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PF investiga construtoras por uso de minério ilegal em usinas eólicas no Nordeste

Os trabalhos envolveram operações recentes no RN e no CE com diversas ações de busca e apreensão -
Os trabalhos envolveram operações recentes no RN e no CE com diversas ações de busca e apreensão

Da Reuters, em São Paulo

10/07/2020 17h00

A Polícia Federal está investigando construtoras pelo uso de areia e saibro supostamente extraídos ilegalmente para utilização em obras de parques eólicos no Nordeste, considerado uma das melhores regiões do mundo em ventos para a geração de energia.

Os trabalhos envolveram operações recentes no Rio Grande do Norte e no Ceará com diversas ações de busca e apreensão, inclusive em uma usina de Furnas, subsidiária da estatal Eletrobras, disseram oficiais de polícia à Reuters.

As apurações, que contaram com apoio de imagens de satélites da agência espacial norte-americana Nasa e de drones, buscam agora calcular as perdas para os cofres públicos com a mineração ilegal, para que procuradores possam entrar com ações criminais e de ressarcimento.

Também foram quebrados sigilos bancário e fiscal das empresas investigadas, até para apurar se havia algum tipo de combinação entre elas e investidores do setor de energia, embora as suspeitas no momento estejam focadas nas construtoras, sem indícios contra os donos dos parques, segundo as autoridades.

"A investigação está praticamente encerrada, agora vamos calcular o dano, em termos de responsabilidade. É o prazo de os peritos fazerem isso, alguns meses", disse o delegado Agostinho Gomes Cascardo Junior, do Rio Grande do Norte, que estimou que os trabalhos devem ser fechados ainda em 2020.

"O alvo são grandes empresas do ramo de construção civil. Não há indícios no momento de participação dos parques eólicos, embora não seja descartado", acrescentou.

Segundo ele, as investigações mostraram que as construtoras estariam fazendo exploração de areia e saibro sem a necessária autorização federal, com uso dos materiais nas obras de eólicas, para terraplanagem e construção de canteiros, por exemplo.

"Temos um encadeamento de imagens (de satélites e drones) que mostram como a exploração mineral vai aumentando e as eólicas vão crescendo junto, com terraplanagem, pavimentação", afirmou.

Uma das obras investigadas é a do complexo eólico de Fortim, da estatal Furnas no Ceará, com 115 megawatts em capacidade, que entrou em operação comercial neste ano, disse à Reuters a delegada Carla Sampaio, chefe de repressão a crimes contra o meio ambiente e patrimônio histórico da PF no Ceará.

Procurada, Furnas confirmou em nota que técnicos de sua subsidiária Brasil Ventos, responsável pelo complexo eólico de Fortim, receberam representantes da PF para operação de busca e apreensão em 26 de junho.

"Nada foi levado do local, pois a construtora já havia desmobilizado seu canteiro de obras. Até aquele momento, Furnas e Brasil Ventos não tinham conhecimento sobre a possibilidade de extração irregular de materiais ou de sua potencial utilização na construção do parque eólico de Fortim. Furnas e Brasil Ventos estão à disposição das autoridades para colaborar", afirmou.

A estatal ainda destacou que possui um programa de integridade de fornecedores e disse que, "caso fique provada a irregularidade, a construtora sofrerá as sanções previstas".

A PF não revelou o nome das empresas investigadas.

Operações em campo

Os levantamentos realizados pela Polícia Federal com satélites e drones foram complementados por duas operações realizadas no final de junho, a Siroco, em Natal (RN), e a Anemoi, em Fortaleza e Aracati (CE), que cumpriram diligências em campo e 11 mandados de busca e apreensão.

No Rio Grande do Norte, as apurações focaram 13 áreas nas quais teria havido exploração mineral indevida entre 2012 e 2016, segundo as autoridades, que estimam que essas atividades levaram à degradação de uma área equivalente a 100 campos de futebol.

No Ceará, foram monitoradas sete áreas, nas quais a exploração indevida teria ocorrido entre 2014 e 2019.

Ambas operações tiveram como base informações de bandas espectrais de imagens de satélites da Nasa, além de fotos obtidas com drones e simulações com modelagem em sistema de informação geográfica.

Esses dados foram cruzados com informações de processos minérios da Agência Nacional de Mineração (ANM), que mostraram "fortes indícios de que as empresas suspeitas estariam retirando minério de forma criminosa e utilizando esse minério na terraplanagem e pavimentação de vias de acesso de complexos eólicos", de acordo com a PF.

Além disso, os policiais avaliam que as empresas investigadas também poderiam ser processadas por crime ambiental devido à degradação das áreas.

"A investigação começou em setembro de 2019... depois que concluirmos nosso trabalho, o MP poderá denunciar ou não as pessoas que indicarmos, e se o juiz aceitar a denúncia tem início um processo penal", explicou a delegada Carla Sampaio.

Ela estimou que os ressarcimentos aos cofres públicos envolveriam milhões de reais, mas não forneceu uma projeção precisa porque os cálculos estão em andamento.

A operação policial realizada no final de junho no Ceará foi denominada "Anemoi", palavra grega que significa ventos, enquanto no Rio Grande do Norte o nome escolhido foi "Siroco", em referência a uma divindade que representa um dos ventos menores na mitologia grega.