Copom: mercado prevê corte menor para a Selic com BC mais conservador

O Comitê de Política Monetária do Banco Central (Copom) se reúne nesta quarta-feira (8) para decidir a taxa básica de juros, que desde agosto de 2023 vem passando por sucessivas quedas de 0,50 ponto percentual. No mercado, a maioria dos economistas acreditam que o BC deve reduzir o ritmo nos cortes, reduzindo a Selic em 0,25 ponto percentual, mas há divergências. O cenário externo mais delicado e a preocupação com as contas públicas devem influenciar na postura do colegiado.

BC pode ser mais "conservador" e reduzir queda de juro

Economistas apontam maior cautela no Banco Central. Relatórios de BTG Pactual, Itaú, XP, Bank of America (BofA) e Goldman Sachs, além de economistas consultados pelo UOL, apostam em juros a 10,50% ao ano. Segundo Victor Beyruti, economista da Guide Investimentos, pesam sobre o cenário a mudança na meta fiscal do governo Lula (PT), de superávit de 0,5% do PIB para déficit zero em 2025, e a deterioração do cenário internacional.

Boletim Focus prevê alta da inflação no próximo ano. Na última sexta-feira (3), economistas ouvidos pelo BC apontaram que o IPCA (Índice Nacional de Preços ao Consumidor Amplo) deve ficar em 3,64% em 2025, acima da meta de 3%, mas no intervalo aceitável entre 1,5% e 4,5%. Há um mês, porém, a perspectiva era de inflação em 3,53% para o próximo ano e, há uma semana, de 3,60%. No acumulado de 12 meses até março, a inflação brasileira fechou em 3,93%, de acordo com o IBGE.

Cenário externo "delicado" também afeta perspectivas. Neste sentido, os economistas lembram da guerra na Faixa de Gaza e da inflação nos Estados Unidos. Por um lado, o conflito no Oriente Médio tende a pressionar os preços das commodities. Por outro, uma inflação maior nos EUA significa que o país deve manter a taxa de juros elevada por mais tempo - o Fed (Federal Reserve, o BC dos Estados Unidos) pode vir a cortar os juros apenas a partir de setembro.

Projeção sobre nível de corte não é unânime. A Associação Brasileira de Bancos (ABBC), que representa instituições como bancos, cooperativas de crédito e instituições de pagamento, projeta o último corte de 0,50 p.p. na Selic na próxima quarta. Em nota, a ABBC diz que "apesar da elevação da adversidade no cenário externo" e do aumento da expecativa para a inflação, há condições para cumprir o guidance, ou projeção, que o BC já havia dado. A partir de junho, o corte seria de 0,25 ponto percentual, afirma a entidade.

Devem pesar sobre a postura do Banco Central a falta de visibilidade com relação ao cenário para a inflação, diante da incerteza com a política monetária nos EUA, e a piora da percepção do fiscal no Brasil aliada à resiliência dos dados de mercado de trabalho e crédito locais.
Victor Beyruti, economista da Guide Investimentos

O cenário em abril acabou estressando muito com o conflito entre Israel e Irã, a inflação mais resistente acarretando esses juros mais resistentes também nos Estados Unidos e no Brasil um pouco de ruído fiscal. Quando há esses três fatores, a expectativa acaba piorando em relação ao ritmo dos cortes, embora a taxa de juros brasileira ainda tenda a seguir caindo.
Cristian Pelizza, economista-chefe da Nippur Finance

Incertezas globais preocupam Campos Neto

Desde março, o presidente do Banco Central tem abordado a incerteza quanto aos reajustes de preços no mundo. Neste sentido, Campos Neto retirou o "forward guidance" que indicava um corte de juros de 0,5 ponto percentual para a reunião de maio. "Precisamos entender qual é a dinâmica deflacionária, de onde vai vir a desinflação daqui para frente. Os números de inflação vieram ligeiramente melhores do que eu esperava, mas precisa ver essa tendência de convergência para a meta se realizar", disse ele, em evento no final de abril.

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Ata do Copom em março já indicava cortes menores. Em avaliação sobre a conjuntura, o Comitê afirmou à época que o ambiente externo seguia volátil. "Alguns membros argumentaram ainda que, se a incerteza prospectiva permanecer elevada no futuro, um ritmo mais lento de distensão monetária pode revelar-se apropriado, para qualquer taxa terminal que se deseje atingir", afirmou o Copom.

Mercado externo deve ser fator importante no Copom. Para João Piccioni, gestor de fundos da Empiricus Gestão, o BC parece "relativamente confortável" com a atual diferença de juros entre Brasil e Estados Unidos, sem a capacidade de ir além, caso o processo desinflacionário não se concretize no exterior.

As notícias desde a última reunião do Copom vieram mais preocupantes para a perspectiva da inflação, tendo em vista a taxa de câmbio mais depreciada, elevação dos preços das commodities e indicadores do mercado de trabalho mais fortes do que esperado. Então, o conjunto dessas três informações, com também um cenário de maior volatilidade no contexto internacional, devem fazer com que o Copom seja mais cauteloso e reduza o ritmo de cortes.
Ricardo Faria, sócio da Legend

Fed deve começar a cortar juros apenas em setembro

Economia resiliente deve manter taxa elevada nos EUA por mais tempo. Foi o que afirmou o presidente do Fed, Jerome Powell, durante o Washington Forum sobre a economia do Canadá, em abril. Por lá, o Federal Reserve vem postergando a redução da taxa, observando o comportamento da inflação. Em fevereiro, a inflação anual do país ficou em 0,4%, aumento de 0,1 ponto percentual sobre o mês anterior.

EUA foram umas das últimas economias a subirem juros no pós-pandemia. Esse movimento levou ao aumento acelerado nos preços e uma dificuldade de controlar a inflação no país. Na semana passada, o BC americano manteve os juros no intervalo de 5,25% a 5,50% ao ano, mesmo patamar desde julho de 2023. "O panorama econômico é incerto, e o Comitê permanece altamente atento aos riscos de inflação", afirmou o Fed.

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A gente teve, em algum momento, o mercado achando que os Estados Unidos iam começar a cortar os juros em março, se não me engano, chegou a 85% de probabilidade de ser março. Eu, até na época, dizia que não enxergava isso nos dados. Agora, a gente foi para uma coisa que, se você olhar o mercado de opções, que é onde eu gosto mais de olhar, está dizendo que é dezembro.
Roberto Campos Neto, presidente do Banco Central, em evento da Legend Capital, em abril

Juros mais elevados nos EUA significam um dólar mais forte, que acaba dificultando o processo de desinflação nos países emergentes. Por outro lado, fortalece nossa balança comercial e gera algum fôlego para o equilíbrio do crescimento. Nesses momentos, o BC tende a se manter na retaguarda, diluindo os movimentos de política monetária e dando um pouco mais de tempo para tomadas de decisão mais assertivas. A manutenção dos juros altos lá fora deve, portanto, gerar movimentos mais sutis nas taxas por aqui.
João Piccioni, gestor de fundos da Empiricus Gestão

O canal direto é sobre o câmbio e seus efeitos na deterioração das expectativas de inflação. O BC já vinha sinalizando incômodo pelas expectativas de inflação estarem apenas parcialmente ancoradas e o fato é que voltaram a se deteriorar, mesmo que moderadamente.
Daniel Cunha, estrategista-chefe da BGC Liquidez

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