Tem passagem da Voepass? Saiba seus direitos após o fim das operações
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Mesmo com o fim definitivo das operações da Voepass, os passageiros seguem tendo direito ao reembolso integral ou à remarcação das passagens aéreas, sem custos adicionais. A medida vale inclusive para quem comprou bilhetes em voos operados pela companhia em parceria com a Latam - cerca de 30 mil passagens somando as duas empresas, segundo estimativas, - ou plataformas de agências de viagem.
Advogados de defesa do consumidor ouvidos pelo UOL alertam, no entanto, que apesar da garantia legal, o cenário é de incerteza: como a empresa está inativa e com histórico de crise financeira, muitos consumidores podem enfrentar obstáculos para exercer esses direitos.
O que muda para os passageiros
A Anac (Agência Nacional de Aviação Civil) cassou, em definitivo, o COA (Certificado de Operador Aéreo) da Passaredo Transportes Aéreos, principal empresa do grupo Voepass. Com a decisão, a companhia aérea fica impedida de realizar o transporte aéreo de passageiros. Isso significa o fim das operações de voo e vendas de passagens e, para os passageiros, que não eles não poderão mais embarcar com a companhia.
A Anac já havia cassado, em maio, a operação da Voepass em decisão de primeira instância. Na ocasião, porém, a empresa recorreu e o caso foi para o plenário da diretoria da agência. Em reunião do último dia 24, o relator do processo na agência, o diretor Luiz Ricardo Nascimento, votou pela manutenção da cassação e foi acompanhado pelos demais diretores. A decisão unânime em última instância também impede o grupo de aviação de recorrer da sentença final.
A operação de voos da empresa já estava suspensa desde 11 de março. A Anac identificou falhas em aspectos de segurança e determinou a correção dessas irregularidades. A companhia aérea atendia 16 destinos em voos comerciais. Durante a suspensão cautelar em março, a Voepass informou que estava colocando à disposição dos clientes os canais de atendimento e que seguiria a Resolução nº 400/2016 da Anac, que permite o reembolso total das passagens ou a remarcação dos bilhetes sem custo adicional.
O UOL entrou em contato com a companhia para pedir uma atualização dos procedimentos diante da cassação definitiva, mas não obteve retorno até o fechamento da reportagem. As pessoas que têm passagens compradas com a Voepass, contudo, seguem com seus direitos de reembolso integral e reacomodação em voos de outra companhia, sem multas ou custos adicionais. Os passageiros também podem pedir a execução do serviço por outra modalidade de transporte, como ônibus, com tudo pago pela Voepass. Os direitos são garantidos pela Resolução 400 da Anac, são eles:
- Reacomodação em outro voo equivalente, operado por outra companhia, se disponível;
- Reembolso integral do valor pago, incluindo tarifas e taxas;
- Execução por outra modalidade de transporte, a critério do passageiro, se viável.
Os bilhetes [da Voepass] perdem automaticamente a validade operacional, mas os direitos dos consumidores permanecem preservados, conforme a legislação e regulamentação da Anac. A empresa continua obrigada a reembolsar integralmente os valores pagos ou reacomodar o passageiro em outra companhia aérea, sem custo adicional.
Renata Abalém, advogada, diretora jurídica do IDC (Instituto de Defesa do Consumidor e do Contribuinte) e membro da Comissão de Direito do Consumidor da OAB/SP
O consumidor deve exercer esse direito dentro do prazo prescricional de 5 anos. O período está definido no CDC (Código de Defesa do Consumidor), mas a advogada recomenda "agir o quanto antes, para facilitar provas e rastreamento dos bilhetes"
Mas, embora na teoria esses direitos permaneçam válidos, na prática, o cenário pode ser um pouco mais complicado, na análise de outro advogado. Especializado em direito dos passageiros aéreos, Rodrigo Alvim diz que os clientes da Voepass que ainda hoje não foram atendidas com a reacomodação de voos ou reembolso, ou optaram, por exemplo, pela remarcação de voos com a companhia, talvez não consigam exercer seus direitos de forma simples.
Empresa deve ir à falência e esses passageiros terão que habilitar seus créditos em processo, como credores, diz ele. "O que os passageiros podem fazer? Eles podem dar entrada em ações contra a Voepass, que é uma empresa que já não paga valores em processo, que não se consegue encontrar dinheiro em processo já há alguns anos. Então, eles [clientes] vão entrar com a ação, vão ganhar, mas [correm o risco de] não receberem. Infelizmente é esse cenário. A Voepass tem, sim, a obrigação de reacomodar ou reembolsar os passageiros, mas, na prática, [há o risco] de isso não acontecer", afirma Alvim.
E para quem comprou por meio de outra companhia ou tem voos de conexão operados pela Voepass? Nos dois casos, os especialistas apontam que as empresas onde o passageiro comprou o voo têm obrigação de reacomodá-lo em outro voo ou reembolsá-lo com o valor integral. Isso porque quem vendeu a passagem foi essa empresa, e ela é responsável pelo cumprimento do serviço todo, mesmo que tenha terceirizado um trecho para a Voepass.
Agências de viagens, sites de vendas online e intermediários também podem ser acionados para viabilizar a reacomodação ou reembolso. Isso não exime a Voepass da responsabilidade original, mas permite que o consumidor tenha mais de um canal para resolver o problema, inclusive judicialmente, se necessário.
Renata Abalém
Quando a Anac suspendeu as operações da Voepass, notificou a Latam para atender aos clientes afetados pela decisão. Até então, as duas companhias aéreas possuíam um acordo de codeshare - quando uma companhia, no caso a Latam, podia vender passagens de voos operados por outra, ou seja, a Voepass. Procurada pelo UOL, a Latam disse em nota que não tem mais a parceria comercial e concluiu, no final de abril, a reacomodação dos 106 mil clientes afetados pela suspensão das operações da Voepass.
A companhia aérea atendia 16 destinos em voos comerciais. No lugar, a Latam afirmou que inaugurou neste ano três novas rotas em Congonhas, com destino a Joinville, Ribeirão Preto e Aracaju, uma em Guarulhos com destino a Fernando de Noronha e outra em Fortaleza com destino a Juazeiro do Norte. Novas rotas devem ser inauguradas pela companhia no segundo semestre. Só em Ribeirão Preto (SP), onde fica a sede da Voepass, a empresa operava 146 voos mensais, segundo a Rede Voa responsável pelo Aeroporto Dr. Leite Lopes. A média era de 15 mil passageiros por mês.
E se a Voepass não cumprir com as obrigações? A advogada especialista aponta que o passageiro poderá recorrer a três canais administrativos. Desde o Consumidor.gov.br - que permite contato direto com a empresa, monitorado por órgãos de defesa do consumidor; à própria Anac para denúncias e registro de reclamações e o Procon estadual ou municipal para reclamações formais e orientações.
Há também os canais judiciais, como juizados de pequenas causas ou justiça comum. "Recomendo guardar todos os comprovantes, especialmente e-mails, bilhetes eletrônicos, recibos de pagamento, comunicação com a empresa e print de eventual tentativa frustrada de reacomodação", disse Abalém.
O que aconteceu com a Voepass
A decisão de cassação se deu após uma operação assistida realizada pela Anac depois do desastre aéreo em Vinhedo (SP). Segundo o relator do processo, desde o acidente, em 9 de agosto de 2024, a fiscalização encontrou diversas irregularidades na operação da Voepass. A queda do avião operado pela Voepass deixou 62 mortos, incluindo 58 passageiros e quatro tripulantes. Ao todo, ocorreram no período 20 inspeções em sete aeronaves que a empresa deixou de realizar. Com isso, 2.687 voos foram feitos em condições irregulares, apontou no voto o diretor da Anac.
É importante ressaltar que problemas operacionais podem ser encontrados e corrigidos em empresas aéreas. No entanto, o que a Anac identificou, no caso da Voepass, foi a perda de confiabilidade dos mecanismos internos de detecção e correção de problemas, além da caracterização de um desvio dos procedimentos de manutenção estabelecidos para a empresa. Ou seja, a estrutura da empresa deixou de oferecer garantias de que eventuais falhas seriam tratadas antes de comprometer a segurança das operações.
Anac, em nota nesta terça-feira (24)
Voepass pedia recuperação judicial. Como mostrou o UOL, o pedido foi protocolado no Tribunal de Justiça de São Paulo em 22 de abril de 2025, apenas um mês depois de a Anac suspender todas as operações da empresa por questões de segurança.
Um mês depois, porém, a Justiça paulista negou o pedido da empresa. Na decisão, a Vara Regional de Competência Empresarial de Ribeirão Preto (SP) argumentou que as operações de transporte aéreo de passageiros do grupo se encontravam suspensas e sem previsão de retomada e negou a recuperação para as empresas Passaredo Transportes Aéreos S/A, Map Transportes Aéreos Ltda e Serabens Administradora de Bens Ltda.
O mesmo parecer autorizou apenas a recuperação judicial para outras duas empresas do grupo. São elas: Joluca Participações e a Passaredo Gestão Aeronáutica, que atuam com serviços financeiros e administração de hangares, respectivamente. Em nota à imprensa na época, a Voepass informou estar ciente do aceite parcial da Justiça e confirmou ter entrado com um recurso pela revisão da decisão.
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