Guerra na Ucrânia: Como conflito afeta exportações do Brasil para a Rússia
Resumo da notícia
- Venda de produtos brasileiros para Rússia ainda não foi afetada por sanções impostas por EUA
- Exportadores temem que problemas na logística e nos pagamentos atrapalhem os negócios
- Participação russa no total exportado por Brasil vem caindo e é inferior a 1%
- Mas exportadores de carnes, soja, amendoim, café e açúcar podem perder vendas
A venda de produtos brasileiros para a Rússia ainda não foi afetada pelas consequências da invasão da Ucrânia pelas forças armadas russas, dizem exportadores. Mas empresários do agronegócio, setor que se destaca na pauta de exportações para o mercado russo, temem que problemas na logística e nos pagamentos atrapalhem os negócios.
A participação das compras russas no total exportado pelo Brasil vem caindo desde 2008, e fechou 2021 com uma fatia inferior a 1%. Apesar dessa participação pequena, uma menor importação da Rússia afetaria os negócios de exportadores de carnes, soja, amendoim, café e açúcar.
Os executivos dizem que ainda aguardam orientações do governo brasileiro sobre adesão ou não do Brasil ao bloco dos países que lançaram sanções contra o governo de Vladimir Putin.
Nosso comércio bilateral com a Rússia é pequeno, mas eles são importantes para algumas de nossas exportações e também para alguns itens de nossas importações, como fertilizantes. Além disso, medidas tomadas por outros países e o conflito em si já estão impactando os preços das commodities e os sistemas de pagamentos internacionais, o que deve se refletir em nosso comércio exterior.
Tirso Meirelles, vice-presidente da Federação da Agricultura e Pecuária de São Paulo (Faesp)
Como invasão da Ucrânia pela Rússia pode afetar exportação brasileira
O conflito entre Rússia e Ucrânia está acontecendo apenas no território ucraniano, que foi invadido, sem afetar portanto a infraestrutura ou logística dos mercados russos.
Mas as exportações brasileiras para a Rússia podem ser afetadas por causa das sanções econômicas anunciadas por diversos países do Ocidente, em movimento liderado pelos Estados Unidos.
Entre as sanções adotadas está a suspensão de vendas e compras de produtos para e do mercado russo e o bloqueio de contas e financiamentos bancários para empresas russas.
Governo brasileiro monitora situação
Por enquanto, dizem empresários, nenhuma orientação foi dada pelo governo brasileiro aos exportadores que vendem para a Rússia.
Questionado se o Brasil vai continuar ou não exportando para a Rússia, ou se há alguma orientação aos exportadores que vendem para a Rússia, o Ministério da Economia não tomou uma posição oficial.
"O Ministério da Economia, pasta à qual está vinculada a Secretaria Especial de Comércio Exterior e Assuntos Internacionais (Secint), acompanha atentamente os desdobramentos da crise na Ucrânia e, neste momento, não irá se pronunciar sobre o assunto", diz nota encaminhada ao UOL.
Segundo o ministério da Economia, exportadores brasileiros não contataram a Secint relatando dificuldades de exportação ao mercado russo. Além disso, diz a pasta do governo, ainda não foram observados movimentos atípicos nos dados de exportação para a região.
Importância da Rússia nas exportações brasileiras
A participação da Rússia nas exportações brasileiras está caindo ao longo dos últimos anos. Após bater um pico de US$ 4,6 bilhões, em 2008, as vendas de produtos brasileiros para o mercado russo oscilaram nos anos seguintes, mas com tendência predominante de retração, até chegar a 2021 somando US$ 1,6 bilhão, segundo dados da Secretaria Especial de Comércio Exterior e Assuntos Internacionais (Secex).
Ao longo de todo o ano passado, o mercado russo comprou US$ 1,7 bilhão do Brasil. A Rússia foi apenas o 36º país na lista de mercados consumidores do Brasil, respondendo por 0,6% das exportações brasileiras.
Para comparar, em 2008, a Rússia comprou 2,4% das nossas vendas externas.
Produtos mais vendidos pelo Brasil para a Rússia em 2021 (Fonte: Secex)
- Soja: US$ 343 milhões
- Carnes de aves: US$ 167 milhões
- Carne bovina: US$ 137,6 milhões
- Amendoins: US$ 130 milhões
- Café não torrado: US$ 133 milhões
- Açúcares e melaço: US$ 127 milhões
Soja e carnes são vendas mais afetadas
Apesar dessa participação marginal nas exportações brasileiras, uma redução da demanda russa afetaria alguns negócios, em especial dos segmentos de carnes e grãos.
Segundo o presidente da Associação Brasileira de Proteína Animal (ABPA), Ricardo Santin, o mercado russo aparece entre os dez maiores compradores de carnes do Brasil e vem ganhando relevância na pauta de exportação, na medida em que algumas barreiras comerciais e sanitárias estão sendo retiradas.
O diretor e conselheiro da Sociedade Nacional da Agricultura (SNA), Marcio Sette Fortes, também conselheiro da Associação de Comércio Exterior do Brasil (AEB) e professor do Ibmec-RJ, diz que tanto empresários como o governo do Brasil vêm fazendo um esforço nos últimos anos para abrir o mercado russo aos produtos brasileiros. E, por isso, não faria sentido um alinhamento precipitado às sanções contra os russos.
Sem histórico de impor sanções
Empresários e especialistas em comércio exterior e relações internacionais dizem que não enxergam no radar a possibilidade de uma adesão do Brasil aos países que vão impor sanções comerciais contra a Rússia.
O Brasil não tem um histórico de impor sanções, então não acredito que o país vá por conta própria suspender exportações à Rússia.
Vinicius Rodrigues Vieira, professor de economia e relações internacionais da FAAP
Risco de gargalos nos pagamentos e transportes
Mas o Brasil ainda deve enfrentar problemas para manter as exportações para a Rússia, afirmam empresários do setor, apontando duas fontes de risco: transportes e pagamentos.
As sanções impostas pelos Estados Unidos e outros países incluem medidas que suspendem a atuação de bancos russos e de companhias internacionais de transportes internacionais que fazem todas as etapas da logística entre Brasil e Rússia.
Os exportadores brasileiros poderão enfrentar então problemas para receber pagamentos relacionados às vendas feitas aos russos.
Temos um problema de logística que já vem se arrastando ao longo de toda a pandemia. Então, atrasos nos transportes têm ocorrido. Mas isso pode se agravar e afetar o ritmo das exportações.
Ricardo Santin, presidente da ABPA.
Temos ainda um risco nas transferências de pagamentos para os exportadores brasileiros por causa das sanções dos Estados Unidos contra transações envolvendo empresas e bancos da Rússia.
Tirso Meirelles, Faesp.
Impacto de custos maiores
Exportadores brasileiros dizem que a cadeia de produção também deve ser afetada pelo encarecimento de insumos por causa do conflito na Ucrânia -algo que já está ocorrendo.
O aumento dos preços do trigo e do milho, por exemplo, eleva os custos dos produtores de aves e suínos, afirma o presidente da ABPA. Segundo ele, esse impacto terá que ser repassado aos consumidores, no exterior e aqui.
Mas a maior preocupação do setor neste momento é com fertilizantes, já que o Brasil importa da Rússia, por exemplo, 27% dos fertilizantes de potássio e 21% dos fertilizantes de nitrogênio que país utiliza na agricultura.
Segundo o diretor-executivo da Associação Nacional para a Difusão de Adubos (Anda), Ricardo Tortorella, ainda é cedo para analisar os impactos para o setor e para toda a cadeia alimentar diante das sanções internacionais. Mas ele diz já ver o risco de desabastecimento desses insumos.
A Anda neste momento dedica sua atenção ao possível risco de oferta de insumos para a produção de fertilizantes e impactos na cadeia de suprimentos internacionais, inclusive no Brasil.
Ricardo Tortorella, Associação Nacional para a Difusão de Adubos
Oportunidades criadas pelo conflito
Mas o conflito entre Ucrânia e Rússia também deve abrir oportunidades para os exportadores brasileiros, dizem empresários.
Eles apontam que Rússia e Ucrânia também exportam carnes e grãos para outros países -e que uma redução da oferta desses itens por parte de russos e ucranianos vai abrir espaço para o Brasil atender a demanda.
Rússia e Ucrânia também são exportadores de carnes. Não tão grandes como o Brasil, mas têm seus mercados específicos. A Ucrânia, por exemplo, exporta para Europa e Arábia Saudita, dois mercados em que o Brasil é ativo e, portanto, pode ser chamado a suprir uma menor oferta. A gente já notou aumentos de preço e de procura.
Ricardo Santin, presidente da ABPA
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