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Dólar volta a máximas em 3 meses em dia tenso com renovados temores fiscais

26/08/2020 12h48

Por José de Castro

SÃO PAULO (Reuters) - Os mercados brasileiros experimentaram novo dia de estresse nesta quarta-feira, e o dólar fechou em firme alta e acima de 5,60 reais, mais do que devolvendo a queda da véspera, diante da apreensão de investidores quanto ao futuro da agenda fiscal do país em meio a renovados temores quanto à posição de Paulo Guedes no Ministério da Economia.

O dólar à vista fechou em alta de 1,54%, a 5,6124 reais na venda. É o maior nível desde 20 de maio (5,6902 reais). O ganho desta sessão superou a queda de 1,19% da terça-feira.

Na máxima, alcançada no meio da tarde, o dólar foi a 5,635 reais (+1,95%). No começo do pregão, a moeda chegou a cair 0,24%, para 5,5141 reais.

Na B3, o dólar futuro de maior liquidez saltava 1,90%, a 5,6155 reais, às 17h22.

O dólar vinha tomando fôlego gradualmente ao longo da manhã, mas, pouco depois das 12h, arrancou em alta após o presidente Jair Bolsonaro dizer que havia rejeitado a proposta apresentada pelo Ministério da Economia para criação do programa Renda Brasil.

A proposta de criação do Renda Brasil, que estava no pacote de medidas de aceleração da economia apresentadas ao presidente pelo ministro Paulo Guedes, previa um benefício maior que o valor atual do Bolsa Família, mas seu financiamento viria do corte de outros programas sociais, como o abono salarial, o seguro-defeso e o Farmácia Popular. Bolsonaro descartou a possibilidade de abolir o abono salarial.

A fala de Bolsonaro, vista como desautorização pública ao ministro, amplificou a aparente queda de braço entre Guedes e a ala desenvolvimentista do governo. Ruídos entre os dois lados já haviam se intensificado nas últimas semanas, contribuindo para a saída do governo de importantes auxiliares do ministro da Economia e alimentando especulações sobre eventual substituição do chefe da pasta --com um dos nomes mais falados para seu lugar sendo o do presidente do Banco Central, Roberto Campos Neto.

O mercado piorou o sinal porque entende que as divergências dificultam o cumprimento de uma agenda fiscal no sentido de austeridade, o que ameaça manter a dívida pública em trajetória de alta, deteriorando a percepção sobre as contas públicas do país e reduzindo a confiança dos investidores.

"Ele (Bolsonaro) não está dando saída para a equipe econômica", disse Jason Vieira, economista-chefe da Infinity Asset Management.

"A sinalização emitida (pelo presidente) não foi boa. Coloca de novo Paulo Guedes numa berlinda perigosa, bota o fiscal brasileiro numa berlinda perigosa. Essas coisas (aumento de gastos) têm efeito (econômico) de curto prazo bom, mas o efeito de longo prazo é péssimo", completou, alertando sobre risco de inflação à frente.

Outros mercados também sentiram o mau humor. Nos juros, o DI janeiro 2023 foi à máxima do dia, de 4,21%, ante 3,93% do ajuste anterior. O DI janeiro 2025 saltou a 6,08% no pico, ante 5,75% do ajuste de terça-feira. O Ibovespa teve queda preliminar de 1,46%, depois de cair abaixo dos 100 mil pontos.

Os mercados como um todo saíram das mínimas da sessão depois de o presidente da Câmara dos Deputados, Rodrigo Maia (DEM-RJ), dizer que nenhum projeto que desrespeite o teto de gastos será votado na Casa.

A negativa do Ministério da Economia sobre coletiva do Paulo Guedes para pedido de demissão e notícias a respeito de algum espaço para renegociação dos termos da proposta da Economia para o Renda Brasil nos próximos dias também abriram espaço para algum ajuste positivo nos preços dos ativos.

Luis Laudisio, operador da Renascença, acredita que o mercado deva cobrar mais prêmio daqui para a frente, inclusive nos leilões de dívida. "A reação do mercado foi ruim hoje, mas o mercado nem começou a jogar a toalha ainda", completou, indicando chances de reações mais fortes nos preços em caso de continuidade do cenário de incertezas.