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Briga de comercializadoras de energia vai à Justiça e deve impactar liquidação na CCEE

28/03/2019 16h09

Por Luciano Costa

SÃO PAULO (Reuters) - Disputas contratuais entre comercializadoras de energia chegaram à Justiça, gerando liminares que devem impactar as liquidações financeiras de operações do mercado de eletricidade realizadas mensalmente pela Câmara de Comercialização de Energia Elétrica (CCEE), segundo decisões vistas pela Reuters e especialistas.

A briga começou após algumas comercializadoras admitirem dificuldades para cumprir contratos de entrega de energia neste ano, o que ameaçou deixar compradores na mão, levando alguns à Justiça para exigir o registro dos acordos junto à CCEE.

Os negócios entre comercializadoras e clientes são fechados de forma bilateral, mas quando registrados na CCEE eles passam a ser levados em consideração na liquidação financeira do mercado, que promove pagamentos e recebimentos entre os agentes do setor de acordo com suas posições contratuais.

"É um mecanismo adicional de pressão. Com uma decisão dessas, eu levo para dentro da CCEE essa inadimplência (com o contrato), e aí a CCEE tem seus regramentos específicos", afirmou o sócio do Madrona Advogados, Rodrigo Machado.

A inadimplência no pagamentos por contratos ou na entrega de energia em liquidações da CCEE gera punições financeiras e até processos para desligamento das empresas, o que significa na prática uma expulsão do mercado elétrico.

"Você 'espreme' o vendedor para que ele dê um jeito de saldar a dívida sob pena de ser desligado", afirmou o sócio do Baraldi Mariani Advogados, Rômulo Greff Mariani.

Segundo decisões judiciais vistas pela Reuters, Linkx Energia, Lumen Comercializadora e 3G Energia foram alvos de liminares obtidas por clientes que obrigam a CCEE a registrar seus contratos.

A Electra Energy, que entrou com ações contra Linkx e Lumen, disse que o objetivo foi "garantir o cumprimento dos acordos bilaterais assumidos pelas empresas".

A Ecom, que conseguiu liminar contra a 3GEnergia, não respondeu de imediato a um pedido de comentário. A Valora Energia, que obteve decisão contra a Linkx, não quis comentar.

As ameaças de descumprimento de contratos de energia começaram em fevereiro, quando a Vega Energy admitiu exposição financeira negativa de cerca de 200 milhões de reais para 2019.

A comercializadora, que vendeu a descoberto, esperando comprar energia mais à frente a preços baixos para entregar aos clientes, admitiu ter errado a aposta após ver as cotações subirem devido à falta de chuvas na região das hidrelétricas.

Posteriormente, empresas como Linkx e FDR Energia disseram ter sido atingidas pela situação da Vega e afirmaram que renegociariam contratos com clientes para reduzir prejuízos.

Procurada, a Linkx disse que "passa por um momento de análises de toda a atual situação" e "em breve se manifestará, informando ao mercado as decisões tomadas".

A Lumen afirmou que "sempre negociou dentro de seus limites financeiros e infelizmente foi vítima dessa tempestade" enfrentada pelo mercado de comercialização.

"Agentes que venderam energia para Lumen Energia deixaram de cumprir com contratos em valores milionários, criando o efeito cascata tão temido por todos os agentes do setor", acrescentou a empresa, em nota.

A FDR também não comentou. Em situação contrária à das demais comercializadoras, ela obteve na Justiça mineira liminar que suspende por 60 dias o registro de venda de energia contratada pela mineira Cemig para fevereiro e março.

Os temores de inadimplência contratual estão concentrados nesses dois meses, principalmente fevereiro, devido ao salto dos preços no mercado spot de eletricidade.

Procurada, a Cemig disse em nota que "não acredita na suspensão do contrato (da FDR), uma vez que cumpre rigorosamente com suas obrigações, segundo as regras de mercado".

A liquidação financeira das operações do mercado de eletricidade referente a fevereiro acontecerá em 8 e 9 de abril, enquanto o processamento referente a março será em maio.

Procurada, a CCEE disse que "seguindo a determinação judicial, os contratos em questão firmados no âmbito bilateral entre os agentes serão aplicados, conforme as regras de comercialização", com efeitos já para a liquidação de fevereiro.

"No entanto, a CCEE não pode especular antecipadamente sobre eventuais impactos na liquidação --é preciso esperar o resultado", adicionou.

Especialistas, porém, avaliam que dificilmente as empresas impactadas conseguirão reverter a situação a ponto de evitar a inadimplência na CCEE. Mesmo nesse caso, elas ainda sofreriam efeitos negativos em suas atividades, uma vez que o setor de comercialização é visto como um "mercado de confiança".

"Espero sinceramente que situações desse tipo diminuam agora, e não aumentem... a gente aprende com os erros. Espero que o mercado 'expurgue' os 'players' ruins e vamos a partir disso ter um ambiente mais saudável", disse Mariani, do Baraldi Mariani Advogados.

Os problemas de algumas comercializadoras surgem após um forte "booom" no mercado, com crescimento recorde no número de empresas de "trading" de energia elétrica em 2018, movimento impulsionado por fortes lucros no setor em anos anteriores.

(Por Luciano Costa)