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Analistas agora temem criticar Dilma e até 'cancelam' declarações já dadas

Sílvio Guedes Crespo

Do UOL, em São Paulo

31/07/2014 06h00

A repercussão do comunicado emitido pelo banco Santander aos seus clientes de alta renda, que provocou a demissão de um funcionário do banco e um pedido de desculpas formal pela instituição, assustou parte do mercado financeiro.

Um economista divulgou na terça-feira, 29, a jornalistas um texto de sua própria autoria fazendo duras críticas à reação do PT ao comentário do Santander, chegando a dizer que a atitude de petistas poderia ser uma "postura bolivariana". Quando a reportagem do UOL solicitou uma entrevista, o assessor de imprensa respondeu que o economista não iria mais falar com jornalistas e ainda pediu que não fossem publicadas as declarações, embora as mesmas já tivesse sido publicadas no jornal "O Globo".  

Outra fonte que não quis confirmar suas próprias declarações foi a XP Gestão. Um analista dessa empresa havia afirmado ao jornal "Valor Econômico" que, em caso de reeleição da presidente Dilma Rousseff, as ações da Petrobras poderiam cair para algo próximo a R$ 12. Já se o vencedor for Aécio Neves, dissera a gestora de investimentos, o mesmo papel poderá chegar a R$ 30.

O UOL, então, procurou a XP Gestão e perguntou se as projeções divulgadas no "Valor Econômico" ainda estavam válidas ou se houve uma atualização. A resposta foi: “Não vamos comentar o assunto desta vez”.

Alguns profissionais têm falado abertamente com a imprensa sobre o assunto, mas outros pedem anonimato.

Para Frederico Turolla, sócio-diretor da Pezco Microanalysis, a reação de expoentes do PT criticando o banco “foi uma tentativa de ‘enquadrar’ os analistas, não somente dessa instituição, mas de todo o mercado. Esse tipo de reação tende a criar uma restrição informal ao trabalho de analistas de todo o mercado financeiro”.

Na opinião dele, “a capacidade de análise dessa instituição [o Santander] ficou prejudicada pelas diretrizes que ficaram implícitas no comunicado público”.

“Quando assumiu, Dilma disse que preferia ‘o barulho da imprensa livre ao silêncio das ditaduras’, mas o seu governo tem um viés intervencionista em qualquer coisa contra seus interesses. E intervém de uma forma antipática”, disse a gestora da Kodja Investimentos, Claudia Kodja.

O colunista da "Folha de S.Paulo" e professor da FGV Samy Dana diz que falta espaço para debate real. “O debate econômico não vai ser feito nas campanhas, não é de interesse dos candidatos, não é popular. Não tem debate, tem torcida, parece Palmeiras x Corinthians. É uma baixaria enorme nas redes sociais. Daqui a pouco não se vai poder dar opinião sobre o governo porque ele vai ficar chateadinho.”

Outros analistas procurados pela reportagem para comentar a polêmica com o Santander não quiseram que seus nomes fossem identificados. Eles alegaram temer represálias. 

Questionados sobre quais mecanismos o governo teria para pressionar o mercado, três dos analistas que aceitaram conversar com o UOL sem terem seus nomes divulgados levantaram duas hipóteses. Uma delas seria a de que o Banco Central e a Comissão de Valores Mobiliários poderiam aumentar a fiscalização nas instituições que criticarem o governo. A outra hipótese levantada pelos entrevistados seria a de que os bancos ganham muito dinheiro com diversos tipos de operação junto ao setor público e não gostariam de correr o risco de deixar de ganhar. 

Os que concordaram em falar e divulgar seus nomes afirmam que análises desse tipo são corriqueiras em períodos eleitorais e que outros bancos já vêm analisando os possíveis efeitos, na economia, de uma eventual reeleição de Dilma ou vitória de um candidato oposicionista.

Advogados divergem sobre se há crime eleitoral num relatório como o do Santander.