Curso de puxa-saco: ela ensina como bajular o chefe para se dar bem
Maurício Businari
Colaboração para o UOL
18/06/2025 05h30
Cansada de ver gente competente sendo passada para trás, uma profissional de RH criou um curso que ensina a bajular com método — e promete paz no trabalho. Nele, os alunos aprendem a arte de ser puxa-saco sem perder a dignidade.
O que aconteceu
A gaúcha Luciana Azevedo criou um treinamento online para formar puxa-sacos profissionais. Batizado de Puxa-Saco Sem Frescura, o método ensina estratégias comportamentais para agradar chefes e conquistar promoções.
Mais de 1.900 pessoas já compraram o curso. Ela promete ensinar a bajular com método e sem constrangimento — e, segundo a autora, o retorno tem sido quase 100% positivo. Luciana afirma receber relatos diários de promoções — embora os efeitos, segundo ela, levem tempo.
O método viralizou com vídeos "sincerões" no Instagram e no YouTube. Luciana tem quase 82 mil seguidores e mais de 21 mil inscritos, onde compartilha aulas como "Seja bobão" e "Inspire seu chefe, mesmo que ele não tenha feito nada".
A criadora defende que não ensina bajulação vazia, mas sim inteligência emocional e sobrevivência profissional. "Fingir é esperado no mundo corporativo. Engolir sapo é considerado maturidade", diz.
Quem é Luciana
Luciana Ditter de Azevedo tem 33 anos, é formada em RH (recursos humanos) e mora em Novo Hamburgo (RS). Começou no telemarketing e passou por empresas como GM, Arezzo, Pepsico, Exxon Mobil e diversas consultorias.
A transição para o mundo online veio após uma decepção com o RH tradicional. "Foi desgosto mesmo. No mundo corporativo, a gente não pode dizer o que pensa. Eu cansei de ver gente boa sendo ignorada porque não sabia jogar o jogo", conta.
Ela chegou a tentar uma startup e criou tudo sozinha, até o site. "Agora que estou pensando em fazer algo esteticamente bonito", brinca. "Antes era só eu, meu computador e meu improviso."
Fingir é sinal de maturidade
Luciana defende que "fingir" não é falsidade, mas maturidade emocional. "Fingir respeito, fingir que engoliu o sapo, fingir que o chefe é sua inspiração — tudo isso é esperado. As empresas não contratam pessoas, contratam personagens".
Segundo ela, o profissional ideal precisa ser político, discreto e polido. "Se você fala demais, tem mais chance de falar besteira. Ser 'boca de sacola' é queimação certa". Na visão de Luciana, o ideal é ser "boca de ovo", ou seja, uma pessoa que fica "com a boquinha fechada".
O treinamento nasceu de vídeos curtos com dicas reais de comportamento. Quando percebeu que todo o conteúdo formava o "perfil do puxa-saco estratégico", decidiu estruturar o material e lançar como curso.
Aprendendo a não ser "pavão"
Luciana diferencia dois perfis no universo do puxa-saquismo. De um lado, está o "pavão", que exagera na bajulação de forma ostensiva — ri alto da piada ruim do chefe, faz vaquinhas para presentes caros e busca ser o centro das atenções.
Do outro, há o "puxa-saco inteligente", que age com discrição e estratégia. Esse profissional molda seu comportamento conforme o que o chefe espera, sem perder a dignidade nem parecer um palhaço. É esse segundo perfil que o curso de Luciana busca formar.
O curso é voltado para quem já entrega resultado, mas vive empacado. "Os competentes cansaram de ver os incompetentes pavoneando e subindo. O curso é para equilibrar esse jogo."
Muitas visualizações... e sem críticas por parte dos alunos
A especialista conta que não costuma receber críticas de quem faz o curso. "Quem critica tem uma visão superficial do conceito por trás disso. Quem compra o curso já sabe exatamente o que vai encontrar".
Quem não entende acha que estou ensinando a ser falso, a ser antiético. Mas a proposta é ensinar inteligência emocional, não falsidade. As empresas esperam esse tipo de comportamento.
Nas redes sociais, o curso diferentão chama atenção e atrai todo tipo de comentários, inclusive de pessoas interessadas. "Quero informações hahaha porque só sendo boa profissional não tá dando", comentou uma seguidora. Outra disse: "Não tô acreditando nesse novo nicho. Visionária". Mas há quem não curta a estratégia: "Se tá aí uma coisa que eu não sei e me sinto mal fazendo kkkkk triste isso", outros, no entanto, duvidam: "É sério ou comédia? Fiquei na dúvida".
A pedido do UOL, Luciana resumiu as sete principais táticas ensinadas no treinamento. Ela listou o que chama de "habilidades de sobrevivência emocional" no ambiente corporativo — técnicas que, segundo ela, podem ser aplicadas sem perder a dignidade (ou o emprego).
As 7 dicas de Luciana para puxar o saco com estratégia:
- Finja que é bobão: não tente ser o mais inteligente da sala. Deixe seu chefe brilhar e peça validação, mesmo quando souber a resposta.
- Diga que ele é sua inspiração: mesmo que ele mal tenha participado do projeto. Chefes adoram ser referência -- e vão lembrar de você por isso.
- Cuidado ao sugerir mudanças: nunca diga que algo está errado. Diga que tem uma "melhoria". Apegados a processos odeiam se sentir contrariados.
- Demonstre defeitos humanos: mostre-se vulnerável, consumista, atrasado às vezes. Chefe não gosta de perfeição, gosta de quem parece com ele.
- Finja paz, mesmo em guerra: engolir sapo é uma das principais competências emocionais do mundo profissional. E ninguém precisa saber que você odeia tudo.
- Aprenda a linguagem do seu chefe: antes de aplicar qualquer técnica, estude a pessoa. Nem todo mundo gosta de puxa-saquismo explícito.
- Evite ser pavão: rir alto demais, exagerar no presente, monopolizar atenção: todo mundo percebe -- e nem sempre funciona.