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Tesouro assumirá mais risco Selic em 2018 em resposta a condições adversas de mercado

De Brasília

05/09/2018 18h45

Por Marcela Ayres

BRASÍLIA (Reuters) - O Tesouro Nacional anunciou nesta quarta-feira que assumirá mais risco ligado à Selic em 2018, emitindo mais títulos que flutuam com a taxa básica que o inicialmente previsto, em resposta a condições adversas do mercado, catapultadas por incertezas no cenário externo e eleições presidenciais no Brasil.

Em revisão do Plano Anual de Financiamento (PAF) deste ano, o Tesouro ampliou a fatia fixada como meta para a participação de títulos atrelados à Selic na dívida pública federal para 33 a 37 por cento, ante 31 a 35 por cento antes. As bandas para os demais papéis, bem como para o estoque total da dívida, permaneceram inalteradas.

"Revisão do PAF é um instrumento de atuação do Tesouro", afirmou o subsecretário da Dívida Pública, José Franco Morais.

Em coletiva de imprensa, ele justificou que o quadro recente tem levado a maior grau de aversão ao risco por parte dos investidores. Num ano mais volátil que o normal, prosseguiu, a Letra Financeira do Tesouro (LFT) passou a ser o principal instrumento de financiamento da dívida pública brasileira.

Franco também apontou que o custo dos títulos prefixados aumentou sensivelmente, a cerca de 12,5 por cento para um papel de 10 anos, razão pela qual o Tesouro também tem preferência maior, no momento, por emitir títulos flutuantes que pagam taxa Selic.

Esses papéis pós-fixados são mais demandados por investidores quando há percepção de aumento do risco, sentimento que vem se intensificando diante da imprevisibilidade na corrida presidencial e a temores quanto ao compromisso com reformas econômicas por parte do candidato eleito.

Esses títulos tiram previsibilidade para a dívida, já que flutuam com os juros. Por isso, o governo busca diminuir sua representatividade no longo prazo a 20 por cento.

Franco reconheceu que, quando o Tesouro emite mais LFTs, assume esse risco de taxa de juros. Por outro lado, defendeu que a investida hoje envolve um peso menor.

"No passado, o impacto de eventual aumento da Selic sobre a dívida era maior porque havia parcela grande do crédito que era direcionado. Me refiro principalmente ao crédito de programas especiais de bancos públicos", disse.

"Com mudança para TLP (nova taxa de juros dos empréstimos do BNDES), espera-se que eventuais aumentos da taxa Selic não sejam necessários para compensar a parcela do crédito direcionado. Ao ocorrer isso, o impacto sobre a dívida acaba sendo menor", completou.

Questionado sobre novas atuações diretas no mercado, com oferta de leilões extraordinários, Franco respondeu que o Tesouro não tem previsão de iniciativas desta natureza, mas que segue atento às condições de mercado.

Nesta quarta-feira, o Tesouro divulgou ainda que pode reduzir a oferta global de títulos no ano, o que implicaria rolagem menor da dívida em 2018.

"O Tesouro sempre persegue esse objetivo de rolar toda sua divida. Mas ele tem flexibilidade, e o colchão de liquidez dá essa flexibilidade, de em momentos de maior turbulência, de maior volatilidade, ou em momentos em que os custos ficam mais altos, de eventualmente optar por fazer uma redução, uma rolagem um pouco menor", afirmou o coordenador-geral de Operações da Dívida Pública, Luis Felipe Vital.

Atualmente, este colchão está acima de 600 bilhões de reais, e deve ser acrescido de 165 bilhões de reais, referentes ao lucro contábil do Banco Central no primeiro semestre.

Desde 2001, o Tesouro só fez outras revisões no PAF em 2008, 2015 e 2016 -- anos de crise e forte volatilidade nos mercados. Por norma de regimento interno, essa revisão é feita em abril ou agosto. Perguntado sobre a razão de ter sido divulgada em setembro desta vez, Franco respondeu que o Tesouro viu "deterioração sensível no mercado internacional, principalmente, e incertezas no cenário doméstico que permanecem".

DÍVIDA PÚBLICA

O Tesouro também passou a ver uma dívida bruta mais alta neste ano, a 77 por cento do Produto Interno Bruto (PIB), ante 75,6 por cento na estimativa anterior, numa alta de 3 pontos percentuais sobre o nível de 2017.

A evolução será influenciada por menor expectativa para a economia neste ano, disse o Tesouro, apontando ainda a influência de uma taxa de câmbio maior. O governo, que começou 2018 prevendo um crescimento de 3 por cento do PIB, agora vê uma expansão de 1,6 por cento para a atividade.

A deterioração ressalta o descasamento entre receitas e despesas do país, que prossegue forte a despeito do compromisso assumido pelo governo do presidente Michel Temer de implementar reformas estruturais e controlar a explosiva trajetória da dívida. Para 2019, a expectativa é que ela chegue a 78,7 por cento do PIB, subindo a 80,1 por cento em 2020.

(Por Marcela Ayres, com reportagem adicional de Mateus Maia)