Com reforço de R$ 350 mi, estoques da Conab devem ajudar a regular preços
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A Conab (Companhia Nacional de Abastecimento) receberá um reforço de R$ 350 milhões no orçamento deste ano para a formação de estoques reguladores de arroz, feijão e milho. Em um momento de alta dos preços dos alimentos, iniciativa pode ter impacto sobre a inflação. Entenda.
O que aconteceu
Conab deve reforçar estoques regulatórios. Em entrevista ao Valor, o presidente da Conab (Companhia Nacional de Abastecimento), Edegar Pretto, afirma que a empresa pública terá um reforço de R$ 350 milhões no orçamento deste ano para a formação de estoques reguladores de arroz, feijão e milho. Com isso, a verba total em 2025 poderá chegar a R$ 539,9 milhões para a compra e armazenamento dos produtos, se houver queda nos preços. Em 2024, os valores aplicados ficaram na casa dos R$ 124 milhões.
Estoques públicos garantem renda e auxiliam no controle de preços. Como descrito pela própria Conab em seu site, os estoques "têm como objetivo garantir o preço e a renda do produtor, bem como regular o abastecimento interno, para atenuar as oscilações de preço." Por meio de nota, a companhia explica os estoques buscam "estabilizar o abastecimento, reduzir os efeitos de grandes oscilações no mercado e preparar o país, estrategicamente, para garantir a segurança alimentar do brasileiro. Ainda mais diante da volatilidade do momento tarifário internacional."
Comida mais cara é problema mundial, não só do Brasil. Além de questões climáticas, e conflitos mundiais, como a guerra na Ucrânia (um grande exportador de grãos), a inflação dos alimentos é um problema que vem tirando o sono de muitos governantes mundo afora. Incluindo os Estados Unidos. Ou seja, não é apenas uma grande dor de cabeça nacional.
No entanto, Brasil zerou estoques reguladores. Mauricio Andrade Weiss, professor do Programa de Pós-Graduação Profissional em Economia da UFRGS fez uma retrospectiva e lembrou que o Brasil zerou o estoque de grãos com exportações em administrações anteriores.
Medida afetou toda a cadeia de alimentos. Isso trouxe prejuízos, incluindo o consumo dos animais, afetando a cadeia como um todo, refletindo no preço dos ovos e carnes. "Voltar a trabalhar com a questão dos estoques é favorável, mas é difícil resolver isto rapidamente. Por que é necessário ter uma grande oferta, com compras do exterior e os preços internacionais estão altos", acrescenta.
Questionada, Conab afirma que trabalha para recompor os estoques. "Há um grupo interministerial debatendo formas de retomar nossa política de estoques, que foi deixada de lado pelo governo Bolsonaro. Para se ter uma ideia, o governo passado fechou 27 armazéns e comprometeu a manutenção dos 64 restantes pela falta de investimento. E os estoques estavam zerados e desde então os mercados têm se mantido aquecidos, dificultando a formação dos estoques. Com a supersafra, esperamos oportunidades em alguns produtos, como é o caso do arroz."
Acordo com BNDES deve ampliar capacidade de armazenamento. Ainda, conforme a nota, "fizemos um contrato com o BNDES para modelagem e reforma de oito armazéns em troca de outros nove, que perderam capacidade de armazenar devido ao crescimento urbano em seu entorno, dificultando a manobra de carretas ou expurgo do produto. Este acordo ampliará nossa capacidade de armazenamento em 33%, saindo de 900 mil para 1,2 tonelada."
Medidas não devem ter resultado imediato
Especialista acredita que é preciso investir na produção no país. Em médio e longo prazos, Maurício é a favor de investimentos constantes em irrigação, produzir fertilizantes internamente e depender menos do mercado mundial, projetos que contavam com a parceria da Petrobras, que foram interrompidos." Ajudaria ter mais linhas do Plano Safra, com juros mais específicos e baixos", fala.
Resultados não devem vir no curto prazo. Para Henrique Morrone, professor de economia, também da UFRGS, a iniciativa é importante quando a intenção é o controle dos preços. Mas, não trará resultados esperados a curto prazo.
Necessidade de ampliar investimentos principalmente em infraestrutura. A ideia é ter abundância, uma maior quantidade ofertada, ainda mais em tempos de inflação, causada por inúmeros fatores, em especial, questões climáticas. Porém, na opinião do docente, existem outras saídas políticas de maior eficácia, como investimentos em infraestrutura para facilitar o escoamento da safra.
Investir em transporte para não depender do preço do diesel é uma alternativa. "Eu me refiro aos meios de transporte ferroviário e pluvial. Desta forma o preço do diesel utilizado nos caminhões não impactaria no aumento dos preços dos alimentos", aconselha. Henrique acrescenta outra solução para baixar os preços. Adotar cotas de exportação para ter mais produtos oferecidos internamente. "Outra seria a redução do ICMS, porém, esta última demandando negociações diretas com os Estados para os produtos da cesta básica".
Preço ao produtor e preço ao consumidor
Na opinião de Antonio da Luz, economista-chefe do Sistema Farsul, a Conab deseja fazer estoque de grãos (arroz, milho, soja, trigo). Mas não é o que está mais caro, pois, atualmente, os valores estão mais baixos do que há quatro anos.
"Preço ao produtor e preço ao consumidor são completamente diferentes. Não tem nada a ver uma coisa com a outra. Porque entre um e outro são centenas de milhares de empresas que se envolvem no processo para chegar até a gôndola do supermercado. É uma simplificação da realidade. Um desperdício de dinheiro público que vai ampliar ainda mais o gasto fiscal".
Medida não combate inflação, segundo pesquisador da FGV. Seguindo a mesma linha de raciocínio, Felippe Serigati, pesquisador do FGV Agro, afirma que a medida não resolve o problema da inflação. A formação de estoque tem por objetivo reduzir a oscilação de preço junto ao produtor e é benéfico quando o valor cai muito, fica muito baixo. "Ainda assim funciona mais com alimentos domésticos, como o feijão, que não depende do mercado internacional, do que o milho, por exemplo, com cotações determinadas por Chicago", analisa.
Produção estável
Seguro rural pode ser um caminho para aumentar a oferta de produtos. Uma sugestão apontada por Serigati, é a de que os R$ 350 milhões gastos com o estoque pela Conab poderiam ser alocados como seguro rural. "Aumenta a chance de você ter maior estabilidade na oferta destes alimentos. Não estou dizendo que os preços vão cair ou subir. Mas, isto faz com que a produção fique mais estável e previsível, principalmente em ambientes com tantas mudanças climáticas".
O ideal, revela, é que esta quebra de safra se torne pontual, restrito àquele ciclo. E, que no próximo, o produtor tenha condições de realizar suas atividades normalmente. Se o agricultor perde recursos, ele consegue respirar aliviado na temporada seguinte. "Outra coisa. Você só pode acionar estoque quando o preço fica abaixo do mínimo. E inflação é preço para cima, e não para baixo. Para mim, não faz sentido".