Empresas abandonaram o home office? Modalidade perde espaço ao presencial
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O home office ganhou força na pandemia da covid-19 e parecia ter vindo para ficar. Mas, agora, parece estar com os dias contados - ou, pelo menos, dando espaço para o modelo híbrido.
No exterior, grandes empresas como Amazon, Apple, Disney, Meta e Dell já determinaram a volta ao presencial. Entre as justificativas estão a maior colaboração e inovação, troca de ideias e desenvolvimento de projetos e melhora na eficiência por conta da presença física.
O que aconteceu
Movimento de volta ao escritório se repete no Brasil. A fintech Smart Save aderiu ao home office em 2023, mas, em outubro de 2024, decidiu voltar ao presencial. A principal motivação foi a necessidade de fortalecer a cultura da empresa, melhorar a interação entre as equipes e também potencializar a produtividade. Já o Estúdio Jacarandá voltou ao presencial por conta do crescimento da demanda de trabalho e de rentabilidade. Neste ano, a empresa registrou alta de 30% na procura por serviços de arquitetura e design justamente pela volta ao presencial. Na Jacarandá, o home office total foi adotado em 2020 e o presencial voltou em 2021.
À medida que a empresa crescia, nós percebemos o desafio relacionado à comunicação entre os setores e a interação do time também. Não houve uma queda drástica na produtividade (com o home office), mas sentimos que alguns pontos poderiam ser aprimorados para garantir um ambiente de trabalho mais dinâmico e colaborativo. Observamos que, ao estarmos fisicamente juntos, a comunicação se tornou mais clara, a colaboração entre os setores fluiu muito melhor e a concentração no trabalho também. Susan Speltz, CEO da fintech Smart Save
Em 2021 notamos que a equipe já sentia falta da troca diária de informações e da resolução rápida de problemas. Outro ponto importante é que lidamos com dados confidenciais dos nossos clientes e, embora tenhamos uma equipe de TI dedicada à segurança cibernética, o trabalho presencial garante maior controle e proteção das informações Daniel Melloni Garcia, sócio do Estúdio Jacarandá
Empresa adotou o modelo híbrido. Na Smart Save, ficou definido o trabalho presencial de segunda à quinta-feira na empresa e, na sexta-feira, home office. A transição entre os dois modelos foi gradual e planejada. A maioria dos funcionários recebeu bem a mudança. Houve, porém, um caso específico, de um colaborador que demonstrou resistência ao retorno presencial. "Alegando se sentir pressionado nesse modelo, nós mantivemos um diálogo aberto com ele para entender suas preocupações e chegamos a um acordo que permite que ele trabalhe remotamente nas quintas e sextas-feiras".
Modelo híbrido já alcança quase 50% das empresas, aponta pesquisa. Estudo da ABRH (Associação Brasileira de Recursos Humanos) indica que, no ano passado, o modelo híbrido alcançou 46,2% das empresas, quase no mesmo nível do trabalho 100% presencial. "O modelo híbrido de trabalho tem se consolidado entre as empresas brasileiras, apresentando um crescimento nos últimos anos", explica Eliane Ramos, presidente da ABRH. "Essa tendência reflete a busca por um equilíbrio entre a flexibilidade do trabalho remoto e a necessidade de presença física, adaptando-se às novas exigências do mercado e aos desejos dos colaboradores", complementa Ramos.
Preferência por modelos híbridos ou remotos ainda varia de acordo com o setor, a cultura organizacional e as expectativas dos trabalhadores. "Atualmente o trabalho 100% presencial lidera em nossa pesquisa 'O Cenário do RH no Brasil' realizada em 2024, com 46,6% das empresas optando por esse modelo", explica a presidente da ABRH.
Volta ao presencial requer cuidados das empresas
Deve ser dado prazo mínimo de 15 dias para a transição do home office ao presencial. "Nos casos em que o empregado opte (sendo possível) por continuar em casa, o empregador terá cessada a sua responsabilidade com despesas ligadas ao trabalho presencial", esclarece Márcia Cleide Ribeiro, advogada especializada em Direito do Trabalho.
As empresas podem oferecer bônus para o retorno presencial, o que já ocorre no exterior. "Não há impedimento para que as empresas estimulem o retorno ao trabalho presencial com bônus, desde que não haja ruptura da CLT nesse processo. Além disso, é fundamental a consciência de que decisões de mudança compulsória só se tornam válidas se contratualmente prevista a reversibilidade ou então mediante acordo prévio", complementa a advogada.
Outros benefícios podem ser oferecidos para facilitar a transição. A empresa pode conceder, como política de RH para manter o bom ambiente de trabalho, flexibilidade de horário de entrada e saída, estacionamento e amenidades, como café da manhã, snacks e happy hour. "São benefícios que não integram necessariamente o contrato de trabalho e podem aumentar o engajamento dos empregados", lembra Thereza Cristina Carneiro, sócia da área Trabalhista do CSMV Advogados.
Colaborador pode se recusar a voltar ao presencial. Isso ocorre em casos em que haja prejuízos graves, como à saúde ou custos adicionais que não serão reembolsados. Ele poderá contestar a mudança e manifestar seu desejo de não aderir a ela. "O trabalhador pode se recusar a esse retorno se não houver previsão contratual e retorno compulsório, o que retira do trabalhador a possibilidade de requerer o retorno sem acordo", afirma Ribeiro. Porém, isso muda caso haja cláusula de reversibilidade no contrato de home office. Nesse caso, o trabalhador pode retornar ao trabalho a qualquer momento - desde que seja avisado com pelo menos 15 dias de antecedência.
Funcionário pode entrar na Justiça para continuidade do trabalho remoto. Mas, antes da judicialização, sugere a advogada, é fundamental que sejam feitas tentativas de negociação coletiva, ajustes e práticas gerais para evitar um desfecho crítico.
Trabalhador pode também pedir rescisão indireta com as multas aplicáveis ao caso, pela violação contratual grave, preservando direitos rescisórios. Em alguns casos também pode requerer o pagamento de danos morais se houver pressão ou assédio ilegais. "Desta forma, mudanças sem previsão contratual de reversibilidade geram alteração ilegal das condições de trabalho".
A meu ver, o ideal é que as partes da relação de trabalho negociem de forma clara as regras do regime de teletrabalho e a possibilidade de retorno às atividades presenciais, tudo formalizado em contrato. Além disso, diante da acomodação das pessoas em determinado regime de trabalho, quanto melhor for a comunicação (com ou sem a participação sindical, já que não há qualquer exigência), o prazo para adaptação (respeitado o mínimo legal) e a transparência na programação da empresa de retorno às atividades presenciais, menores serão os impactos nas relações de trabalho Thereza Cristina Carneiro, sócia da área Trabalhista do CSMV Advogados