Produtores de vinho querem menos imposto para enfrentar acordo com Europa
O fundo de R$ 150 milhões para modernização da cadeia do vinho pode ajudar o setor a competir com os vinhos europeus, mas não é suficiente se não vier junto com uma reforma tributária. A opinião é de produtores de vinho e de representantes de associações do setor.
O fundo foi anunciado pela ministra da Agricultura, Tereza Cristina, como medida compensatória pelo acordo do Mercosul com a União Europeia.
O tratado assinado em Bruxelas, que ainda precisa ser ratificado pelos parlamentos, prevê a eliminação de tarifas para vinhos em garrafas de até 5 litros e champanhe em um prazo de oito anos.
Os espumantes com preço acima de US$ 8 FOB por litro (no preço FOB o comprador assume todos os riscos com transporte e custos depois que o produto é colocado no navio) ficarão isentos de tarifas assim que o acordo entrar em vigor. Após 12 anos, serão zeradas as tarifas para todos.
Produção de vinha na Europa é subsidiada
"O acordo beneficia o Brasil, mas não o setor do vinho, já que a produção na Europa é altamente subsidiada pelo Estado. Mesmo com o fundo de compensação, que esperamos que funcione como um financiador para a produção agrícola e as vinícolas, se a carga tributária de toda a cadeia não for reduzida, a competição será desleal", diz Oscar Ló, presidente do Ibravin (Instituto Brasileiro do Vinho), que reúne agricultores, vinícolas e cooperativas.
Segundo a entidade, os vitinicultores europeus têm um programa de apoio que permite investimentos anuais de 1,1 bilhão de euros (R$ 4,71 bilhões), cobrindo seguro de colheitas, promoção dos produtos em outros mercados, reestruturação das vinhas etc.
55% do preço do vinho no Brasil é imposto
"Hoje, no preço final de cada garrafa de vinho brasileiro, 55% são impostos, enquanto a taxa no Mercosul é de 15% a 25% e na Europa em torno de 15%."
Pelos dados do Ibravin, 200 mil pessoas e mais de 1.100 vinícolas integram o setor no Brasil. A base da cadeia no Rio Grande do Sul, líder do ranking nacional de produção de vinho, é a agricultura familiar.
"Quinze mil famílias no Estado dependem da uva. Sem redução de impostos, corremos o risco de perder até o mercado interno. E, se não tivermos como competir, haverá um grave problema social."
Setor esperava que espumantes ficassem fora do acordo
Ló afirma que, por negociações prévias com o governo, o setor esperava que os espumantes ficassem de fora do acordo. "Os vinhos brasileiros, especialmente os espumantes, têm uma qualidade muito boa e têm conquistado muitos prêmios no exterior, sendo exportados para nichos, mas nosso custo de produção é muito alto para competir com a tradição e escala de produção dos europeus, que colocam grande volume da bebida no Brasil a US$ 2 o litro."
Darci Dani, diretor-executivo da Agavi (Associação Gaúcha de Vinicultores), diz que o setor defendia a exclusão dos vinhos até US$ 5 do acordo, o que não foi aceito. "Esperamos que esse fundo, que ainda não sabemos como vai funcionar, nos ajude a ter condições de competir com os vinhos europeus subsidiados e que as medidas façam crescer o consumo de vinho no país, que está parado há muitos anos."
Acordo não podia ser prejudicado por causa do vinho, diz ministério
Ana Lúcia Gomes, diretora de comércio e negociações comerciais do Ministério da Agricultura, afirma que a pasta teve várias discussões prévias ao tratado com o setor, a Casa Civil e o Ministério da Economia.
"Concluímos que não poderíamos queimar o acordo por conta do vinho e nem deixar o setor desamparado. A criação do fundo visa garantir modernidade e mais competitividade para o produto nacional diante do produto europeu, que tem subsídios."
Segundo a diretora, os detalhes do fundo ainda está em discussão nos ministérios de onde virá o dinheiro para o fundo, o período de vigência e a forma como será feita a modernização do setor.
Sobre a questão dos espumantes, ela ressalta que o produto nacional ainda terá 12 anos de proteção depois que o acordo entrar em vigor.
A reportagem procurou também o Ministério da Economia, que repassou de volta para a Agricultura.
Produtor de SP apoia acordo
O ítalo-brasileiro Luis Roberto Lorenzato, produtor de uva e dono da vinícola Marchese di Ivrea, em Ituverava (SP), afirma que o acordo firmado em Bruxelas é arrojado, bom para o agronegócio brasileiro e um estímulo para o vinho brasileiro porque os produtores vão poder importar sem barreiras tarifárias insumos como leveduras, enzimas e proteínas necessárias à fabricação de uma bebida de qualidade, além de equipamentos de última geração.
"O vinho que hoje chega caro aqui é muito barato na Europa e vai chegar ainda mais barato. Será que esse vinho que vai chegar por R$ 10 não vai deixar o consumidor desconfiado em relação à qualidade? Na verdade, o que nós bebemos hoje é imposto." Segundo ele, com o acordo, o vinho nacional de qualidade finalmente vai ter a chance de mostrar ao consumidor brasileiro por que vale R$ 80, R$ 100.
Lorenzato também vê no acordo uma oportunidade de modernização da indústria. "O vinho italiano, por exemplo, é muito mais barato em Nova York do que em Milão e, mesmo assim, não quebrou a indústria vinícola da Califórnia, que exporta para o mundo inteiro."
O produtor, que atualmente é deputado na Itália e vem duas vezes por mês ao Brasil, faz coro com os colegas brasileiros sobre a necessidade de uma reforma tributária para equalizar a disputa com o vinho europeu e defende a aprovação da lei que classifica o vinho como alimento no Brasil para ter menos impostos.
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