Só tem minimercado perto de casa? O que explica o 'sumiço' dos hipers em SP
Ler resumo da notícia
Você anda menos de 10 minutos e já consegue chegar a um minimercado? Então está sendo impactado por um conceito adotado por grandes redes: o mercado de proximidade.
Apesar de parecer algo recente, a chegada desses minis começou há quase 20 anos. Em 2007, o GPA (Grupo Pão de Açúcar) abriu seu primeiro Extra Perto — hoje Mini Extra. Na época, a explicação foi as mudanças na densidade demográfica da capital paulista. Dada a constante verticalização dos bairros, a rede notou que as pessoas não queriam mais se deslocar tanto atrás de um supermercado para comprar itens básicos.
O desenvolvimento imobiliário é muito grande, principalmente na cidade de São Paulo. E esse desenvolvimento imobiliário, com superfícies menores e muitas vezes sem vaga de estacionamento, mais pessoas morando sozinhas, famílias mais reduzidas, cria-se a necessidade de se fazer compras cada vez mais perto. Frederic Garcia, diretor executivo de negócios especializados do GPA
O GPA então criou lojas menores e com sortimentos diversos para atender os clientes da mesma forma que os supermercados. "Você consegue resolver toda a sua compra. Do pãozinho quentinho ao arroz, azeite, chocolates e frios cortados. Queremos ser vizinhos dos nossos consumidores", diz Garcia.
Como todo setor de supermercados, o GPA observou as tendências pelo mundo. Países da Europa como França e Espanha vinham fechando supermercados com o passar dos anos. Por isso a rede decidiu fechar todos os hipermercados Extra em 2021. "Nos antecipamos", explica o executivo.
As pessoas não querem mais passar uma hora e meia rodando corredores e perdendo tempo. A evolução do consumidor faz com que o hipermercado não faça muito mais sentido. Frederic Garcia, diretor executivo de negócios especializados do GPA
Na contramão dos fechamentos dos supermercados, o número de aberturas de minimercados Minuto Pão de Açúcar e Mini Extra disparou. De 2022 a 2024, foram 146 lojas abertas em grandes cidades paulistas e oito em Recife.
A pandemia também teve seu papel nesse "boom", segundo Natânia Silva Ferreira, economista e doutora em desenvolvimento econômico pela Unicamp. Segundo um estudo que realizou coletando dados entre março de 2020 a março de 2021, o consumo de produtos tidos como "básicos" (arroz, feijão, carne, leite, ovos, frutas e legumes) aumentou exponencialmente na cidade de São Paulo. Para ela, isso pode ter incentivado grandes redes a encontrarem meios de ficarem mais próximas de seus consumidores, que viveram por algum tempo em isolamento, descentralizando o consumo.

Extinção dos hipermercados vem aí?
Diferente do GPA, o Carrefour, mesmo notando as tendências de fora — e sendo uma empresa multinacional francesa —, acredita que o setor de hipermercados "tem um caminho muito longo no Brasil". As palavras são de Marco Alcolezi, diretor executivo de operações nos formatos Super, Hiper e Express.
O hipermercado veio para ficar. Foi o setor que mais vendeu e deu resultado e que mais apoiou a comunidade onde o consumidor estava inserido durante a pandemia, porque ele conseguia ter uma solução completa que os outros não conseguiam. Marco Alcolezi, diretor executivo de operações do Carrefour
Para se manterem mais competitivos, os hipers tiveram que se adaptar com a concorrência dos atacarejos. Os preços foram modificados e os benefícios ampliados para garantir a fidelidade de seus clientes.
Além disso, lojas de hipermercados Carrefour costumam ter sortimentos e serviços variados, e se tornaram complexos onde o cliente pode encontrar de tudo, de eletrodomésticos a salões de beleza.
Outro fator predominante para o sucesso dos hipermercados apontado por Alcolezi foi o e-commerce, que ganhou força nos últimos anos. "Com o online, hoje temos hipermercados em terrenos menores, já que eu não preciso ter 30 marcas de colchões, 70 tipos de aparelhos de TV ou de refrigeradores diferentes."
Mas o grupo não ficou por fora da tendência de proximidade. Depois de 18 meses de estudo, lançou, em 2012, seu primeiro Carrefour Express, a versão minimercado da marca, abrindo 144 lojas na Grande São Paulo desde então.
Os critérios de abertura são bem parecidos com os de seus concorrentes: densidade populacional da região e público-alvo. "Perto dos metrôs e em shoppings as lojas funcionam bem", disse Alcolezi.

Por que São Paulo é a "terra das proximidades"
Assim como o GPA e Carrefour se apoiam na questão demográfica para abrir novos minimercados, Ferreira também acredita que as mudanças urbanas impactam a demanda que será gerada em determinadas regiões da cidade.
Se as pessoas migraram para um bairro novo, se um condomínio foi construído em uma determinada região, os mercados consideram que há uma demanda ali. Então essas grandes redes acabam preferindo ficar cada vez mais perto de seus consumidores. Natânia Silva Ferreira, economista e doutora em desenvolvimento econômico pela Unicamp
Em contrapartida, a economista não enxerga o mesmo movimento em outras regiões do Brasil. "No sul de Minas, onde vivi, e em Ilhéus, onde vivo hoje, os hipermercados chegaram e estão com tudo", disse.
Um outro forte nome do setor de proximidades é o Dia Brasil, que traduz ainda mais o diferencial de São Paulo para outros estados brasileiros: o Dia Supermercados, que já nasceu como um mercado de proximidade e teve que encerrar diversas lojas pelo país, dando ênfase apenas para algumas cidades paulistas.
Recentemente, a rede teve que se ater somente ao estado de São Paulo após fechar mais de 300 lojas pelo Brasil. A região foi escolhida justamente pela maior possibilidade de rentabilidade e por ajudar a poupar custos de logística.
A marca se reposicionou como um "atacadinho de bairro", repaginando fachadas de lojas e atuando para melhorar a experiência de compra. "O DNA do Dia é a proximidade", confirma Fabio Farina, CEO do Dia Brasil.
Entenda como funciona a estratégia do mercado de proximidade:
Os mercados de proximidade se apegam primeiramente às oportunidades dos locais onde estão estrategicamente colocados. A quantidade de pessoas que vivem ali é apontada como determinante para o sucesso da operação.
Depois disso, entra em ação o público-alvo. Enquanto o Minuto Pão de Açúcar está estrategicamente colocado em bairros de classe A e B, o Mini Extra, Carrefour e Dia estão em locais onde as classes B e C predominam.
Por último, a concorrência, que a cada dia fica mais acirrada, principalmente nos maiores bairros mais populosos de São Paulo. Para lidar com ela, as três redes entrevistadas se agarram em diferenciais competitivos, como a variedade de sortimentos, serviços de padaria e até a disponibilidade de pessoas para auxiliar na jornada de compra.
Deixe seu comentário
O autor da mensagem, e não o UOL, é o responsável pelo comentário. Leia as Regras de Uso do UOL.