigualdade salarial, em vez de punições.

Qual sua avaliação sobre o projeto que amplia as multas para empresas que praticam discriminação salarial contra mulheres?

A igualdade salarial entre homens e mulheres é um preceito de natureza constitucional. E a CLT, em diversos dispositivos, reproduz o princípio da igualdade. Não é um dever moral, é um dever jurídico, legal. Apesar disso, há casos estatisticamente comprovados de mulheres que ganham menos do que os homens pelo exercício das mesmas funções e atividades.

O projeto de lei busca criar um mecanismo para viabilizar essa isonomia salarial e optou pelo caráter punitivo. O professor José Pastore publicou artigo e opina que este não é o momento de tratar de um assunto tão complexo de maneira açodada. Ele diz que o melhor seria discutir depois da pandemia, buscando soluções afirmativas mediante incentivos específicos. Tenho examinado essa questão, lido diversas opiniões. Nos países mais avançados, como na Europa, Reino Unido, França e Espanha, eles optaram pela segunda alternativa, de não punir, mas sim estimular para que não se descumpra a lei.

E como a senhora vê a questão?

Penso que estamos vivendo um momento de crise econômica que não afeta o emprego sem antes afetar o empregador. Grande parte dos empregadores, não só pequenos e médios, mas também grandes, não têm muitas vezes receita para pagar despesas de fluxo corrente. É o momento de impor mais punição aos empregadores em geral? Uma multa elevada, de até cinco vezes o valor da diferença entre o salário de homem e de mulher na mesma função...

(...) Minha opinião é de que uma multa tão pesada como essa num momento de crise pode gerar maior insegurança jurídica, maior discriminação para a mulher, e o excesso de proteção pode gerar desproteção. Estamos já certos de que a isonomia é um dever moral, é uma norma obrigatória de estatura constitucional. Por que vamos, num momento de crise, criar outro mecanismo que, este sim, pode ser discriminatório?

Que outras ações poderiam amenizar essa discriminação contra mulheres?

A lei é para ser cumprida e o Poder Judiciário existe para fazer cumprir a lei. Antes da punição, que é uma última medida, temos de considerar outras prioridades, como o estímulo. Pode ser uma prevenção, pode ser um estímulo de natureza tributária. Essa me parece uma direção primária.

Segundo, campanhas educativas. Quando se começou a falar em assédio moral..., esse (tema) não está até hoje previsto especificamente na lei e a reparação por sua prática não deixa de ser aplicada por isso. Muitas pessoas não sabiam bem o que era assédio moral. Muitos empregadores, por meio de seus prepostos, praticavam o ilícito sem saber. Hoje, há campanhas educativas, o próprio TST tem um manual ensinando o que pode ser caracterizado e como é possível impedir a sua prática. Penso que uma campanha educativa nesse sentido (contra discriminação salarial) também pode produzir bons resultados.

O presidente Jair Bolsonaro afirmou que a sanção poderia eventualmente afetar a empregabilidade das mulheres. A senhora concorda?

Posso dizer que o efeito de discriminar pode ser uma realidade. É possível, entre um candidato do sexo masculino ou um candidato do sexo feminino, discriminar a mulher na contratação. A divisão sexual do trabalho ainda está presente no mundo atual e se agravou agora por ocasião da pandemia. Apesar dessa igualdade legal, constitucional, quando se trata de redução de postos de trabalho, no período da pandemia as mulheres perderam mais empregos do que os homens.

A senhora é a primeira presidente mulher da maior Corte trabalhista do País. Como a senhora vê a disparidade de gênero no mercado de trabalho? Ela existe ainda hoje e como mudar isso?

Existe. Não só na admissão, mas sobretudo na promoção. Quanto mais elevado na hierarquia, mais difícil é para mulher galgar um posto. Estou convencida de que a mulher precisa trabalhar mais do que o homem e se dedicar mais para receber o mesmo tratamento. Essa é uma realidade em todos os níveis.

Eu própria sinto um pouco. Percebo que existe ainda uma resistência do homem em relação à mulher. Ela precisa mostrar que não tem qualquer tipo de impedimento de ser profissional integral, ela se esforça mais para ocupar seu espaço.

As informações são do jornal O Estado de S. Paulo.