Eleição municipal deve revelar fortalecimento do centrão e da direita antissistema

Por Eduardo Simões

SÃO PAULO (Reuters) - Mais de 155 milhões de eleitores poderão ir às urnas no domingo para escolher prefeitos e vereadores de 5.569 cidades brasileiras em uma eleição que deverá revelar um fortalecimento de partidos do centrão e de nomes da direita antissistema ligados ao ex-presidente Jair Bolsonaro.

Ao mesmo tempo, a votação deverá mostrar dificuldades para a esquerda, em um cenário de certo afastamento do presidente Luiz Inácio Lula da Silva.

"A gente tem como uma primeira tendência uma permanência desse discurso antissistema. É óbvio que ele migrou à direita, ele se tornou mais eficaz à direita... um resultado que tende a ser favorável para grupamentos do centro à direita antissistema", disse o cientista político Creomar de Souza, da consultoria de risco político Dharma.

"A esquerda, que hoje está muito concentrada nesse entorno do Partido dos Trabalhadores (PT) -- tirando alguma vitória pontual --, vai ter alguma dificuldade. E aí talvez levar eleições para o segundo turno em capitais pode ser encarado como uma vitória", acrescentou.

Em meio às dificuldades de seu campo político no pleito, Lula, que no início do ano chegou a apontar que a disputa municipal teria tons de um embate entre ele e Bolsonaro, manteve-se em grande parte afastado.

Embora tenha gravado vídeos de apoio para aliados, Lula pouco participou da campanha na rua.

Mesmo em São Paulo, onde apoia o deputado federal Guilherme Boulos (PSOL), Lula participou apenas de um comício no início da campanha e cancelou a participação em um segundo evento recentemente. Na quinta, fez uma live nas redes sociais com o aliado e, no sábado, véspera da eleição, participará de uma caminhada com Boulos.

"O Lula parece estar tentando evitar ficar muito colado com imagens de derrotas", disse Creomar. "O bolsonarismo e o lulopetismo foram a campo, acho que o bolsonarismo de maneira mais eficaz até aqui."

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Levantamento realizado pelo jornal Folha de S.Paulo com base em pesquisas sobre as disputas nas 103 cidades brasileiras com mais de 200 mil eleitores e que, portanto, podem ter segundo turno, apontou que nomes apoiados por Bolsonaro lideram em mais locais do que candidatos ligados a Lula. O segundo turno, onde houver, ocorrerá em 27 de outubro.

Partidos do chamado centrão, como PSD e PP, também devem sair mais fortes do pleito municipal.

"O centrão tem a vantagem da mobilidade estratégica, é muito conveniente para um prefeito do PSD em uma cidade fechar com o Bolsonaro e o de outra cidade fechar com o Lula", disse Creomar.

"No final do dia, o partido vai enchendo seus espaços e tendo a capacidade de adensar a sua base de municípios. E essa base de municípios é fundamental para o que vem depois, que são as eleições para deputados, que é onde a turma levanta dinheiro", acrescentou, referindo-se à divisão do fundo partidário, que leva em conta o tamanho das bancadas federais.

EFEITO MARÇAL

Em São Paulo, maior cidade do país e apontada por Lula no início do ano como palco principal da disputa municipal deste ano, o surgimento de um candidato antissistema, o ex-coach Pablo Marçal (PRTB), frustrou as expectativas de uma disputa indireta entre Lula e Bolsonaro, encabeçada por Boulos e pelo atual prefeito, Ricardo Nunes (MDB).

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Com uma retórica agressiva e calcada principalmente no deboche -- notabilizou-se por cunhar apelidos para os rivais -- Marçal fez com que a campanha paulistana acabasse marcada não por propostas, mas por episódios como a cadeirada que levou em um debate do candidato do PSDB, José Luiz Datena, após afirmar que o rival não seria homem para agredi-lo, e pelo soco que um assessor seu deu no marqueteiro de Nunes após outro debate.

Conseguiu também se colocar na disputa por uma vaga no segundo turno contra Boulos e Nunes.

"Ganhando ou perdendo, o Marçal ganhou. Ele saiu do nada, sem tempo de TV, colocando dinheiro do próprio bolso, com uma retórica muito firme para esses grupamentos antissistema", disse Creomar.

OUTRAS CAPITAIS

A grande vitória da esquerda, levando em conta capitais e cidades com maior número de eleitores, deve ser a de João Campos (PSB), que as pesquisas apontam que será reeleito em primeiro turno em Recife, derrotando Gilson Machado (PL), ex-ministro do Turismo de Bolsonaro.

Outra cidade em que um aliado de Lula, embora não de esquerda, deve vencer já no primeiro turno é o Rio de Janeiro, com Eduardo Paes (PSD). As pesquisas indicam que ele deverá se reeleger derrotando outro nome próximo a Bolsonaro, o deputado federal Alexandre Ramagem (PL).

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No entanto, Campos e Paes não usaram a aliança com Lula amplamente em suas campanhas, contando muito mais com sua própria popularidade entre os eleitores.

Outra capital com grande população que deve reeleger seu prefeito em primeiro turno é Salvador, com Bruno Reis (União), em uma vitória de um nome não intrinsecamente ligado a Lula ou a Bolsonaro, mas sim ao grupo político local de ACM Neto.

Em Belo Horizonte, capital do Estado que é o segundo maior colégio eleitoral do país, três candidatos disputam cabeça a cabeça vaga no segundo turno, nenhum deles de esquerda: o deputado estadual e apresentador de TV Mauro Tramonte (Republicanos), o atual prefeito, Fuad Norman (PSD), e o bolsonarista Bruno Engler (PL).

Em Porto Alegre, o atual prefeito Sebastião Melo (MDB), apoiado por Bolsonaro, lidera as pesquisas, mas deve, segundo as sondagens, enfrentar a deputada federal petista Maria do Rosário em um segundo turno.

Sede da cúpula da ONU sobre o clima no ano que vem, Belém deverá ter um segundo turno entre Igor Normando (MDB), do partido do governador do Pará, Helder Barbalho, e o bolsonarista Delegado Éder Mauro (PL). Atual prefeito e candidato à reeleição, Edmilson Rodrigues (PSOL) deve ser derrotado já no primeiro turno.

Fortaleza deverá ter no segundo turno uma disputa direta entre lulopetismo e bolsonarismo, representados por André Fernandes (PL) e Evandro Leitão (PT), com o atual prefeito e candidato à reeleição José Sarto (PDT) ficando pelo caminho.

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