Com inflação alta, brasileiro migra para carne de 2ª e eleva consumo de ovo

A inflação dos alimentos alterou os hábitos da maioria dos brasileiros neste ano. No primeiro semestre, os consumidores trocaram a carne de primeira pela de segunda e também abriram mais espaço para o ovo nas refeições.

O que aconteceu

Inflação modifica a cesta de compra dos brasileiros. Sete em cada 10 brasileiros (69%) relatam ter deixado de comprar ao menos um item no supermercado devido à alta dos preços nos últimos seis meses. O dado integra um levantamento realizado pelo Instituto Ipsos, a pedido do C6 Bank.

Brasileiros substituem a proteína de primeira. De acordo com a pesquisa, mais de um terço das famílias (35%) alega ter trocado as carnes bovina, de porco e de frango de melhor qualidade por opções de segunda neste ano. Ao mesmo tempo, 22% afirmam ter trocado a carne pelo ovo de galinha.

Inflação dos produtos justifica as substituições. No período questionado pelos pesquisadores, as carnes ficaram 1,46% mais caras, com aumentos da capa de filé (+8,3%), do fígado (+7,2%), do carneiro (+5,3%), do cupim (+5,3%) e do filé-mignon (+4,1%). O preço do ovo de galinha, por sua vez, saltou 19,1% neste ano, mostra o IPCA-15 (Índice Nacional de Preços ao Consumidor Amplo).

Ovo serve como alternativa para driblar a inflação. "O ovo é a proteína mais barata e substitui não só a carne bovina, mas também a carne suína e a própria carne de frango", afirma Márcio Milan, vice-presidente da Abras (Associação Brasileira de Supermercados).

Ovo é aliado na substituição das carnes
Ovo é aliado na substituição das carnes Imagem: iStock

Consumo de ovos também foi reduzido neste ano. Apesar de aparecer como um bem substitutivo, a opção pela proteína perdeu espaço na mesa de 21% das famílias. A única variação acima da margem de erro da pesquisa foi observada na região Norte, onde 27% dos moradores dizem ter reduzido o consumo de ovos.

Hábitos de consumo da classe C foram os mais alterados. Os resultados apontam ainda que as respostas da faixa mais pobre da população aparecem levemente acima da média geral do estudo. Felipe Salles, economista-chefe do C6 Bank, afirma que o movimento reflete uma margem menor da faixa de renda a choques inflacionários. "Os consumidores da classe C tendem a ser mais sensíveis à variação de preço de alimentos porque, normalmente, têm uma taxa de poupança menor e tendem a consumir um valor muito próximo daquilo que recebem de renda", explica ele.

O consumidor da classe A pode optar por poupar um pouco menos e manter o ritmo de consumo. Já o consumidor que não tem essa possibilidade, não tem outra opção, a não ser reduzir o nível de consumo.
Felipe Salles, economista-chefe do C6 Bank

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Inflação

Alimentos foram vilões da inflação nos últimos meses. Dados do IPCA-15 mostram um avanço de 4,34% dos itens de alimentos e bebidas no primeiro semestre. A variação supera em 1,24% o resultado do índice oficial calculado pelo IBGE (Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística) para o período.

Em junho, alimentos registraram deflação após nove meses. A leve oscilação negativa de 0,02% foi puxada pelo alívio causado pelos preços do tomate (-7,2%), do ovo de galinha (-6,9%), do arroz (-3,4%) e das frutas (-2,5%). Principal peso no bolso nos últimos meses, o café moído acumula alta de 49,3% neste ano e mais do que dobrou desde dezembro de 2023 (+101%).

Redução da alta ainda deve persistir nos próximos meses. Felipe Salles, economista-chefe do C6 Bank, afirma que a recente desvalorização do dólar contribui para a redução de preço da soja e do milho, commodities utilizadas na ração animal, que determinam a evolução dos preços das proteínas vivas até os consumidores. Ainda assim, ele descarta a possibilidade de os preços voltarem ao patamar do ano passado.

Parece que o pior, em termos da inflação de alimentos, está ficando para trás, mas isso não significa que os preços vão cair. Para os alimentos, a tendência é apenas de uma inflação menos forte.
Felipe Salles, economista-chefe do C6 Bank

Marcas novas e abandono

Troca de marcas também ficou mais comum desde janeiro. O estudo do Ipsos mostra que o aumento dos preços motivou 44% dos consumidores a escolher marcas de "segunda linha". Parte das trocas envolve o café, que teve as opções mais baratas escolhidas por 43% dos entrevistados. Outros 35% dizem ter reduzido o consumo da bebida. "A troca de marcas é uma das coisas que observamos desde ano passado", relata Milan.

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Abandonos também ganharam força no primeiro semestre. Entre as alterações de consumo também ficam destacados os percentuais de famílias que deixaram de consumir azeite de oliva (40%) e iogurte (24%). Leonardo Costa, economista do ASA, explica que a perda de poder de compra e a ausência de substitutos viáveis se unem à inflação como determinantes para o consumidor deixar de comprar um alimento. "[O abandono] é o último estágio do comportamento do consumidor diante da inflação, após tentar trocar de marca e reduzir a frequência de uso ou buscar substitutos", destaca ele.

O abandono total do consumo de um bem ocorre quando a elevação do preço ultrapassa a capacidade de pagamento ou a disposição do consumidor em pagar por aquele item, mesmo considerando alternativas.
Leonardo Costa, economista do ASA

Estudo Ipsos/C6 ouviu 2.000 consumidores. As entrevistas foram realizadas com internautas com mais de 16 anos de todas as regiões do Brasil. O levantamento tem margem de erro de 2 pontos percentuais e nível de confiança de 95%.

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