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Brasil precisa de política pública para evitar que preços internacionais do petróleo agravem pobreza, diz economista

Brasil precisa de política pública para evitar que preços internacionais do petróleo agravem pobreza, diz economista - Pixabay
Brasil precisa de política pública para evitar que preços internacionais do petróleo agravem pobreza, diz economista Imagem: Pixabay

23/02/2021 15h50

A demissão de Roberto Castelo Branco da presidência da Petrobras foi uma tentativa do governo Bolsonaro de mostrar ação diante da insatisfação dos caminhoneiros, que há três anos pararam o país frente a alta no preço do diesel. Mas a troca de comando não resolve a questão e apenas repete a histórica e errônea ingerência política na estatal. Essa é a avaliação do economista Adriano Pires, diretor do Centro Brasileiro de Infraestrutura (CBI). Ele defende a criação de um fundo com dinheiro de royalties para garantir autonomia da empresa e não sobrecarregar o consumidor brasileiro.

Raquel Miura, correspondente da RFI em Brasília

"É uma situação recorrente no Brasil. Em outros governos, a gente viu cenas idênticas. Toda vez que aumenta o preço do petróleo, e se isso vem acompanhado de uma depreciação do real frente ao dólar, para que o preço do mercado interno siga a tendência do mercado internacional, você tem que fazer aumentos muito fortes. Isso acaba provocando crises políticas. Foi assim no Fernando Henrique Cardoso, foi assim no Lula, foi assim com a Dilma. E com ela a coisa foi pior. Foi assim com Temer, que cedeu à greve dos caminhoneiros. E está sendo agora no governo Bolsonaro", diz o economista.

Para o especialista, o quadro atual é mais grave porque a crise sanitária do coronavírus elevou o nível de pobreza do país e o preço alto da commoditie torna insuportável o peso que é repassado à população. "As pessoas pobres no Brasil e no mundo também ficaram mais pobres. E é complicado você jogar, transferir o preço do mercado de petróleo para o consumidor final, seja no diesel, no gás de cozinha e mesmo na gasolina. E aí começam essas pressões dos caminhoneiros", resume Pires. "O presidente, que é um ser político, quer dar soluções. E normalmente não são as melhores. Então começa a querer encontrar os culpados. Acho que a razão principal dessa troca de comando na Petrobras é que Bolsonaro tinha que dar uma resposta aos caminhoneiros e resolveu que a resposta ia ser tirar o presidente da Petrobras."

Ao analisar a postura de chefes do Executivo diante da pressão de preço sobre o petróleo, o especialista afirma que nenhum presidente soube dosar politicamente o poder sobre a estatal. "Acho que todos erraram, uns mais, outros menos. Fernando Henrique errou menos. O Lula errou mais ou menos. A Dilma errou muito. O Temer também errou mais quando aceitou a greve dos caminhoneiros e mexeu no preço do diesel. E por incrível que pareça, até esse momento que Bolsonaro mandou trocar o presidente da Petrobras, o governo dele foi o que menos interveio na Petrobras nos últimos anos. Ele deu uma autonomia bastante grande para a companhia fixar os preços, vender seus ativos. Agora ele teve a recaída. Mas é normal o acionista majoritário, seja de uma empresa pública ou privada, trocar o presidente. Não tem problema nenhum. O problema foi a forma como ele fez a troca", explica Pires. "Se o presidente novo assumir e continuar tendo liberdade para continuar fixando o preço no mercado internacional, ter liberdade para continuar o programa de desinvestimentos, Bolsonaro continua não intervindo."

Fundo para estabilizar preços

O economista aponta como saída a criação de um fundo de estabilização de preços com recursos extras de royalties. "O governo estabiliza o preço no patamar que ele achar necessário, por exemplo: a partir de US$ 60 o barril, ou partir de US$ 50 o barril, eu não quero que vá para o consumidor. E aí ele pega esse recurso e ressarce a Petrobras e os importadores da diferença entre o preço no mercado internacional e o preço que vai ser colocado no mercado interno. No passado já se pensou muito isso. No governo do presidente Fernando Henrique, no governo do presidente Temer, mas sempre você teve uma questão: de onde viria o dinheiro. Royalties podem ser o caminho porque o Brasil é um grande produtor de óleo e gás e cresce a arrecadação de royalty quando o preço do barril está alto e quando o câmbio está depreciado."

Pires defende também que no caso do botijão de gás a política seja social, assim como existe no setor elétrico uma tarifa especial para os mais pobres. Pires condenou o monopólio da Petrobras e disse que a estatal não tem como absorver por muito tempo a volatilidade externa. "Quinta-feira depois do Carnaval a Petrobras anunciou um aumento de 10% na gasolina e 15% no diesel. Porque já estava muito defasado, já estava dando prejuízo para a empresa. E aí a população não aguenta. Se você pegar hoje um casal de brasileiros de classe média ou média baixa, que mora num apartamento de 60, 80 metros quadrados, o sujeito paga R$ 700 de conta de luz, paga R$ 300, R$ 400 para encher o tanque do carro, paga R$ 100 pelo botijão de gás. É um salário mínimo! Não tem condição social. Então a gente tem que entender que não dá para repassar isso dessa forma, como se repassam outros preços".

O economista do CBI disse que torce para que o novo presidente faça uma boa gestão na Petrobras, mas disse não conhecer muito bem o indicado de Bolsonaro, general Joaquim Silva e Luna, que foi ministro da Defesa de Michel Temer. "Pelo que eu vejo, muita gente fala bem dele, inclusive o próprio presidente Temer. Mas tem também uma coisa que preocupa o mercado, que é o fato dele ser militar e há a acusação que Bolsonaro estaria cada dia mais militarizando o governo. E isso também não é bom. Mas eu não posso falar nada dele, porque não o conheço. Acho que a gente tem que esperar e torcer para que seja um bom presidente para a companhia. E que ele se preocupe com a Petrobras e os acionistas, e não com os brasileiros. Quem tem que se preocupar com os brasileiros é o presidente Bolsonaro", finaliza.