Tarifas comerciais dos EUA niveladas a 10% para todos são desafio ao Brasil

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A decisão de Donald Trump em suspender por 90 dias as tarifas recíprocas de vários países, trazendo todas para o piso de 10% de alíquotas, pode representar um desafio para o Brasil, mas, ao mesmo tempo, uma oportunidade para expandir negociações com a China, que vive um cabo de guerra com os EUA. Porém, analistas ouvidos pelo UOL afirmam que há muita incerteza sobre o que pode acontecer daqui para a frente.
O que aconteceu
Política dos EUA para os seus parceiros comerciais é dividida entre tarifas abrangentes e tarifas recíprocas. As taxas abrangentes começaram a ser cobradas no sábado passado, de 10%. As recíprocas passaram a valer hoje para os países que cobravam mais que 20% em tarifas dos EUA, conforme cálculos do governo americano. Decisão anunciada na tarde de hoje, porém, suspende essas tarifas para 75 países —que ainda não foram listados.
Suspensão é válida por 90 dias. Em uma rede social, Trump disse que a medida foi adotada após os países demonstrarem "interesse em negociar com os Estados Unidos tarifas mais justas" para os americanos.
Exceção é a China, com quem os EUA disputam um cabo de guerra tarifário. A alíquota de imposto de importação já havia sido aumentada para 104%, mas foi ampliada para 125% hoje. México e Canadá não entraram na política de tarifas recíprocas.
Nivelação das taxas pode representar um desafio para o Brasil. Segundo Alberto Carbonar, sócio de Relações Governamentais na Nelson Wilians Advogados, embora possa estimular a busca por novos mercados e aprimorar a eficiência produtiva, o impacto geral tende a ser negativo, encarecendo as exportações brasileiras e reduzindo a competitividade em setores como manufatura e tecnologia. "A resposta do Brasil, seja por meio de retaliação, negociação ou recurso à OMC (Organização Mundial do Comércio), exigirá uma análise cuidadosa para mitigar os impactos negativos e preservar o crescimento econômico", afirma.
Porém, agronegócio pode se safar, mesmo com tarifas "iguais". Carbonar disse que, no caso da retaliação da China aos produtos americanos, o Brasil pode se beneficiar com o aumento da demanda chinesa pelos produtos agrícolas, fortalecendo a posição como um dos principais fornecedores para o mercado de lá. "Além disso, a busca por novos mercados e a diversificação de produtos podem impulsionar a inovação e a agregação de valor, tornando o agronegócio brasileiro mais resiliente e competitivo a longo prazo", acrescenta.
Brasil tem uma pauta de exportações para os Estados Unidos bastante concentrada em produtos como aço, alumínio, petróleo e alimentos — setores sensíveis a qualquer variação de custo logístico ou tributário. Para Renata Bilhim, advogada tributarista e ex-conselheira do Carf (Conselho Administrativo de Recursos Fiscais), a medida até pode parecer neutra, já que o Brasil está entre os países contemplados com essa tarifa básica, o que evita penalizações maiores, como as impostas à China, por exemplo, mas a uniformização das tarifas, ainda que provisória, pode acabar sendo prejudicial para o Brasil a médio e longo prazo, especialmente se ela sinalizar um movimento duradouro de restrição comercial.
Ao adotar essa política tarifária mais agressiva, os EUA pressionam parceiros comerciais a renegociarem termos com foco em benefícios bilaterais. "O Brasil não tem, hoje, um acordo de livre comércio com os Estados Unidos, então fica em desvantagem nesse processo", diz.
Então eu diria que essa decisão é, sim, um alerta importante para o Brasil. Não estamos no pior cenário possível, mas a sinalização política e econômica que ela traz exige atenção e uma atuação estratégica por parte do governo e das empresas brasileiras
Renata Bilhim, advogada tributarista e ex-conselheira do Carf (Conselho Administrativo de Recursos Fiscais)
Mesmo com tarifas niveladas, Brasil pode ser beneficiado. Cleber Rentroia, especialista em renda variável na Blue3 Investimentos, lembra que a redução das tarifas recíprocas é temporária, e que valores ainda podem ser superiores a 10% no futuro. Ele avalia que a questão principal é a disputa com a China. E, como a China é um país que importa muitos grãos e proteínas dos Estados Unidos, "a chave pode virar" para que o Brasil supra essa necessidade.
Nós somos grandes exportadores de grãos e proteínas. Podemos aumentar essa nossa exportação para os Estados Unidos e para China, e em contrapartida também melhorar a nossa pauta de exportações com os EUA. Então a gente pode sair beneficiado por essa briga entre os nossos dois principais parceiros comerciais
Cleber Rentroia, especialista em renda variável na Blue3 Investimentos
Guerra tarifária e comercial ainda é uma grande incógnita para o mundo. Felipe Leonard, CEO da S.I.N.,acredita nisso, e vê que as tarifas criam ruídos e barreiras, transferências de riqueza entre os envolvidos no ecossistema global. "O motor das economias deve ser movido a inovação, qualidade, produtividade e eficiência. Esses são os únicos fatores que criam riqueza real e sustentável no longo prazo, e tem sido os responsáveis da prosperidade das nações e redução drástica nos níveis de pobreza e miséria globais na era moderna", afirma.
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