Decisão de Trump de taxar quem comprar petróleo da Venezuela é legal
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A decisão do presidente dos Estados Unidos Donald Trump em taxar produtos dos países que importarem petróleo da Venezuela não é ilegal, de acordo com o direito internacional. Ela pode ser interpretada de duas formas: protecionismo para garantir fornecimento exclusivo de petróleo ou uma "demonstração de força". É o que avaliam especialistas ouvidos pelo UOL, que consideram que o Brasil pode ser pouco afetado com decisão.
O que aconteceu
Taxas de 25% serão aplicadas aos produtos de países que importarem petróleo e gás venezuelano, seja por negociação direta ou por terceiros. Decisão havia sido anunciada por Donald Trump e ratificada anteontem à noite pela Casa Branca. Argumento dos EUA é que "as ações e políticas do regime de Nicolás Maduro continuam a representar uma ameaça incomum e extraordinária à segurança nacional e à política externa". Medida começa a valer em 2 de abril.
China já se manifestou, e disse que medida é ilegal. Só que, apesar de parecer, é considerada legal no ponto de vista do Direito Internacional. Não há, por exemplo, nenhuma norma que impeça diretamente isso. Daniel Toledo, advogado especializado na área, considera que não há a invasão à soberania dos demais países, mas que se trata apenas de uma relação comercial, com o objetivo de não querer "ajudar" um país que é considerado desafeto.
Trump está simplesmente dizendo: 'olha, eu tenho um desacordo comercial com esse determinado país, não quero adquirir nada que possa beneficiar esse país. Eu não estou te proibindo de comprar nada, mas, se você quiser vender algo para mim eu vou pagar um preço diferenciado porque vou procurar outro parceiro comercial
Daniel Toledo, advogado especializado em Direito Internacional
Estados Unidos tem autonomia para importar e taxar produtos. Guilherme Rosenthal, especialista em comércio exterior e co-CEO da Vixtra, complementa a explicação de que Trump está nada mais do que selecionando quais países ele vai impor tarifas. "Não vejo ilegalidade, é simplesmente o critério que ele escolheu pra aplicação de tarifas de importação, o qual todo o país tem tem independência na aplicação delas", analisa.
Prerrogativa de implementar políticas comerciais é uma característica do governo Trump. Por mais que a tarifa seja aplicada a um terceiro que faz negócio com a Venezuela, os EUA entendem que o país é um "estado inimigo", segundo interpretação do advogado especialista em Direito Internacional Empresarial Fernando Canutto. Ele considera verossímil a decisão. "Consequentemente todos aqueles que se aliam a ela, a fazer um negócio com ela, também merecem uma sanção", complementa.
Não é a primeira vez
Em novembro de 2018, durante primeiro mandato, o presidente dos EUA já havia criado uma ordem executiva congelando bens e interesses de pessoas que operavam em setores chave da economia venezuelana na época. Além disso, proíbe a entrada de estrangeiros associados a essas atividades nos Estados Unidos, limita doações para essas pessoas e impede transações financeiras relacionadas. Foi o professor de Direito Internacional Vladimir Feijó, da Uniarnaldo Centro Universitário, em Belo Horizonte (MG), que lembrou dessa decisão.
Os Estados Unidos usam do peso militar e, acima de tudo, do peso econômico para fazer ameaças ou aplicar decisões que, muitas das vezes, outros países se recusam a responder com retaliação, porque sairiam ainda mais prejudicadas por justamente depender dos negócios com os americanos
Vladimir Feijó, professor de Direito Internacional da Uniarnaldo Centro Universitário, em Belo Horizonte (MG)
Trump quer "ajustar as peças do tabuleiro" e exercer influência direta sobre a Venezuela para prejudicar Rússia, China e Irã. Interpretação é do professor do curso de Relações Institucionais da ESPM, Roberto Uebel. Ele não acredita que a taxação seria pura e simplesmente para países que negociarem com a Venezuela, senão os EUA teriam que se cobrar também. "Entendo que, nesse jogo, ele quer influenciar diretamente a Venezuela e o regime de Maduro, e garantir fornecimento exclusivo de petróleo para os Estados Unidos", afirma.
Efeitos, porém, podem vir contra à própria economia americana. Alerta é de João Estevam, professor de Relações Internacionais da Anhembi Morumbi, que afirma que o aumento nas taxas de importação podem, por exemplo, aumentar a inflação local. "O que me parece é que a estratégia geral do governo Trump, não só nessa área como em outras também, envolve geralmente uma pressão inicial feita pelos Estados Unidos, e depois uma tentativa de negociação buscando sempre favorecer os termos norte-americanos", pondera.
Um fato é que o cenário mundial vai ser impactado com a decisão - mesmo que não financeiramente. "Com certeza vai fazer aumentar a pressão econômica sobre a Venezuela, mas pode prejudicar as relações dos EUA com outros países que importam o petróleo", afirma Canutto.
Pensando no bem-estar, ou seja, no livre comércio com os Estados Unidos, os países afetados podem talvez forçar ou sugerir que a Venezuela mude a postura com relação aos temas que estão incomodando os Estados Unidos
Fernando Canutto, sócio do Godke Advogados e especialista em Direito Internacional Empresarial
Brasil até pode ser afetado, mas efeitos podem não ser tão grandes assim. Segundo Guilherme Rosenthal, o país importa fertilizantes, alumínios, álcool e principalmente energia da Venezuela. "Petróleo e gás não estão muito na pauta importadora do Brasil com a Venezuela no momento. Então, o impacto não seria relevante para o Brasil", avalia.