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Brasil corre risco de 3ª "década perdida" sem agenda que busque maior produtividade, avalia Rio Bravo

09/07/2020 17h16

Por José de Castro

SÃO PAULO (Reuters) - Tudo indica que o Brasil caminha para a terceira "década perdida" num intervalo de 50 anos, com os atuais fundamentos da economia mais frágeis do que o percebido de forma geral, avaliou a gestora Rio Bravo em publicação trimestral em que destacou a necessidade de uma agenda que busque aumentar o chamado produto por trabalhador.

Segundo a Rio Bravo, um crescimento econômico anual médio de 1% na próxima década "parece mais factível" do que a taxa de 2,5% citada no mercado.

A casa avaliou que o crescimento do Brasil nos últimos 20 anos foi amparado por três fatores "temporários ou insustentáveis": bônus demográfico (aumento da proporção da população em idade ativa), papel do governo --com "forte" presença estatal na alocação de capital e contínua expansão fiscal-- e política de reajuste de salário mínimo.

Segundo a Rio Bravo, o cenário agora é de fim do bônus demográfico (ocorrido em 2018), redução do papel do Estado como indutor de crescimento e impossibilidade de promover reajustes reais do salário mínimo.

"Esgotaram-se as fontes de crescimento artificiais", disse a gestora na publicação. "A alternativa ao enfrentamento dos problemas é o crescimento medíocre dos últimos anos e nossa consolidação como um país de renda média com uma terceira década perdida", completou.

Segundo Luis Bento, analista da Rio Bravo e um dos autores do estudo, a gestora projeta retração de 7,5% para o Produto Interno Bruto (PIB) neste ano, em meio aos efeitos da pandemia de Covid-19. E, apesar de indicadores recentes apontarem cenário melhor, persistem dúvidas sobre a velocidade da recuperação.

"Nossa estimativa é que a gente vai recuperar essa queda em torno de 7% apenas em meados de 2024. A gente começa a década tentando tirar o atraso causado pela pandemia", disse Bento.

Confirmada a projeção de queda de 7,5% para o PIB em 2020, a década 2011-2020 teria crescimento real médio anual negativo, de -0,17%.

Na década de 1980, também considerada "perdida", o crescimento médio do PIB foi de 1,7%.

Se de um lado a crise de 2015-2016 causou impactos profundamente negativos a ponto de trazer à tona o debate sobre problemas estruturais, por outro medidas aprovadas desde então --como o teto de gastos e a reforma da Previdência-- não serão suficientes para os próximos anos.

A resolução do problema fiscal e alcance de estabilidade da dívida são somente o "primeiro passo", de acordo com Bento, e ainda assim estão incompletas. A etapa seguinte envolveria uma agenda que busque aumentar o produto por trabalhador.

O produto por trabalhador tem em sua composição três fatores: capital físico, capital humano e produtividade. O capital físico diz respeito à necessidade do país de receber investimentos de infraestrutura. O capital humano passa pela qualidade de educação brasileira, em "deficiência crônica", segundo a Rio Bravo.

"Para aumentar a produtividade é necessário melhorar drasticamente o ambiente de negócios, o que envolve uma reforma tributária ampla e a desburocratização geral das atividades produtivas", disse a Rio Bravo, destacando ainda a importância de reformas microeconômicas.

Apesar de um "meio-caminho andado", Bento ponderou que reformas estruturais grandes são especialmente difíceis e têm resultados de longo prazo. A reforma tributária, por exemplo, traria ganhos expressivos de crescimento na década entre 2031 e 2040, segundo ele.

"Tenho maior otimismo sobre pequenas pautas. A agenda do BC é importante, a independência do Banco Central, alguns projetos de privatização e de abertura comercial", disse Bento.

MERCADOS

Sobre a recuperação atual dos mercados financeiros no Brasil, Bento é cauteloso.

"Claramente os fundamentos de lá (antes da pandemia) para cá pioraram. De duas uma: ou a gente estava errado e a bolsa em fevereiro tinha de estar ainda mais alta ou a gente está errando agora e a bolsa teria de estar mais baixa", disse.

O Ibovespa superou os 100 mil pontos nesta quinta-feira pela primeira vez desde março, mas perdeu força e caía 0,6% às 15h47.

Apesar de algum viés de alta para as projeções para o PIB, na esteira de dados melhores divulgados recentemente, o analista da Rio Bravo destacou que os números tiveram influência do auxílio emergencial do governo (demanda) e que há incertezas também do lado da oferta.

"Não sabemos onde essa volta rápida pode parar. Pode ser que essa volta rápida (ritmo de recuperação) se estabilize em nível pré-pandemia", disse.

Antes da crise do Covid-19, os indicadores econômicos já mostravam leituras apenas modestas.

A Rio Bravo projeta dólar a 5,20 reais ao fim do ano e meta Selic de 2,25%.

(Edição de Isabel Versiani)