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Análise: Desafio eleitoral e dificuldade para reformas devem marcar 2º ano de Bolsonaro

Eduardo Simões

19/12/2019 14h32Atualizada em 19/12/2019 18h34

SÃO PAULO (Reuters) - O segundo ano de Jair Bolsonaro na Presidência deve ser marcado por uma dificuldade maior para a aprovação de reformas —como a tributária e a administrativa— e também pela predominância das eleições municipais no cenário político, incluindo a expectativa sobre se o presidente conseguirá viabilizar sua legenda a tempo do pleito e que papel terá nele.

Após um ano de estreia no Palácio do Planalto em que a reforma da Previdência foi a estrela principal da agenda legislativa em 2019, o segundo ano da gestão Bolsonaro começa sem um protagonismo claro na pauta do Congresso, fator que se alia a um calendário parlamentar mais apertado, por causa da eleição municipal.

"O Congresso, por tradição, só funciona no primeiro semestre ou depois das eleições municipais de outubro. No plano da agenda legislativa, ela fica bastante prejudicada, principalmente neste período de julho até final de outubro", disse à Reuters o cientista político Ricardo Ismael, da PUC do Rio de Janeiro.

"Os deputados federais estarão se movimentando em 2020 para a eleição de prefeitos, porque eles dependem em 2022 de terem prefeitos aliados", acrescentou.

As reformas tributária e administrativa —apontadas como as mais importantes após a aprovação das mudanças na Previdência— também devem enfrentar dificuldades políticas. A primeira mexe com o pacto federativo e com arrecadação de Estados e municípios, a segunda cutuca o vespeiro dos interesses do funcionalismo público — categoria que historicamente tem grande capacidade de mobilização.

A baixa capacidade de articulação política de Bolsonaro, tanto com parlamentares quanto com governadores, e o ano eleitoral, quando políticos geralmente preferem se afastar de temas controversos, também não ajudam.

"Geralmente o Congresso, em ano de eleição, gosta de distribuir bondades. Gostam de tentar acarinhar o eleitor, e os deputados federais precisam fazer isso. Eles não têm hoje uma boa avaliação junto ao eleitorado, os políticos continuam muito desgastados", disse Ismael.

Ao mesmo tempo que reconhecem que a continuidade das reformas deve enfrentar um grau de dificuldade maior, analistas ouvidos pela Reuters acreditam que elas podem ser aprovadas, embora provavelmente bem menos profundas do que o inicialmente desejado pelo governo.

"Tem uma proximidade de temas entre a elite parlamentar e a agenda econômica, e essa proximidade pode dar vazão a algumas reformas, mas ainda bem menos ambiciosas do que sugere o discurso oficial", disse o analista político Rafael Cortez, da Tendências Consultoria.

Apesar de ter prometido algumas vezes que encaminharia ao Congresso suas propostas de reforma tributária e administrativa, o governo Bolsonaro ainda não as enviou.

Na quarta-feira, após se reunirem com o ministro da Economia, Paulo Guedes, os presidentes da Câmara, Rodrigo Maia (DEM-RJ), e do Senado, Davi Alcolumbre (DEM-AP), anunciaram a criação de uma comissão para, em 90 dias, elaborar um texto consensual para a tributária. Maia disse ser "possível" aprová-la no primeiro semestre de 2020.

O envio da reforma administrativa, prometido para este ano, foi adiado por decisão política de Bolsonaro.

ELEIÇÃO E NOVO PARTIDO

Além do andamento das reformas, a eleição municipal de outubro também deve ser acompanhada de perto pelos atores políticos, especialmente os esforços de Bolsonaro para viabilizar sua nova sigla, a Aliança pelo Brasil, a tempo de disputar o pleito e qual peso o presidente terá nas disputas locais.

"A grande questão para o ano que vem são as eleições municipais e se Bolsonaro vai conseguir viabilizar seu partido político a tempo de lançar candidato", disse o cientista político David Fleischer.

"Ele (Bolsonaro) vai apoiar alguns candidatos a prefeitos em cidades grandes e capitais... Tem que ver se vai fazer campanha em favor deles ou não. Se fizer campanha e perder, aí fica feio", acrescentou.

Para Ismael, da PUC-Rio, eleições municipais geralmente têm como principal componente temas locais, mas nas principais capitais o debate pode ser nacionalizado.

O cientista político vê Bolsonaro pouco afeito a entrar em uma agenda negativa em 2020, como um grande embate com o funcionalismo público na reforma administrativa que possa gerar mobilizações como as vistas em países latino-americanos neste ano, como o Chile.

"O governo precisa estimular a recuperação econômica. Essa é a pauta prioritária", disse Ismael. "O governo Bolsonaro não tem gordura para queimar, não tem capital político para queimar. O governo vai pensar duas vezes antes de embarcar numa agenda negativa. Ele vai se concentrar na recuperação da economia", previu.