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Lula quer aproveitar reforma tributária do Senado, mas mudar proposta na Câmara

Roberto Casimiro/Estadão
Imagem: Roberto Casimiro/Estadão

Lisandra Paraguassu e Bernardo Caram

11/08/2022 09h07Atualizada em 11/08/2022 09h07

Em caso de vitória de Luiz Inácio Lula da Silva em outubro, o PT prevê adotar a atual reforma tributária que tramita no Senado como base de mudanças no sistema de tributação de consumo, ao mesmo tempo em que deve apresentar novas ideias para taxar rendimentos, substituindo a reforma do Imposto de Renda que está na Câmara.

O partido vem conversando com o economista Bernard Appy, um dos formuladores das reformas sobre consumo que tramitam no Congresso, para tocar a proposta adiante e avançar em outros pontos a serem apresentados caso o petista, que lidera as sondagens eleitorais, chegue o Planalto.

"O problema sempre foi o entendimento entre a União, Estados e municípios e os vários setores da economia. O projeto que está no Senado já foi pactuado com os 27 Estados, os municípios e os líderes na Câmara e no Senado", explicou à Reuters o ex-governador do Piauí Wellington Dias (PT), um dos que ajudou a negociar a proposta e integrante do círculo mais próximo de Lula na campanha eleitoral.

A proposta que está no Senado prevê, em linhas gerais, uma simplificação do sistema, com a unificação de nove tributos federais em um IVA federal, e a junção de impostos estaduais e municipais em um IVA estadual/municipal, com o fim da bitributação entre entes federados.

Outro ponto é o alinhamento das alíquotas de ICMS, hoje diferentes de Estado para Estado e que municiam uma guerra fiscal entre as unidades da federação. O percentual a ser cobrado seria limitado a 17% em combustíveis e energia, uma outra parte ficaria em 12%. Já produtos da cesta básica, associados a outros produtos essenciais, teriam uma alíquota muito baixa ou zerada.

"É uma substituição da carta tributária voltada para o consumo por uma tributação sobre renda e dividendos. Não resolve tudo, mas é uma base", disse Wellington.

Secretário-executivo e de Política Econômica do Ministério da Fazenda durante o governo Lula, Appy colabora com o PT nessa análise. Para ele, é importante que o próximo governo aproveite a experiência acumulada nas discussões já feitas no Congresso sobre a reforma do consumo, não sendo necessário enviar uma nova proposta.

No caso da reforma do Imposto de Renda, por outro lado, Appy sugere que seja desenhado um texto para substituir o que está na Câmara, que mexe com tributos sobre renda, folha de pagamentos e outras questões, considerado por ele muito ruim.

"A equipe técnica da campanha do PT entende a importância da reforma da tributação do consumo, entende que é necessária uma ampla reforma da tributação sobre a renda... e entende a importância de uma reforma que caminhe para uma tributação mais racional da folha de pagamentos", disse Appy.

O economista afirma que o Centro de Cidadania Fiscal, do qual é diretor, não tem viés político e seguirá disponível para eventualmente auxiliar outros candidatos.

Uma das propostas que pode ser enviada ao Congresso no caso de vitória de Lula é uma mudança na tributação da folha de pagamentos.

Ponderando que não faz parte do processo decisório do PT, Appy defende uma redução de encargos trabalhistas sobre a fatia inicial de um salário mínimo da remuneração de todos os trabalhadores. Essa renúncia de arrecadação, estimada por ele em 1% do PIB, seria compensada por mudanças na tributação sobre a renda.

Um dos planos estudados no PT pretende fazer uma reforma do imposto de renda para tributar dividendos e diminuir o imposto sobre a produção. A ideia é que lucros e dividendos a partir de 1 milhão de reais por ano passem a ser tributados, o que compensaria a redução em outras áreas.

A intenção de Lula é ter tudo pronto para ser enviado ao Congresso nos primeiros 40 dias de um eventual novo governo, como declarou a empresários em uma reunião na Federação das Indústrias de São Paulo (Fiesp) esta semana.

O ex-presidente garantiu que fará uma reforma tributária, mas repetiu que não pretende fazer todas as mudanças em um bloco só, para evitar que a proposta trave no Congresso.

Lula disse ainda que sua reforma será progressiva e os mais ricos terão que pagar mais.

"A gente precisa de uma reforma tributária mais progressiva, onde a gente possa taxar a parte mais rica da sociedade, taxar menos a produtividade e taxar mais patrimônio", disse Lula na Fiesp.

Avanço no Senado

De acordo com o ex-ministro Aloizio Mercadante, coordenador do programa de governo do PT, o partido vai aproveitar o que está pactuado no Senado, mas as demais mudanças devem ser enviadas por partes.

"Temos que ter uma estratégia de fatiar, mas tendo projeto global. Temos que aproveitar o avanço que já tem no Senado", disse à Reuters.

Colaborador do plano do PT na área econômica, o professor da Unicamp Eduardo Fagnani foi um dos formuladores da chamada reforma tributária solidária, que busca reduzir o peso da tributação sobre o consumo e ampliar a cobrança sobre renda e patrimônio. As premissas desse plano fazem parte das diretrizes de governo lançadas este ano pelo PT.

"Esses nossos estudos já influenciaram muito os programas do Fernando Haddad (PT) e do Ciro Gomes (PDT) em 2018. A partir daí, passou a ser um programa do PT e dos outros partidos que fazem parte da coligação", disse.

Essa proposta de reforma foi protocolada no Congresso em 2019 por parlamentares de partidos de esquerda por meio de uma emenda a um dos textos de reforma que tramitam na Casa. Não houve avanço desde então.

Fagnani, que é membro do Núcleo de Acompanhamento de Políticas Públicas (NAPP) de Economia da Fundação Perseu Abramo, ligada ao PT, defende uma nova tabela progressiva do Imposto de Renda com uma ampliação da alíquota máxima para remunerações mais altas, além da taxação de dividendos.

O economista ressaltou que mudanças na legislação do IR são mais simples de implementar por não dependerem de aprovação de emenda constitucional, como é o caso da unificação de tributos sobre o consumo.