'Ninguém receberá': aposentados têm dificuldade com Meu INSS e buscam ajuda

É a dona de casa Rosiclare Da Silva Cobo, de 44 anos, quem ajuda sua sogra, a aposentada Maria das Graças da Silva Cobo, 66, além do pai, de 92 anos, e o tio da aposentada, de 90, a consultar o INSS (Instituto Nacional de Seguridade Social) para saber se eles foram vítimas do desfalque de até R$ 6,3 bilhões em aposentadorias e pensões.

A utilização de aplicativo não é tarefa fácil para alguns idosos. Rosiclare ajuda Dona Maria das Graças, que já foi auxiliar de limpeza, para acessar o Meu INSS. "A orientação que eu vi é que a gente tem que pedir o cancelamento do desconto pelo aplicativo", diz a aposentada, que ainda não conseguiu acessar porque não encontrou a senha. "Eu pedi para redefinir a senha, e agora estou esperando para continuar mexendo", explicou Rosiclare.

A nora, que é dona de casa, enfrentou dificuldades. "Primeiro o aplicativo estava fora do ar. Depois consegui entrar e vi que nenhum deles teve desconto", diz ela.

Agora, ela quer ajudar o próprio pai, de 70 anos, que ainda não tem o aplicativo. "Quero levá-lo direto no INSS", diz ela. O governo diz que a solicitação deve ser feita apenas pelo app e pela Central 135.

A professora aposentada Maria Aparecida Barbosa, 83, critica a necessidade do aplicativo. "É terrível pra gente, sabe? Logo a gente não vai ter mais identidade própria com tudo eletrônico", disse ela, que contou com familiares para acessar o aplicativo e ter certeza de que não foi lesada. "Eu acompanho o que está acontecendo pela televisão, mas ela é manipulada e não dá pra acreditar em tudo."

A aposentada Maria Aparecida Barbosa, 83, critica a necessidade do aplicativo. "É terrível pra gente"
A aposentada Maria Aparecida Barbosa, 83, critica a necessidade do aplicativo. "É terrível pra gente" Imagem: Wanderley Preite Sobrinho/UOL

O orçamentista aposentado Paulo Scarpello, 79, prefere ir ao banco. "Vou à Caixa Econômica tirar um extrato pra saber se descontaram alguma coisa", diz ele. "Eu não uso o aplicativo, nunca usei, nunca precisei usar. Agora é que surgiu essa história."

Ele diz que quase foi vítima de um golpe. "Recebi um telefonema dizendo que foi debitado R$ 929,44 da minha conta. Eu sei que é mentira, mas vai ter gente que vai cair no trote."

Paulo Scarpello, 79. O aposentado prefere procurar seu banco a usar o aplicativo Meu INSS
Paulo Scarpello, 79. O aposentado prefere procurar seu banco a usar o aplicativo Meu INSS Imagem: Wanderley Preite Sobrinho/UOL
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O vigia aposentado Oscar Alves de Brito, 73, aposta na impunidade. "Essa doença é velha, estão roubando faz anos. Cada mês eu recebo um valor diferente de aposentadoria", diz ele, que não vai usar o aplicativo para saber se foi lesado por falta de confiança. "É tudo enrolado. Não dá pra reclamar. Todo aposentado é roubado."

Ninguém vai conseguir o dinheiro de volta. Já era.
Oscar Alves de Brito, 73

'Aplicativo é melhor'

A psicanalista Cláudia Monte, 65, não enfrentou problemas no aplicativo para descobrir que não descontaram de sua aposentadora. "É o melhor método para verificar. As pessoas precisam aprender a mexer, por isso a educação no país tem que melhorar", afirmou. Ela lamentou, no entanto, pelos aposentados com baixa instrução. "A maior parte [60%] dos lesados mora no Nordeste. É preciso enviar assistentes sociais para chegar a essas pessoas."

As instituições têm que cavoucar constantemente, porque o ser humano se encanta com dinheiro e poder. É uma pena.
Claudia Monte, 65

A decoradora aposentada Ana Maria Honigger, 75, fez tudo sozinha pelo aplicativo. "Já entrei no aplicativo e conferi", disse. "Mas foi muito difícil. É ruim para quem não tem o hábito de usar. Eu uso bastante internet e mesmo assim às vezes eu peno pra mexer. Precisam oferecer um jeito mais fácil para idosos porque muitos não têm essa intimidade."

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Ana identificou um desconto associativo em maio. "Esse mês descontaram R$ 70 de alguma coisa sem eu autorizar. Não me lembro o nome da associação, mas já falei com o advogado", disse. "Nos meses anteriores não descontaram."

Eles descontam de pouquinho porque se tiram R$ 1.000 todo mês, a pessoa percebe. A gente se surpreende como tem gente que pode fazer uma coisa dessa com aposentado.
Ana Maria Honigger, 75

A professora aposentada Eliane Fruman, 66, acompanha cada detalhe do escândalo. "Vejo pelo jornal e internet. É o assunto do momento. Todo mudo está falando."

Ela conferiu o Meu INSS já no primeiro dia. "Foi bem tranquilo, não tive problema nenhum", disse ela. "O governo precisa encontrar as pessoas que não sabem ou não têm internet. Se a pessoa não tiver tecnologia, ela não será ressarcida?", questiona.

O que está acontecendo é um absurdo, uma falta de respeito, de empatia. Tirar dinheiro de idoso é o fim do mundo.
Eliane Fruman, 66

"Ninguém à margem"

Segundo o INSS, haverá "busca ativa" para encontrar todos os prejudicados. "O INSS vai atrás dessas pessoas por meios próprios (...) de busca ativa dessas pessoas, não deixando ninguém à margem", afirmou na terça (14) o presidente do instituto, Giberto Waller.

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Como não há prazo para pedir o ressarcimento, o executivo pediu calma. "Tenham calma. Começou uma correria para acessar o aplicativo, mas não tem prazo [para pedir a devolução pelo app], e todos serão ressarcidos", disse.

1,6 milhão já pediram reembolso

Entre quarta (14) e segunda-feira (16), 1.667.508 pessoas pessoas consultaram o aplicativo para saber se houve desconto. Desses, 1.635.536 disseram que não autorizaram o débito e pediram reembolso. Outros 31.972 autorizaram o desconto.

Quase todas as consultas foram pelo Meu INSS. Enquanto 1,5 milhão utilizaram o canal, 135 mil pessoas preferiram ligar na Central 135.

Até o momento, 41 entidades foram contestadas. "O INSS intima automaticamente as instituições para que, em 15 dias úteis, mostrem a regularidade [do desconto] ou realizem o pagamento devido corregido pelo IPCA (índice oficial da inflação no Brasil)", afirmou o presidente.

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