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Quer se divertir e poupar? Compre um carro menor e viaje mais, diz livro

Aiana Freitas

Do UOL, em São Paulo

26/03/2013 06h00

Em vez de comprar um carro caro, é melhor ficar com um menor e ter dinheiro sobrando para outros prazeres imediatos. É que ganhar dinheiro e poupar exige sacrifício, mas os esforços só dão certo, se houver “recompensas” no dia a dia, como ir ao cinema, jantar num bom restaurante ou viajar.

As dicas são do consultor e escritor Gustavo Cerbasi, que acaba de lançar um livro sobre o assunto.

Na obra "10 Bons Conselhos de Meu Pai" (Editora Objetiva), Cerbasi cita dicas que recebeu de seu pai biológico e outros mentores que tiveram papel determinante em sua vida: o avô materno, um tio e um técnico de natação.

Para Cerbasi, muitas vezes o marido ou o vizinho fazem tanta pressão para o consumo quanto o marketing, estimulando a compra de bens dos quais as pessoas não precisam, como uma casa grande e o carro do ano.

"Existe uma pressão para que a gente tenha o melhor carro que cabe no bolso, a melhor casa, a melhor moda que possa vestir. Não vou dizer que nada disso é importante para a pessoa. Mas o erro que não pode ser cometido é a pessoa comprar a melhor casa que pode pagar e não ter dinheiro para sair dessa casa no fim de semana", diz.

O consultor diz ainda que muita gente desiste de organizar as finanças porque precisa fazer sacrifícios no começo e mudar a rotina. Ele compara esse sacrifício inicial àquele feito por quem entra na academia.

"Quando se começa a fazer exercícios regularmente, existe um período de aproximadamente quatro semanas para o corpo se adaptar. Com o dinheiro, infelizmente não dá para falar em quatro semanas. Eu tenho de me esforçar por um semestre ou dois para começar a perceber, no final de um ano, grande vantagem nessa organização e aí ter mais facilidade no ano seguinte", diz Cerbasi.

A seguir, confira os principais trechos da entrevista concedida pelo consultor ao UOL.

UOL - No seu livro, o senhor fala de experiências e ensinamentos passados por seu pai e outros "mentores", que foram determinantes para seu direcionamento na carreira e na vida pessoal. Que relação esses ensinamentos tiveram com as suas decisões financeiras?

Gustavo Cerbasi - Esse livro surgiu de uma preocupação minha de tirar um pouco a racionalização da ideia da educação financeira. É muito normal as pessoas ouvirem a orientação de um especialista num artigo, na televisão, no rádio e pensarem: "Que bom seria se eu tivesse essa disciplina, que bom seria se eu tivesse esse conhecimento ou esse raciocínio".

O livro mostra como lições da minha vida são, com o passar dos anos, transformadas em prática, em comportamento, em uma atitude diferente em relação ao dinheiro. É um livro que fala da disciplina necessária, do conhecimento necessário, enfim, da postura necessária para a pessoa que quer lidar melhor com o dinheiro. Esse tipo de lição é dado todos os dias da vida. Se você tiver uma rotina disciplinada e organização para outros itens da sua vida, como alimentação, exercícios, rotina social, é muito mais fácil você acrescentar na sua vida uma rotina financeira também.

Um dos conselhos que o senhor recebeu foi sobre como fazer negociações. O senhor acha que as pessoas no geral têm dificuldade de agir de maneira racional nesses momentos?

As pessoas têm dificuldade, sim, quando se fala em negociação. O brasileiro é muito afetuoso, ele tem uma empatia muito grande pelas pessoas que encontra. Uma situação de compra e venda para o brasileiro é mais difícil, na média, do que para uma pessoa de outro país em que a população é mais distante e reservada.

Geralmente, as pessoas têm noções básicas dos problemas que enfrentam: sabem que precisam economizar, que o cheque especial é caro, que os juros do cartão são altos.  Por que, ainda assim, existe um alto índice de endividamento e um consumo excessivo?

É uma combinação de acomodação e falta de educação. E não é só com dinheiro. Como você faz para ter uma alimentação mais saudável? Existe toda uma etapa inicial, de você aprender a cozinhar e ter tempo para cozinhar, existe toda uma organização pessoal para que você consiga mudar de vida.

Com dinheiro, não é diferente. Você tem de quebrar um pouco a sua rotina, o que não é fácil, dedicar um tempo ao aprendizado e ter uma dedicação de tempo maior ainda para mudar a rotina. Como no início dos exercícios ou no início da dieta, o início das mudanças nas finanças exige um esforço muito grande.

Quando se começa a fazer exercícios regularmente, existe um período de aproximadamente quatro semanas para o corpo se adaptar. Se a pessoa for muito persistente nessas quatro semanas, depois as endorfinas se encarregam de criar o hábito. Com o dinheiro, infelizmente não dá para falar em quatro semanas. Uma tarde de exercícios é um ciclo de exercício na sua vida.

O ciclo do dinheiro na sua vida é um mês.  Eu tenho de me esforçar por um semestre ou dois para começar a perceber, no final de um ano, grande vantagem nessa organização e aí ter mais facilidade no ano seguinte. É aí que as pessoas desistem, por causa dessa questão do prazo.

E por que existem muitos estímulos puxando-as para o outro lado...

Sim, muitos estímulos comerciais, mercadológicos, impulsos do subconsciente que podem fazer a pessoa desistir do seu plano nesse período e acabam desconstruindo aquele pequeno esforço que houve no começo. Mas às vezes a gente joga a culpa no marketing, e não é só isso. É o marketing, é o seu colega de trabalho, o seu marido, o seu vizinho, o seu círculo de amizades. Quando você quer mudar um hábito, mas as pessoas ao seu redor não mudam, você de certa forma é atraído para aquela rotina em que você estava. Então deve haver uma conscientização muito grande, somada a um esforço muito grande, para que a transformação aconteça.

Um dos seus conselhos é que a pessoa deve planejar o futuro, mas também viver o presente, mantendo os prazeres do dia a dia. Como manter esse equilíbrio?

É importante saber o que soma mais, em termos de bem estar, na vida de uma pessoa. Existe uma pressão normalmente externa, da sociedade, para que a gente tenha o melhor carro que cabe no bolso, a melhor casa, a melhor moda que possa vestir. Não vou dizer que nada disso é importante para a pessoa. O sentimento de adquirir esses bens que se quer muito é muito prazeroso. Mas o erro que não pode ser cometido é a pessoa comprar a melhor casa que pode pagar e não ter dinheiro para sair dessa casa no fim de semana.

A minha orientação é que a pessoa simplifique os grandes gastos. Que priorize a sua saída ao cinema, a assinatura de revistas, a TV a cabo, coisas que são aproveitadas de maneira prazerosa, mesmo que isso signifique se impor uma moradia mais barata, um carro mais antigo ou mais econômico. Existe uma recompensa na compra de um bem de grande valor. Mas é muito fácil esse sentimento de recompensa desaparecer depois de um ou dois meses.

Uma vida mais simples se traduz em uma vida mais rica em experiências. Eu tenho de ter um custo de vida mais baixo para poder viajar mais, experimentar mais, visitar mais pessoas, e com isso me sentir mais vivo e com mais estímulos e experiências na vida.

É difícil fazer as pessoas se conscientizarem num país em que a frase-clichê do mercado imobiliário é "Quem casa quer casa", como se fosse obrigatório comprar uma casa logo que se começa uma vida independente, autônoma. Mas o ajuste passa por aí.

O senhor teve uma trajetória atípica, conquistou seu primeiro milhão aos 31 anos, escreveu e vendeu muitos livros, deu palestras, ampliou sua forma de atuação. O que acha que foi determinante para essa trajetória?

Não foram as escolhas de investimento ou minha renda que foram determinantes. Determinante foi manter o pé no chão e segurar o crescimento do meu estilo de vida enquanto a renda crescia. Eu e minha mulher não cultivávamos muita expectativa de consumo. Enquanto nossa carreira crescia, seguramos o deslumbramento, e a independência financeira chegou mais facilmente.

Para a pessoa que não está numa situação de crescimento vertiginoso da carreira, o que eu recomendo é estar sempre um passo atrás. Se a pessoa ganha R$ 2.000 por mês e recebe uma promoção e passa a ganhar R$ 2.500, ela deve se esforçar para manter o padrão de vida de R$ 2.000 por mês por mais um tempo, até receber a próxima promoção. Se na próxima promoção o salário for de R$ 2.500 para R$ 3.500, aí a pessoa pode se dar o prêmio de elevar o seu padrão de vida para R$ 2.500. E todo o excedente vai sendo poupado com muita naturalidade.

Talvez na primeira fase desse crescimento da carreira seja um pouco mais sacrificante. Você já vive esperando, cultivando um aumento de salário, e de repente vai segurar mais um tempinho. Mas é mais fácil manter do que depois ter de reduzir.