Da descrença nos EUA à recessão mundial: 5 prejuízos do tarifaço de Trump

A guerra tarifária desencadeada pelo presidente americano, Donald Trump, já causou estragos na indústria automobilística e prejuízos bilionários às empresas de alta tecnologia, as big techs. A disputa comercial com a China arranhou a imagem da economia americana, deve render prejuízo de R$ 28 bilhões ao Brasil e mergulhar o mundo em uma recessão.

Conheça cinco consequências dessa guerra tarifária:

1 - Recessão mundial

O mundo pode entrar em estagflação e até recessão em 2025. "O impacto global da guerra tarifária representaria queda de -0,25% no PIB global, equivalente a uma perda de US$ 205 bilhões", indica estudo publicado ontem (14) pela Universidade Federal de Minas Gerais (Nemea-Cedeplar-UFMG). "A modificação das tarifas de importação teria impactos relevantes mundialmente."

As economias da China e Estados Unidos também seriam afetadas. O PIB americano reduziria -0,7% e o chinês -0,6%. O comércio diminuiria -2,38% no mundo, "perdas na ordem de US$ 500 bilhões", diz o estudo.

A estagnação econômica deve se somar à alta da inflação. "A gente está num cenário de disputa política, geopolítica, uma disputa pesada. Não tem nenhuma consideração econômica nessas decisões, e isso deve conduzir o mundo a um quadro de estagflação, menos crescimento com mais inflação", diz o economista-chefe do Banco BV, Roberto Padovani.

Como a cadeia global de produção está muito mais integrada, quando você impõe barreiras, gera um choque de oferta, mesmo com a economia desacelerando, o que gera inflação.
Roberto Padovani, economista

2 - Big Techs perdem bilhões

Empresas de alta tecnologia viram suas ações derreterem nas Bolsas de Nova York
Empresas de alta tecnologia viram suas ações derreterem nas Bolsas de Nova York Imagem: Brendan McDermid/File Photo/Reuters

Desde o início da guerra tarifária, as ações das big techs desvalorizaram. As "Sete Magníficas" —Alphabet, Amazon, Apple, Meta, Microsoft, Nvidia e Tesla— perderam US$ 973 bilhões entre 2 e 10 de abril. Só a Apple derreteu US$ 502 bilhões naqueles dias, já que 80% dos iPhones comercializados nos EUA são produzidos na China.

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Diante dos prejuízos, os EUA isentaram das tarifas recíprocas uma lista de produtos de alta tecnologia. A isenção, no entanto, deve ser temporária, segundo a Alfândega e Proteção de Fronteiras dos EUA.

Mesmo que a Apple seja isenta das tarifas atuais, precisará acelerar seus esforços de diversificação da cadeia de suprimentos e pagar melhor seus fornecedores.
Consultoria americana Jefferies, em nota

3 - Tarifas abalam setor automotivo

As tarifas de 25% sobre a importação de carros prejudicam montadoras. A Stellantis paralisou a fabricação de veículos Chrysler e Jeep no Canadá e no México e demitiu 900 trabalhadores americanos que, dos Estados Unidos, forneciam motores e peças para essas fábricas.

Montadoras europeias reduziram exportações para o mercado americano. A Audi, na Alemanha, e a Jaguar Land Rover, na Grã-Bretanha, reduziram suas exportações. A decisão deve mexer com a indústria americana, que importa quase metade de seus veículos e 60% das peças usadas no carros montados no país.

Os veículos devem ficar 13,5% mais caros, em média, naquele mercado. O reajuste deixaria o carro US$ 6.400 mais caro, em média, na comparação com o preço de 2024, segundo estimativa da Yale Budget Lab.

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Após o anúncio das tarifas de 15% sobre carros importados, em março, as ações de gigantes do setor despencaram. As da Porsche e da Mercedes caíram até 5,7%, a BMW recuou 4,9%, as da Volkswagen (dona Audi e Lamborghini) caíram 4,3%.

Ontem (14), Trump anunciou que avalia isenção tarifária temporária. "Estou buscando algo para ajudar algumas montadoras que estão migrando para peças fabricadas no Canadá, México e outros lugares e precisam de um pouco mais de tempo", disse.

4 - Confiança nos EUA é abalada

Pela primeira vez, mercado perdeu a confiança nos títulos do Tesouro americano (tresuries). Graças à pujança da economia americana, investidores, bancos e países inteiros compram esses papéis como porto seguro para vendê-los facilmente em emergências. Muitos investidores, porém, liquidaram seus títulos recentemente. "O mercado perdeu a fé nos ativos dos EUA", escreveram analistas do Deutsche Bank em nota na semana passada.

Dona de muitos tresuries, a China pode retaliar o rival liquidando esses títulos. "Os mercados estão preocupados que a China e outros países possam se desfazer desses títulos como forma de retaliação", disse na semana passada Grace Tam, consultora-chefe de investimentos do BNP Paribas Wealth Management, em Hong Kong.

Diante da perda de confiança, Trump adiou em 90 dias a cobrança das tarifas recíprocas. "Nesse cenário, o investidor costuma comprar treasuries, e a taxa cai. Mas [nos últimos dias] tinha gente se desfazendo de treasuries em Wall Street, o que fez as taxas dispararem. Isso é falta de confiança do americano no próprio país", disse em palestra na quinta-feira (10) Cristiano Oliveira, diretor de pesquisa econômica do banco Pine.

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Tarifaço pode levar os EUA à recessão. "A inflação já está perigosa nos EUA, perto de 3%. Com as tarifas, há expectativa de chegar a 6% e aí as pessoas param de comprar, o que vai levar a um quadro de recessão", diz Leonardo Trevisan, professor de relações internacionais da ESPM.

O banco JPMorgan reafirmou uma previsão pessimista. Para o grupo, os EUA têm 60% de chance de entrarem em recessão.

Para o bilionário americano Ray Dalio, os EUA estão "muito próximos de uma recessão". "Estamos tendo mudanças profundas na ordem mundial. Se você considerar tarifas, dívidas, [e] uma potência emergente desafiando o poder existente... A maneira como isso for tratado pode produzir algo muito pior do que uma recessão", afirmou à rede de televisão NBC.

O presidente do Federal Reserve (Fed, o Banco Central americano) fez alerta semelhante. Jerome Powell disse que as tarifas podem aumentar a inflação e desacelerar o crescimento da economia americana no longo prazo.

5 - Brasil terá prejuízos de R$ 28 bilhões

Lavoura de soja em Mato Grosso do Sul: setor deve se beneficiar da guerra tarifária
Lavoura de soja em Mato Grosso do Sul: setor deve se beneficiar da guerra tarifária Imagem: Aprosoja MS
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A pesquisa da UFMG também estima o prejuízo do tarifaço para o Brasil em 2025: US$ 4,9 bilhões, ou R$ 28,6 bilhões em valores atualizados. Beneficiado pelo aumento das exportações para a China, o setor agrícola teria ganhos de US$ 5,5 bilhões, mas a indústria perderia US$ 8,8 bilhões, enquanto serviços pode encolher US$ 1,6 bilhão.

A região Sudeste será a mais prejudicada. "Em São Paulo o impacto corresponderia a uma perda de cerca de R$ 4 bilhões, e em Minas Gerais de R$ 1,16 bilhão", diz o estudo.

A possível recessão global, no entanto, pode frear o aumento dos juros no Brasil. O risco de recessão deve levar o Banco Central a esperar os efeitos da crise antes de continuar a subir os juros para conter a inflação. A JPMorgan agora projeta só mais uma alta da Taxa Selic este ano —de 0,5 ponto para 14,75% na reunião de maio. A redução da taxa começaria em novembro, fechado o ano a 13,75%, contra 15,25% de sua projeção anterior.

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