Fusão Azul e Gol: teste para o Cade e mudanças para os consumidores

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A análise da possível fusão das companhias aéreas Azul e Gol vai ser uma "prova da independência do Cade" (Conselho Administrativo de Defesa Econômica) depois do otimismo demonstrado pelo governo federal com o acordo. É o que afirma uma advogada e ex-assessora jurídica da presidência do grupo, que analisou a situação a pedido do UOL. Outros especialistas ouvidos pela reportagem divergem sobre vantagens e desvantagens ao consumidor.
O que aconteceu
Azul e Gol anunciaram ao mercado que estudam fusão. Foi feito um memorando de entendimentos não vinculante para potencial união dos negócios, de acordo com fatos relevantes da Azul e da Gol ao mercado financeiro. Não há qualquer informação sobre valores de negociação.
Caso fusão se concretize, empresa teria 60% do mercado doméstico de aviação civil. A Latam, que vem na sequência, teria 40%, conforme dados da Anac (Agência Nacional de Aviação Civil).
Governo federal está otimista com fusão. O ministro de Portos e Aeroportos, Silvio Costa Filho, disse que a medida fortalece as empresas. "O pior cenário seria se quebrassem", afirmou nesta quinta-feira (16).
Critérios para análise podem ser mais rigorosos, e decisão será indicador de independência do Cade, segundo ex-assessora jurídica da presidência do órgão. Patrícia Agra, advogada especialista em direito concorrencial, atuou por oito anos e lidou com casos semelhantes em uma época de aumento de relações entre companhias aéreas. Ela acredita que o órgão vai ficar mais atento e criterioso na avaliação dos impactos e eficiência gerados pela transação.
O Cade é um órgão de Estado e não de governo. É um órgão independente, em que os membros possuem mandatos e a análise é técnica, regida por critérios para avaliar os impactos na dinâmica concorrencial
Patrícia Agra, advogada especialista em direito concorrencial, sócia da LO Baptista e ex-assessora jurídica da presidência do Cade
Conselho vai analisar rota a rota e os impactos em cada um dos mercados. Patrícia explica que, em tese, uma maior concentração pode acarretar aumento de preços. "Mas, com a redução de custos, as empresas podem investir mais, melhorar serviços, agregar melhorias de cada empresa aos serviços ofertados", acrescenta.
Na prática, Cade pode intervir com restrições e fazer alterações na operação, ou mesmo não permitir a integração em algumas rotas ou impedir a fusão completamente. Quando passou pelo órgão, Patrícia lembrou de acordos para operação de rotas entre Latam e VoePass e a própria Gol com a Delta Airlines, chamados de codeshare. O objetivo era apurar se os acordos estavam em conformidade com a Lei da Defesa da Concorrência.
Benefício ao consumidor é um ponto de interrogação
Advogados ouvidos pelo UOL divergem sobre o que a fusão pode trazer ao consumidor. Rodolpho Oliveira Santos, advogado especializado em Direito Societário, Aviação e Infraestrutura, acredita que não há nada de bom, já que o objetivo é aliviar os caixas das empresas. Já Fernando Canutto, sócio do Godke Advogados e especialista em Direito Societário, avalia que pode ser possível observar algum benefício, especialmente no serviço de bordo.
Oferta de viagens, horários e destinos pode diminuir. Santos observa que essa já era uma situação enfrentada pelo consumidor em muitos destinos, e que a quantidade pode reduzir ainda mais com a concentração de mercado. "O consumidor vai depender do que a empresa decidir", afirma.
Redução de preços das passagens até pode acontecer. Canutto explica que o custo operacional das empresas pode ser diminuído se apenas uma operar em um trecho específico. Porém, não acredita que a fusão vá provocar uma grande queda nos preços em si. "Se houver economia, podemos ver uma eventual melhora no serviço de bordo, já que o da Azul, por exemplo, é reconhecidamente melhor que o da Gol", compara.
Especialistas concordam que ainda é muito cedo para avaliar possíveis mudanças, já que o Cade ainda precisa aceitar ou não a fusão. Não há uma previsão para quando isso deve acontecer.
Processo até a possível fusão
A Gol fechou em novembro um acordo de reestruturação para sair do processo de recuperação judicial. A empresa entrou no Chapter 11 nos Estados Unidos em janeiro do ano passado.
A Azul fez em outubro um acordo com credores para melhorar sua situação financeira. O acerto prevê a contração de nova dívida de US$ 500 milhões (cerca de R$ 2,8 bilhões), sendo que os atuais credores fornecerão US$ 150 milhões com vencimento em 90 dias, e mais US$ 250 milhões após esse prazo.
No início do mês, o governo federal finalizou outro entendimento com Gol e Azul para redução da dívida das duas companhias aéreas com a União. A Azul pagará R$ 1,1 bilhão de uma dívida de R$ 2,8 bilhões. Já a dívida da Gol passou de cerca de R$ 5 bilhões para R$ 880 milhões.
Gol pode falir se não houver a fusão, como revelou a colunista do UOL Raquel Landim. Afirmação foi feita na tarde de quarta-feira (15) na sede do Cade, em Brasília, antes do anúncio da operação ao mercado.
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