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Anáise: Reforma trabalhista faz pequenas empresas avaliarem contratações formais

Bruno Federowski

22/11/2017 16h44

SÃO PAULO (Reuters) - A reforma trabalhista está levando pequenas empresas a fazer planos de formalizar funcionários contratados irregularmente, possivelmente amortecendo o crescimento do emprego informal nos últimos meses e elevando as receitas tributárias.

A nova legislação, a primeira das controversas reformas encabeçadas pelo presidente Michel Temer a impactar diretamente a vida dos brasileiros, reestruturaram as negociações sindicais, as regras de contratação e os benefícios, no maior pacote de mudanças às leis trabalhistas em três décadas.

Críticos advertem contra a perda de direitos trabalhistas em um país altamente desigual. Além disso, uma onda de processos gerou incerteza jurídica sobre a implementação das leis, atrasando possíveis impactos econômicos.

Mas os aliados de Temer prometem que as leis mais flexíveis vão ajudar a taxa de desemprego a se afastar mais rapidamente dos dois dígitos após atingir um recorde neste ano. O ministro da Fazenda, Henrique Meirelles, estima que a reforma gerará até 6 milhões de empregos nos próximos dez anos.

A recuperação do mercado de trabalho nos últimos seis meses se concentrou quase totalmente no setor informal. Agora, grupos de pequenos negócios estão abraçando a possibilidade de formalizar esses contratos.

Segundo Luiz Alberto Pereira, sócio da loja de artigos esportivos World Sports no centro de São Paulo, a nova lei permitirá que ele contrate funcionários adicionais durante a alta temporada. A loja atualmente emprega cinco pessoas em tempo integral, mas seu quadro de funcionários chegou a dobrar com contratações informais em períodos de tráfego intenso.

"Eu fazia muito isso, mas sempre vi como um risco", disse. "Se o fiscal baixar, você acaba tendo que pagar uma multa pesada".

A reforma trabalhista introduz novas modalidades de contratos para trabalho intermitente, home office e profissionais autônomos, como médicos e advogados. Ao mesmo tempo, aumenta as multas para trabalho informal.

O caso de Pereira é bastante comum no cenário corporativo brasileiro, que ainda é dominado por pequenos negócios.

Micro e pequenas empresas, definidas como aquelas cuja receita bruta anual fica aquém de 3,6 milhões de reais, respondiam por 99 por cento de todos os negócios brasileiros e por volta de um quarto do crescimento econômico em 2011, de acordo com cálculos do Sebrae, uma entidade voltada à promoção dos pequenos empreendimentos.

"A legislação antiga se embasava nas relações entre grandes corporações e seus funcionários, o que não é representativo do Brasil real", disse o diretor-presidente do Sebrae, Guilherme Afif Domingos, que também foi ministro-chefe da Secretaria de Micro e Pequena Empresa no governo Dilma Rousseff.

DEMANDA REPRIMIDA

Pode demorar para que as empresas adotem os novos contratos, levando em conta a incerteza jurídica, o que torna mais difícil para economistas precisar seu impacto sobre a arrecadação ou o emprego. A maioria concorda, porém, que a reforma deve ajudar a aproximar as condições legais regendo o trabalho parcial e integral.

Por volta de um quarto da mão de obra brasileira trabalha menos de 40 horas por semana, de acordo com dados do IBGE para o fim do primeiro semestre.

Três quartos desse contingente está no setor informal e, portanto, não paga impostos. Em contraste, apenas um terço daqueles que trabalham pelo menos 40 horas por semana está empregado informalmente.

"Claramente, uma quantidade substancial de pessoas está disposta a oferecer trabalho em horas reduzidas", disse o economista do Ibre-FGV Bruno Ottoni. "Isso sugere que há demanda reprimida por esse tipo de trabalho que não é coberta pela legislação anterior à reforma".

Associações representando juizes, advogados, promotores e auditores do trabalho, no entanto, criticaram a reforma em uma carta aberta em junho, advertindo que as novas regras podem aumentar as disparidades econômicas e precarizar a mão de obra.

Pereira, da World Sports, disse que planeja recontratar seus funcionários em tempo integral usando contratos em tempo intermitente para permitir que eles trabalhem em outros empregos em suas horas livres.

Questionados sobre o assunto, dois de seus funcionários disseram que estavam cientes desses planos, mas não entendiam bem o que isso representaria em termos concretos.

O jurista Marcel Daltro, sócio do escritório Nelson Wilians & Advogados Associados, disse que os funcionários contratados em tempo intermitente ainda terão acesso a férias pagas, décimo terceiro, contribuição previdenciária e outros benefícios se os contratos forem longos o suficiente.

Mas ele não foi capaz de precisar se os planos de Pereira estão de acordo com a reforma, ressaltando a elevada incerteza em torno da nova legislação.