Primeira semana do tarifaço tem 'chumbo trocado', ameaças e muitas dúvidas
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A primeira semana útil do tarifaço de Donald Trump foi marcado por um cabo de guerra tarifário com a China, suspensão das taxas recíprocas, perdas significativas nas Bolsas de valores e mercados de ações, e flutuabilidade do dólar frente às moedas nacionais.
O UOL preparou um resumo dos principais fatos que marcaram esta semana e lista cinco pontos para que você possa entender o que já aconteceu no tarifaço —e o que ainda pode surgir.
O que aconteceu
Tarifas entraram em vigor oficialmente no sábado (5), mas foram divididas em duas categorias. A primeira era de "tarifas globais", onde todos os países que comercializam produtos com os EUA foram taxados em 10%. A segunda categoria foi a de tarifas recíprocas, para quem cobrava mais de 20% em uma conta feita pelo governo Trump. Essas entraram em vigor na quarta-feira.
Tabela com as tarifas recíprocas foi publicada como um anexo da ordem executiva do tarifaço. Ao todo, 64 países foram listados. Lesoto, na África, era (até então) quem tinha a maior taxa: 50%. Camarões e República Democrática do Congo tinham a menor, 11%.
Na quinta-feira, após dizer que vários países estavam dispostos a negociar, Trump decidiu suspender as tarifas recíprocas. A medida vale para 75 países —não divulgados até hoje, por um período de 90 dias, exceto a China.
China começou a retaliar Estados Unidos subindo gradativamente as tarifas. Até ontem, Estados Unidos cobravam 145% dos produtos chineses importados, e China 125%. A diferença de 20% é de uma outra taxa imposta pelos EUA em fevereiro aos países produtores de fentanil.
Resumo desta semana
- 7 de abril: Primeiro dia útil das tarifas globais de 10%. Mercados reagem mal e Bolsas despencam.
- 8 de abril: Bolsas de valores começam a recuperar perdas do dia anterior. No Brasil, dólar volta a ultrapassar R$ 6
- 9 de abril: Tarifas recíprocas passam a valer. No mesmo dia, Trump anuncia aumento nas tarifas da China para 104%. País "devolve" e passa a cobrar 84% de taxa dos produtos americanos
- 10 de abril: Novo valor da China começa a valer, mas Trump anuncia outra subida, para 125%. No mesmo anúncio, presidente fala em pausa nas tarifas recíprocas para os demais países por 90 dias.
- 11 de abril: China faz nova retaliação e aumenta tarifas de produtos americanos para 125%. Aparentemente, há uma "trégua" nas retaliações, enquanto a discussão agora é para ver quem vai se sentar primeiro para negociar com o outro.
Pontos 1: Como fica agora?
Principal questão é o próximo passo da relação China-EUA. Especialistas ouvidos pelo UOL durante a semana dizem que é praticamente certo que as compras e vendas entre os países nunca mais serão as mesmas, mas acreditam que a "troca de farpas em forma de porcentagem" deve acabar, uma vez que não faz mais sentido cobrar algo acima de 100%.
Ministério das Finanças da China deu a entender, em nota, que os 125% seriam o teto para a escalada comercial deflagrada por Donald Trump. "Não há vencedor em uma guerra tarifária e ir contra o mundo só resultará em autoisolamento", disse Xi Jiping.
Outros países observam e tentam fazer conjecturas. Negociações para redução das taxas estão acontecendo, mas o governo americano se recusa a dar nomes de países que estão na mesa —ainda que, em entrevistas, integrantes do governo já tenham deixado escapar que Índia, Austrália e Reino Unido seriam três exemplos. Em uma coletiva de imprensa ontem, a secretária de comunicação, Karoline Leavitt, se limitou a dizer que os encontros estão acontecendo e que, "no momento oportuno, nós informaremos".
Trump não descartou a possibilidade de prorrogar a pausa nas tarifas recírprocas, se avaliar necessário. Em conversa anteontem com jornalistas, na Casa Branca, o presidente dos EUA apenas "completou" as perguntas dos repórteres ao dizer que "é o que deve acontecer" se os países não negociarem tarifas, e que "vamos ver o que acontece" após os 90 dias de prazo.
Ponto 2: E o Brasil?
Brasil permaneceu com a tarifa global de 10%. Como não houve nenhuma taxação superior, já que a "cobrança" média, segundo os cálculos da equipe de Trump, estavam em 10%, o país agora está nivelado com o restante do mundo.
Ainda não há um levantamento de como ficaram as taxas de importação dos produtos brasileiros consumidos pelos americanos. A única tarifa que é conhecida é a do aço, alumínio e derivados, taxados em 25% em fevereiro. Apesar disso, março representou um bom mês de exportações para o Brasil, com mais vendas, apesar de já ter sentido o impacto da tarifa.
Nova tarifação à China e cabo de guerra representa oportunidade para o Brasil. Até mesmo o café, que tem nos EUA os maiores importadores, pode se aproveitar da possibilidade de abertura de novos mercados. O preço no mercado interno pode nem cair, como seria o esperado. O ministro da Fazenda, Fernando Haddad (PT), considerou que a escalada na tensão comercial era um "solavanco forte".
Brasil conversa com China e União Europeia. Ontem, Geraldo Alckmin (PSB), vice-presidente e ministro do Desenvolvimento, Indústria, Comércio e Serviços, se reuniu com o ministro do Comércio chinês, Wang Wentao, para debater as tarifas e também abrir portas para negociações maiores entre os dois países. O próprio Fernando Haddad também disse que o país negocia com os três blocos econômicos (EUA, União Europeia e Ásia) enquanto técnicos tentam usar a diplomacia para negociar redução dos 10% de tarifas.
Visão é que Brasil sai "menos prejudicado" em toda essa história. Ainda que as taxas de 10% possam representar algum alerta para setores como etanol, produção de aviões e café, integrantes do governo tem repetido constantemente que tudo poderia ter sido "muito pior". Porém, especialistas consultados pela reportagem nos últimos dias acreditam que a inflação e a taxa de juros brasileira podem ser impactadas pelos efeitos do tarifaço.
Ponto 3: Recessão? Inflação?
Próprio Fed (Federal Reserve, o Banco Central americano) não descarta possibilidade de recessão nos Estados Unidos. A presidente da unidade de Boston, Susan Collins, disse ontem em entrevista ao Yahoo! Finances que essa é uma possibilidade real, e que os EUA podem ter um crescimento fraco em 2025.
Possibilidade de recessão mundial também foi levantada, após o comportamento do mercado na segunda-feira. Com as Bolsas do mundo todo em queda livre, muitos analistas avaliam que possibilidade era real, principalmente com encolhimento de exportações. Porém, após pausa, ânimos se acalmaram, apesar dessa consequência não ser totalmente descartada.
Aumento na inflação dos EUA é efeito mais plausível. Não são poucos os analistas que consideram que os efeitos do tarifaço e das medidas protecionistas de Trump podem se voltar para o próprio país. A queda da inflação de março para 2,4% não significa necessariamente que as medidas deram certo, uma vez que eram "poucas" as taxas que estavam em vigor até o fechamento desses dados. O número de abril pode provocar uma interpretação mais clara nesse sentido.
Ponto 4: A insegurança
Tarifas de Trump acabaram por criar um clima de insegurança muito forte no mundo. Até os títulos do Tesouro americano, que eram considerados os investimentos mais seguros, deixaram de ser. Isso pressiona fortemente os juros, que chegaram a mais de 4,3% nos últimos dias para os títulos que vencem em até 10 anos.
Agora, muitos investidores estão indo para o ouro, que registrou novas máximas históricas nessa semana. Ontem, por exemplo, fechou a cotação valendo US$ 3.244 a onça-troy.
Pausa nas tarifas é "fraca", disse o primeiro-ministro da França, Emmanuel Macron. Em uma publicação nas redes sociais, o premiê argumentou que "as tarifas de 25% sobre aço, alumínio e automóveis e as tarifas de 10% sobre todos os outros produtos ainda estão em vigor", porém reconheceu que é uma porta aberta à negociação.
Ponto 5: Bolsas e dólar
Logo no primeiro dia útil do tarifaço, as Bolsas de valores do mundo todo derreteram. Tóquio caía tanto que teve que suspender as negociações, o chamado circuit breaker. O Ibovespa também caiu. A situação foi tão caótica que muitos especialistas começaram a prever uma recessão mundial. Trump negou voltar atrás no tarifaço. No Brasil, o dólar flertou com a casa dos R$ 6, apesar de ter fechado "na beira", em R$ 5,91. O impacto do tarifaço que derrubou as Bolsas acabou por valorizar a moeda americana em muitos países.
Na terça-feira, a situação foi inversa. As Bolsas da Ásia e Europa fecharam em alta, ainda que a de Nova York registrou grande oscilação. Era uma espécie de recuperação "pós-baque". No Brasil, porém, a Bolsa registrou segundo dia de perdas, e o dólar ultrapassou os R$ 6 seguindo a tendência de valorização mundial. Era a primeira vez em 11 semanas que a moeda americana voltava a subir tanto, por causa do medo da guerra comercial.
Depois, dias de oscilação marcaram o mercado financeiro e o câmbio. No Brasil, dólar voltou ao patamar que estava antes do tarifaço (média de R$ 5,80), e as Bolsas do mundo todo passam o dia operando entre altas e baixas, fechando geralmente no positivo, em compasso de espera pelo que pode acontecer.
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