Câmara deve frear por ora avanço de PEC que limita poderes do STF, dizem fontes
Por Ricardo Brito
BRASÍLIA (Reuters) -O presidente da Câmara, Arthur Lira (PP-AL), não tem demonstrado interesse em levar adiante ainda este ano a Proposta de Emenda à Constituição (PEC) aprovada pelo Senado que limita poderes do Supremo Tribunal Federal (STF), em meio à discussão de uma densa pauta de assuntos econômicos na Casa, disseram nesta quinta-feira fontes ouvidas pela Reuters.
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A PEC aprovada na véspera pelo Senado em dois turnos seguirá para a análise da Câmara no momento em que a Casa está focada em concluir a votação da reforma tributária, após o texto ter retornado do Senado, e votar outras iniciativas econômicas, segundo duas fontes próximas a Lira.
O presidente da Câmara, contudo, deve sofrer pressão de oposicionistas para pautar a proposta. Em café da manhã com jornalistas no início do mês, Lira disse que não teria qualquer restrição ao andamento da proposta, mas indicou que, por ele, a matéria não teria uma tramitação acelerada.
Na prática, a tramitação normal de uma PEC precisará passar por uma comissão especial e pela Comissão de Constituição e Justiça (CCJ) antes de ir à apreciação do plenário.
O líder do PT na Câmara, Zeca Dirceu (PR), disse à Reuters que não acredita que a PEC vai avançar na Casa rapidamente.
"Não vejo clima entre os líderes. Nunca vi o Lira sequer tratar disto e na minha opinião isto não é prioridade, me parece mais uma provocação ao STF de iniciativa de bolsonaristas envolvidos nos crimes e terrorismo de 8 janeiro", avaliou.
Segundo o petista, a Câmara deverá trabalhar até o final do ano para concluir a votação de medidas para garantir a arrecadação federal, as propostas da Lei de Diretrizes Orçamentárias e o Orçamento do próximo ano.
SUPREMO
Nesta quinta, o STF colocou em prática a primeira linha de reação ao Senado, quando o presidente da corte, Luís Roberto Barroso, e o decano, Gilmar Mendes, usaram a sessão do plenário para fazer duros questionamentos à matéria.
Em outra frente, os ministros passaram a discutir uma eventual reação aos senadores que poderia passar até pelo fim da restrição do foro privilegiado, retomando ao STF o poder para lidar com investigações criminais de parlamentares.
Em maio de 2018, o Supremo decidiu que o foro privilegiado só se aplicaria a crimes cometidos durante o mandato e em casos relacionados às funções desempenhadas. Isso levou a uma sensível redução de investigações contra parlamentares na corte, com boa parte delas ficando na primeira instância.
Essa reação, relatou uma das fontes, também pode sobrar para o governo, que tem uma série de assuntos de interesse econômico e fiscal no STF.
No Supremo, os principais alvos de críticas são o presidente do Senado, Rodrigo Pacheco (PSD-MG), autor da PEC e patrocinador da votação da medida, e o líder do governo na Casa, o petista Jaques Wagner (BA), que orientou a liberação da base aliada e votou a favor da iniciativa.
As fontes afirmam que Pacheco -- que foi um dos principais aliados do Supremo para contornar os ataques do então presidente Jair Bolsonaro ao Judiciário e às ameaças golpistas -- "se queimou muito" e "implodiu" as pontes que tinha com a corte. O voto de Wagner também pegou mal no tribunal.
Apesar disso, a avaliação é que o efeito da PEC, mesmo se passar pela Câmara, é praticamente inócuo. Isso porque o próprio STF já adota desde a gestão da ex-presidente Rosa Weber muitas das medidas previstas na proposta. Uma delas é o envio imediato para confirmação ou derrubada no plenário de decisões monocráticas de ministros.
"Mas, politicamente, é uma afronta", criticou uma das fontes do STF, ao considerar que o interesse de Pacheco em bancar a proposta tem por objetivo fazer um aceno aos bolsonaristas do Senado de olho em futuros dividendos eleitorais.
Durante as negociações da PEC, no entanto, o presidente do Senado disse que não havia "nenhum tipo de afronta e nem tampouco nenhum tipo de retaliação", alegando que se buscavam "aprimoramentos".
Nesta quinta, Wagner publicou na plataforma X, antigo Twitter, que seu voto na PEC "foi estritamente pessoal, fruto de acordo que retirou do texto qualquer possibilidade de interpretação de eventual intervenção do Legislativo".
"Reforço aqui meu compromisso com a harmonia entre os Poderes da República e meu total respeito ao Judiciário e ao STF, fiador da democracia brasileira e guardião da Constituição", acrescentou.
(Edição de Alexandre Caverni e Pedro Fonseca)