Bradesco acusa Americanas de fazer chicana para proteger acionistas

Em petição enviada nesta quinta-feira (14) à Justiça de São Paulo, o Bradesco acusa as Americanas de fazer "a mais pura chicana" para impedi-lo de ter acesso aos documentos e comunicações de diretores e acionistas da varejista.

O pedido é para que a Justiça libere o andamento de um pedido de produção de provas ajuizado pelo Bradesco contra as Americanas para descobrir os responsáveis pelo rombo de R$ 20 bilhões nas contas da varejista. Esta reportagem foi atualizada na sexta (15), às 15h50, com a inclusão de posicionamento das Americanas enviada em nota.

O processo foi suspenso na quarta-feira (13) pela juíza Andréa Galhardo Palma, a pedido das Americanas. Segundo ela, é preciso apurar melhor as relações entre o escritório Warde Advogados, que representa o Bradesco nesse caso, e a Kroll, empresa de auditoria e investigações corporativas que atua como perita no processo.

Para o Bradesco, o pedido de suspensão foi uma tentativa "desleal" das Americanas de tumultuar o processo e proteger os acionistas de referência da empresa - Jorge Paulo Lemann, Marcel Telles e Carlos Alberto Sicupira.

A irresponsável exceção de suspeição aqui respondida - que, claro, não podia deixar de se fazer acompanhada de mais um pedido oportunista de suspensão do processo - é só a mais nova tentativa da Americanas de livrar seus Controladores e Conselheiros da complicada situação em que se puseram, ou de ao menos ganhar-lhes um tempo para que as provas ainda remanescentes de seu envolvimento na companhia possam ser permanentemente excluídas Bradesco, em petição à Justiça de São Paulo

O trio de acionistas de referência foi procurado, mas preferiu não se manifestar por não ter tido acesso à petição.

As Americanas enviaram nota na sexta (15), dia seguinte à publicação desta reportagem. Segundo a companhia, "o Programa de Antecipação de Fornecedores (PAF) não tem qualquer relação com o tema Risco Sacado, como o Bradesco teria alegado em sua petição. O PAF nada mais é do que um programa de antecipação de fornecedores com caixa próprio, implantado no final de 2021, tendo sido amplamente discutido e aprovado junto aos órgãos de governança da empresa, devidamente registrado nos demonstrativos contábeis e informado ao mercado com total transparência."

E conclui: "Trata-se, portanto, de financiamento com caixa da Companhia e, como tal, não é dívida junto a bancos."

O que aconteceu:

Em petição enviada à Justiça no começo desta semana, as Americanas alegaram que a Kroll e o Warde Advogados têm uma relação prévia ao pedido de produção de provas. Por isso, a Kroll estaria em situação de conflito de interesses para atuar no caso.

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A companhia foi nomeada como perita judicial pela própria juíza Andréa Galhardo Palma em 31 de janeiro de 2023. O pedido de produção de provas do Bradesco, assinado pelo Warde, é do dia 30 de agosto.

De acordo com as Americanas, os antigos controladores da empresa de venda de jogos Kabum!, que são representados pelo Warde Advogados, contratou a Kroll para ajudar na elaboração de uma petição contra o Itaú BBA e a Magazine Luiza em outro processo. A Kroll atua no processo do Bradesco contra as Americanas como perita nomeada pela Justiça, e não como contratada pelo banco. Já no caso da Kabum!, o Warde Advogados afirma na petição desta terça que a empresa de investigações foi contratada antes de o escritório entrar no processo.

Na petição desta terça, o Bradesco afirma que a suspensão do pedido de produção de provas é uma "medida desesperada" das Americanas "para refrear as investigações e impedir que documentos comprometedores venham a público".

Um dos indícios, diz o banco, é que a Kroll trabalha no processo desde janeiro deste ano, mas o pedido de suspensão só foi apresentado agora em setembro, depois que a Microsoft informou nos autos ter enviado à perícia as cópias de todos os emails dos envolvidos no caso.

Outro é a divulgação de um email de Eduardo Saggioro, presidente do Conselho de Administração das Americanas e sócio e ex-presidente da LTS, a holding do trio de acionistas.

Nesse email, Saggioro informa Beto Sicupira sobre as formas de contabilização do PAF (Programa de Antecipação de Fornecedores) no balanço. PAF, segundo o Bradesco, é outro nome para "risco sacado", operação financeira de antecipação de pagamentos ao fornecedor que é apontada como uma das origens do rombo de R$ 20 bilhões das Americanas.

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O Bradesco cita ainda as falas do ex-CEO da Americanas Miguel Gutierrez. Em depoimento à CVM (Comissão de Valores Mobiliários), ao qual o UOL teve acesso, e em carta à CPI das Americanas na Câmara, Gutierrez contou que a empresa passava por dificuldades financeiras e precisaria de uma injeção de R$ 8 bilhões para se reerguer. E revelou que Sicupira estava informado dos problemas.

A nova impugnação apresentada pela Americanas não traduz uma preocupação legítima com a "plena isenção de ânimo" (fls. 08) do perito, coisa que não tem por que ser objeto de preocupação, nem jamais foi questionada pela varejista. O incidente que ora se responde, muito antes, encerra uma prática mais antiga que o próprio Foro: a mais pura chicana Bradesco, em petição à Justiça de São Paulo

A íntegra da nota das Americanas:

A Americanas informa que irá se manifestar sobre o conteúdo completo da petição do Bradesco assim que a mesma for protocolada, uma vez que o documento sequer consta nos autos do processo até o presente momento.

[Nota da edição do UOL: nos autos do incidente de suspeição 0000400-10.2023.8.26.0260, a petição do Bradesco consta como protocolada às 15:31:44 de ontem, 14 de setembro]

Em relação à reportagem publicada pelo UOL, a Companhia esclarece que o Programa de Antecipação de Fornecedores (PAF) não tem qualquer relação com o tema Risco Sacado, como o Bradesco teria alegado em sua petição. O PAF nada mais é do que um programa de antecipação de fornecedores com caixa próprio, implantado no final de 2021, tendo sido amplamente discutido e aprovado junto aos órgãos de governança da empresa, devidamente registrado nos demonstrativos contábeis e informado ao mercado com total transparência. Trata-se, portanto, de financiamento com caixa da Companhia e, como tal, não é dívida junto a bancos.

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A Americanas reafirma que confia na competência de todas as autoridades envolvidas nas apurações e investigações, reforça que é a maior interessada no esclarecimento dos fatos e irá responsabilizar judicialmente todos os envolvidos.

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