Como as propostas de Harris e Trump podem impactar a economia brasileira
Alexandre Novais Garcia
Do UOL, em São Paulo (SP)
05/11/2024 14h23
Os norte-americanos vão às urnas nesta terça-feira (5) para escolher seu próximo presidente, com uma disputa polarizada entre o ex-presidente Donald Trump e a atual vice-presidente Kamala Harris. Com visões econômicas distintas, a definição traz impactos diretos para a economia brasileira, com possíveis efeitos para a relação comercial, valorização do real e a inflação.
Comércio exterior
Relação comercial aparece como ponto central do debate. Com os Estados Unidos como segundo principal parceiro comercial, o Brasil pode esbarrar nas políticas protecionistas prometidas pelos candidatos para estimular o mercado de trabalho e a economia norte-americana. Em outro cenário, a positividade não é descartada com restrições rígidas às mercadorias da China.
Trump tem visão mais rigorosa a respeito das importações. Em entrevista ao The Washington Post há um ano, o ex-presidente defendeu uma cobrança de 10% sobre a compra de produtos de todos os países estrangeiros. "Essa abordagem pode resultar em uma guerra comercial que afeta negativamente tanto os EUA quanto os países que dependem dessa economia, como o Brasil", avalia Jefferson Laatus, chefe-estrategista do Grupo Laatus.
Donald Trump e Kamala Harris propõem sanções à China. Diante das políticas protecionistas defendidas pelos candidatos, a promessa de Trump é a mais rígida. O ex-presidente já defendeu uma cobrança adicional de 60% a 100% sobre as importações chinesas. Harris, por sua vez, deve seguir a estratégia adotada por Joe Biden e manter a proibição de produtos que podem ser importados do país asiático.
A vitória de Kamala Harris poderia favorecer um comércio mais aberto, beneficiando o Brasil, enquanto Trump poderia acirrar tensões comerciais, pressionando o dólar.
Felipe Vasconcellos, sócio da Equss Capital
Cenário pode ser positivo para as exportações brasileiras. Com a porta fechada para a China, os outros mercados globais tendem a ganhar espaço nos Estados Unidos. "Essa mudança representaria uma nova oportunidade para os produtos brasileiros, permitindo ao Brasil diversificar suas exportações, ganhar competitividade e fortalecer a nossa moeda", explica Erick Isoppo, CEO da IDB do Brasil Trading.
Política monetária
Eleição pode interferir no corte dos juros nos Estados Unidos. As posições adversas de Trump e Harris para o controle de inflação colocam em xeque a trajetória de redução dos juros no país. "O nome de Trump é vinculado à redução de tributos e menos regulação. A Kamala vê uma política gradualista, que faria as taxas de juros um pouco mais baixas no curto prazo", diz Adauto Lima, economista-chefe da Western Asset.
Hoje, Trump apoia uma agenda conservadora em termos econômicos, marcada por tarifas e fechamento de fronteiras, o que resulta em um impacto direto sobre a inflação e uma tendência de juros mais altos devido à pressão inflacionária.
Fernando Bento, CEO e sócio da FMB Investimentos
Propostas de Trump e Harris trazem problemas no curto prazo. Segundo Bento, as ideias dos candidatos até podem trazer benefícios pontuais, mas caminham para a expansão do déficit fiscal. Enquanto Harris defende o controle de preços para conter a inflação, Trump sinaliza para a redução da carga tributária das empresas e o aumento dos gastos em medidas de proteção para os mais pobres.
Taxas de juros têm diminuído para afastar do risco de recessão. Com a recente perda de força do mercado de trabalho norte-americano, a política monetária chama a atenção para evitar a retração da maior economia do mundo. "Se a inflação começar a subir novamente, especialmente em um cenário de mercado de trabalho tenso e baixo desemprego, poderemos enfrentar dificuldades que poderiam interromper a redução gradual das taxas", prevê Volnei Eyng, CEO da Multiplike.
Mudanças na condução da política monetária são improváveis. Laatus afirma que a posição dos candidatos a respeito do tema é conhecida. "Kamala Harris deve manter a continuidade da administração Biden, enquanto Donald Trump não trouxe alterações drásticas durante seu último mandato", avalia.
Alterações atingem diretamente as definições do Banco Central. O Copom (Comitê de Política Monetária) mantém a constante preocupação com a taxa de juros dos EUA, o que pode interferir nas definições da Selic. "Se as taxas forem mantidas nos EUA, isso pode limitar a capacidade do Brasil de continuar aumentando a Selic de forma gradual, obrigando uma elevação mais acentuada", ressalta Eyng.
Inflação
Variação do dólar é determinante para alta dos preços no Brasil. O caminho é aberto pelas políticas econômicas adotadas na principal economia do mundo e a valorização da moeda global. Os analistas entendem que as propostas defendidas por Trump tendem a ocasionar em uma maior valorização do dólar.
Caso Trump vença, o Brasil pode reforçar sua aliança política com os EUA, porém, enfrentará desafios econômicos com um dólar valorizado. Com Kamala, o governo brasileiro pode se beneficiar de um ambiente mais favorável para o comércio exterior.
Sidney Lima, Analista CNPI da Ouro Preto Investimentos
Valorização do dólar atinge diretamente o bolso dos brasileiros. A cotação da moeda norte-americana interfere diretamente no preço das commodities, matérias-primas com cotação internacional. Como consequência da alta, ficam mais caros produtos como o pão e o macarrão, fabricados a partir do trigo, e a gasolina, importada de outros países devido à capacidade de refino insuficiente para atender a demanda nacional pelo combustível.