Meirelles na economia: confiança, inflação reduzida, sem carteira assinada
Após quase dois anos à frente do Ministério da Fazenda, Henrique Meirelles decidiu deixar o comando da pasta e deve ser substituído por Eduardo Guardia. O ministro e comandante da economia durante o governo de Michel Temer (MDB) tem planos políticos ainda não divulgados para as eleições em outubro deste ano.
Ao lado de Temer, o goiano de 72 anos tentou recolocar a economia no eixo após o trauma do impeachment, mas divide a opinião dos economistas quanto a seus acertos e erros.
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Foi "homem do mercado" nos governos Lula
Meirelles, que já havia tido experiências anteriores com o poder público (foi presidente do Banco Central e era visto como o "homem do mercado" nos governos Lula) teve uma atuação avaliada como "política" no comando da economia do país, mas a falta de resultados robustos minou suas pretensões eleitorais.
Com um projeto reformista, conseguiu aprovar o teto de gastos públicos, mas viu naufragar qualquer possibilidade de uma alteração profunda da Previdência, considerada a mais importante delas pelos agentes econômicos.
Estabilidade pós-impeachment de Dilma
“Ele trouxe um pouco de estabilidade em um ambiente que estava se tornando fora de controle. Saindo de um processo de impeachment, ele consegue trazer os pés para o chão. Tanto que a grande ação é a ‘PEC do Teto’, e isso tem um grande tom político, mas a da Previdência faltou capital para votar”, analisa André Perfeito, analista-chefe da Gradual Investimentos.
Se, por um lado, Meirelles conseguiu passar também credibilidade ao mercado, fazer a inflação desacelerar e os juros caírem, por outro, viu o aumento do emprego informal e a recuperação da economia patinar.
Montou no cavalo, mas o bicho não obedeceu
“Ele assumiu com determinado projeto, herdado de Joaquim Levy [ex-ministro da Fazenda do governo Dilma], do ajuste fiscal, e o maior equívoco foi tentar fazer um ajuste com a economia já desacelerando”, analisa Luiz Gonzaga Belluzzo, economista e professor da Unicamp.
“[Meirelles] montou no cavalo, mas o cavalo não fez o que ele achou que ia fazer, pois o choque que ia ter na economia com o ajuste fiscal não ocorreu”,diz Belluzzo. “Ele na verdade tinha uma perspectiva de um ajuste que acabou não ocorrendo”, conclui.
Transmitiu imagem de timoneiro no controle
Os atores econômicos precisam de confiança para fazer com que a roda da economia gire. Um dos méritos da gestão Meirelles na economia foi tentar recuperar a confiança do mercado no país após o impeachment.
“Ele conseguiu transmitir para o país uma diretriz de austeridade sólida e confiável, tipo um timoneiro, com alguém que está no controle e sabe que isso é feito”, analisa Alberto Ajzental, professor da FGV.
“Essa coisa da imagem e da figura é superimportante. Isso alinha os esforços, os interesses, e a sinalização é muito forte. De forma geral, essa imagem de conservador ortodoxo transmite confiança para os agentes econômicos, como empresas e pessoas”, diz ele.
Mesmo os resultados ruins não abalaram a imagem
Para Ricardo Humberto Rocha, professor de economia do Insper, mesmo os maus resultados na administração das contas públicas no curto prazo não tiveram reflexo imediato no Brasil por causa da credibilidade de Meirelles no mercado.
“Mesmo esse último rebaixamento de rating [nota de crédito] do Brasil não causou tumulto. Quando temos um problema de balanço, eu procuro os credores e exponho o problema, ele não vai aumentar o crédito, mas ele passa a confiar mais nas minhas explicações. É mais ou menos isso que o Meirelles fez”, diz Rocha.
Emprego melhorou, mas sem carteira assinada
Talvez um dos resultados mais controversos de Meirelles à frente do Ministério da Fazenda tenha sido a questão do desemprego.
A taxa de desemprego, que já chegou a 13,7% sob o comando de Meirelles, ficou em 12,6%, em média, entre dezembro e fevereiro, ou 13,1 milhões de pessoas.
O problema é que, por outro lado, o número de empregados com carteira assinada ficou no menor nível desde 2012. Portanto, o desemprego vem caindo graças ao aumento de trabalhadores informais no país.
“Você criou 26 milhões de trabalhadores que estão em situação de subemprego, portanto, na informalidade. Isso tem um efeito grande em seus rendimentos, então aquela expectativa de que o aumento de consumo ia levar a uma trajetória melhor da economia não aconteceu”, analisa Luiz Gonzaga Belluzzo.
PIB está demorando para crescer em ritmo maior
No ano em que assumiu o ministério, a economia registrou queda de 3,6%, em 2016. No ano seguinte, o PIB se recuperou e teve alta de 1%. O resultado, contudo, só ocorreu pelo desempenho excepcional do agronegócio, que representa 27,5% do PIB, e cresceu 13% no ano passado.
“Foi uma sorte pegar a supersafra [da agricultura]. Ele também adotou medidas bastante heterodoxas, como liberar o FGTS, jogando a taxa de juros para baixo. Como tudo, você também precisa de sorte”, afirma André Perfeito, da Gradual Investimentos.
No início deste ano, contudo, a produção industrial e o setor de serviços voltaram a cair, dando sinais de que uma recuperação mais robusta ainda pode estar longe.
“O lado que preocupa é que a economia está demorando para voltar a crescer em um ritmo maior. A renda não se recuperou e, se a renda não se recupera, o consumo também demora”, diz Ricardo Humberto Rocha, do Insper.
Inflação baixou com ajuda da agricultura
Pesadelo dos brasileiros, a inflação caiu sob a batuta da equipe de Meirelles. Em geral, os preços medidos pelo IPCA (Índice de Preços ao Consumidor Amplo) subiram apenas 2,95% -ficando abaixo até mesmo do piso da meta, que era de 3%. Foi a primeira vez que isso ocorreu desde 1999.
O resultado, contudo, também foi influenciado pela supersafra, que jogou os preços dos alimentos para baixo, puxando o índice como um todo. Só para se ter uma ideia, o feijão-carioca, por exemplo, chegou a cair 46% em 2017, e o preço dos alimentos, de forma geral, recuou 1,87%.
“Sem querer desqualificar Meirelles, na inflação, a variação de alimentação teve até deflação [diminuição dos preços]. A outra parte da inflação, ligada à atividade econômica, de serviços, está segurando os salários", diz André Perfeito.
Isso significa que a inflação baixa também é resultado de salários mais baixos e desemprego em alta. Com menos renda e mais desemprego, as pessoas compram menos. Menor procura faz os produtos baixarem. Então, a inflação menor pode indicar um problema de fraqueza da economia.
Só parte das reformas foi aprovada
Dentro da agenda reformista que Meirelles se propôs a conduzir, a mais importante delas não aconteceu. As mudanças na Previdência subiram no telhado por falta de apoio no Congresso. Mesmo assim, o governo Temer conseguiu aprovar o teto de gastos e a reforma trabalhista.
“É importante ressaltar que o ministro Meirelles passou credibilidade, mas fizeram um trabalho muito bom integrado com Tesouro e BC. Foi revisado todo o orçamento público e foi feita toda uma reestruturação das contas públicas. Isso gerou uma necessidade de aprovar o teto dos gastos e deu um novo ânimo para perceber que a crise chegava ao final e havia uma luz no fim do túnel”, diz Ricardo Humberto Rocha, professor de economia do Insper,
Para Alberto Ajzental, professor da FGV, a derrota na questão da reforma da Previdência não é de responsabilidade de Meirelles.
“Isso é mau para o país, mas ele não é culpado pela falta de habilidade e capital político do governo no Congresso”, diz.
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