Com pandemia, mais brasileiros guardam para emergências dinheiro que sobra
O brasileiro mudou a forma de se relacionar com suas economias. Antes, ele usava o dinheiro poupado para comprar a casa própria ou um terreno. Desde 2020, ano em que a pandemia da covid-19 chegou, o brasileiro tem preferido manter uma reserva de emergência.
Pela primeira vez, o objetivo de comprar a própria residência não ficou em primeiro lugar. Esse dado foi apontado pela quarta edição da pesquisa "Raio X do Investidor", feita pela Associação Brasileira das Entidades dos Mercados Financeiro e de Capitais (Anbima) em parceria com o Datafolha.
A pesquisa aconteceu entre novembro e dezembro de 2020, por meio de 3.408 entrevistas. O trabalho ouviu a população economicamente ativa das classes A, B e C em todo o país. A margem de erro é de dois pontos percentuais, para mais ou para menos, dentro do nível de confiança de 95%.
A compra da casa própria ficou logo abaixo da intenção de formar uma reserva de emergência, apontada como destino para as aplicações por 27% das pessoas que tinham algum dinheiro guardado em 2020, chegando a um percentual 10 pontos acima do registrado em 2019. A intenção de formar uma reserva de emergência cresceu na preferência de todas as classes sociais.
Desde o início do levantamento, a compra de um imóvel ou terreno liderava com vantagem as respostas da pesquisa. Em 2020, essa intenção de investimento caiu: só 26% dos investidores disseram direcionar o dinheiro para a compra de imóveis, frente a 35% em 2019 e 33% em 2018.
A queda foi liderada principalmente pela classe C. Nesta faixa, 26,7% apontaram o sonho da casa própria em 2020 como algo a ser alcançado com os investimentos. O percentual era de 38,6% um ano antes. Na classe B, o recuo foi menor, de 3,8 pontos, passando de 30% em 2019 para 26,2% em 2020. Para a classe A, baixou 2,4 pontos entre os entrevistados da classe, de 25,5% para 23,1%.
Preferências do investidor em produtos
A pesquisa também apontou as preferências dos produtos financeiros como opção de investimento. Ações, títulos privados e fundos ganharam participação na rotina dos investidores em 2020, enquanto a caderneta de poupança perdeu espaço pela primeira vez nos quatro anos da pesquisa.
Apesar disso, ela continua como o investimento preferido, pois é utilizada por 29% dos investidores, uma queda de oito pontos percentuais em relação a 2019.
O levantamento indica que os produtos financeiros foram o principal destino do dinheiro economizado pela população no ano passado, com ganho de participação nas classes A e B, e estabilidade na classe C. Dentre os brasileiros que investiram em 2020, 53% deles colocaram o dinheiro em produtos financeiros, ou 11 pontos percentuais a mais do que o levantamento anterior.
Pela primeira vez, os produtos financeiros ultrapassaram a soma de todos os outros destinos dados para as economias, alcançando uma população estimada em 20 milhões de brasileiros. Para Marcelo Billi, superintendente de Comunicação, Certificação e Educação de Investidores da Anbima, a redução da taxa básica de juros fez com que as pessoas diversificasssem seus investimentos, na busca por rentabilidade, aumentando as aplicações em produtos um pouco mais arriscados, como títulos privados e fundos de investimento.
Pandemia forçou pessoas a guardarem dinheiro
Em função das restrições impostas pelo isolamento social, muitos gastaram menos com viagens, festas, idas a bares e restaurantes, o que favoreceu a formação de uma poupança involuntária por parte da população brasileira em 2020.
Segundo a Anbima, para 56% das pessoas que conseguiram guardar algum dinheiro no ano passado, essa foi a principal fonte de economia; no ano anterior, essa fatia era de 34%. Ou seja, enquanto em 2019 em torno de 12 milhões de brasileiros disseram economizar em razão do corte de gastos, em 2020 o total saltou para mais de 20 milhões de pessoas.
De acordo com Billi, foram dois movimentos que aconteceram para este resultado. A primeira tendência, que não depende da pandemia, é que os brasileiros já buscavam outras formas de investimento em função da queda dos juros.
Já a segunda é uma tendência acelerada pela pandemia, que obrigou as classes A e B a poupar por uma impossibilidade de gastar, aumentando a poupança, chamada de involuntária ou forçada. "Já tinha um movimento de buscar por alternativas de maior risco e rentabilidade. Então, uma coisa alimenta a outra", diz Billi.
A segunda maior fonte de economia foi a não realização de compras desnecessárias, apontada por 24% das pessoas. Em 2019, o item liderava entre os gatilhos para economia, com 47% das respostas. O controle das despesas e a reserva de parte do salário do mês vieram na sequência, apontados por 19% e por 11%, respectivamente. Segundo o levantamento, ambos apresentaram queda em relação à pesquisa anterior.
Para Billi, a pergunta atual é de como essa poupança irá se tornar um hábito do brasileiro ou se as pessoas irão usar os recursos que não gastaram com o que chamam de "revenge shopping", ou "consumo de vingança", em tradução literal, um aumento de gastos com viagens, restaurantes e compras desnecessárias com o fim da pandemia.
Além disso, o superintendente acredita que a segurança financeira seguirá sendo um objetivo bem pontuado do brasileiro. "As pessoas passaram por uma situação em que ter essa reserva ficou mais importante. No ano que vem, talvez a gente veja ainda mais esses traços de mudança de comportamento, o que será permanente e o que aconteceu apenas neste momento de susto", afirma Billi.
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