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Crise política brasileira é maior que a econômica, diz Armínio Fraga

Mauro Pimentel - 11.nov.2015/Folhapress
Imagem: Mauro Pimentel - 11.nov.2015/Folhapress

22/06/2017 23h49

O ex-presidente do Banco Central Armínio Fraga afirmou nesta quinta-feira (22) que a crise política vivida pelo Brasil é ainda maior do que a crise econômica. Segundo ele, a decisão do Tribunal Superior Eleitoral (TSE) de manter o presidente Michel Temer no cargo agravou ainda mais esse cenário.

"Acho que o nosso problema econômico é enorme, está numa trajetória insustentável mesmo com o que sobrou das reformas. Mas acho que o problema político é muito maior do que econômico", disse. "É incrível isso, porque o problema econômico é gigante."

Armínio participou de debate com a economista-chefe da XP Investimentos, Zeina Latif, e com o presidente do Insper, Marcos Lisboa, na noite desta quinta-feira (22) no Expert2017, evento promovido pela própria XP.

Para ele, "a decisão do TSE prejudicou muito essa trajetória" de início de recuperação da crise. O economista, no entanto, não quis opinar diretamente se a saída de Temer traria alguma melhora para esse quadro.

"Não é questão de ele sair. Mas as decisões do Judiciário não podem ser pautadas por causa de uma visão errada do que está acontecendo no país e na economia."

Otimismo

Na visão de Armínio, a atual administração tem apresentado "boas propostas, mas que trazem benefícios daqui a 5, 10, 15 anos, quando a gente não consegue enxergar 18 meses à frente".

Esse quadro, segundo ele, traz riscos de que um candidato com propostas contrárias à agenda de reformas, "um representante do Brasil velho", seja eleito no ano que vem.

"Uma troca à la presidente da França, Emmanuel Macron, parece pouco provável", disse. Mas há ainda outros riscos, ligados ao perfil dos congressistas que serão eleitos, "mesmo que se eleja um bom presidente".

Ele defendeu que, para evitar esse cenário, é necessário que o debate econômico continue, se amplie e seja aprofundado. "A mobilização necessária tem que ser bem maior do que esta que estamos vendo", disse. "Sem sacrifícios organizados, os desorganizados vão ser muito maiores", afirmou ele, para quem também será preciso em algum momento aumentar a carga tributária.

Mesmo assim, Armínio disse que está mais otimista do que aparenta em seus discursos. Segundo ele, caso não só a da Previdência, mas outras reformas, como a tributária, sejam levadas adiante, "há um entendimento entre economistas de que a economia pode crescer 5% ao ano".

"Não é nenhum absurdo", afirmou. "Os investidores estrangeiros, mais otimistas do que nós, parecem acreditar que estamos condenados a dar certo."

Curto prazo

A economista-chefe da XP Investimentos, Zeina Latif, também alertou para a necessidade de uma recuperação mais consistente da economia para impedir que um candidato contrário às reformas que estão sendo implantadas seja eleito no ano que vem.

"Tenho dado peso excessivo a essa questão do curto prazo, porque acho que a forma como o país chegar no ano que vem pode influenciar a campanha", afirmou, dizendo que um mercado de trabalho em recuperação pode ajudar um "presidente conectado às reformas" se eleger.

Para Zeina, sem uma mudança de mentalidade, o país poderá ficar preso "a uma eterna mediocridade, porque tem presidente que não entendeu que precisa fazer reforma".

Mesmo assim, defendeu que o debate econômico no Brasil vem "evoluindo", enquanto a chance de eleger um presidente com um viés "de populismo do passado" vem diminuindo.

"A crise tem forçado o país a rever algumas crenças", disse. Outro fator que joga contra um presidente não alinhado às reformas são as restrições fiscais, segundo ela. "Acabou o dinheiro. Se você for abrir o cofre, só tem duplicata para pagar."

País mal acostumado

Para ela, o boom das commodities da década passada deixou o Brasil mal acostumado, com dificuldades para encarar um quadro que era mais grave do que aparentava. "Era como jogador de futebol que ficou rico de uma hora para a outra", disse.

A economista afirmou que não enxerga nenhuma liderança empresarial capaz de comandar o país neste momento, mas disse que percebe uma mudança de discurso entre os empresários. "Aquele sentimento do Estado grande, que decide a alocação de recursos na economia e quais empresas serão vencedoras, ele já não tem mais apelo [entre os empresários", afirmou.

Ela defendeu que, para superar de maneira consistente a crise, sejam apresentadas propostas em várias frentes, como na área de educação, "ainda que a questão fiscal seja urgente". "Não dá para pensar só em uma agenda", disse.

"Não consigo descartar o desastre, mas acho que só de a sociedade não aceitar aumento da carga tributária e inflação [é um fator positivo]", afirmou. "Dessa maneira o governo não se sustenta. Acho que a nossa classe política, com todos os defeitos, entendeu que nesse caminho não vai dar para ir."

Ajuste fiscal

Em sua intervenção, o presidente do Insper, Marcos Lisboa, afirmou que a "Previdência é só metade do problema" fiscal. "Da outra metade não estão nem tratando", disse no debate promovido pela XP.

Segundo o economista, embora a reforma da Previdência seja necessária, é preciso realizar um segundo ajuste fiscal, de R$ 350 bilhões, ou 6% do Produto Interno Bruto. "Minha preocupação é outra. A gente tem uma primeira pirambeira para passar", disse. "E a gente precisa desses R$ 350 bilhões todo ano."

Para ilustrar a dificuldade de atingir esse número, ele citou a margem fiscal de R$ 120 bilhões que o governo tem para destinar por escolha própria no orçamento deste ano. "Se o governo parar de gastar tudo que ele pode, fechar hospital, ele tem R$ 120 bilhões. É quase três vezes menos do que o ajuste necessário", afirmou.

Ajuste gradual

Mesmo com essa urgência, ele defendeu que esse ajuste seja colocado em prática gradualmente, a fim de não aprofundar a crise social. "Não dá para você tirar a fábrica [construída com incentivo fiscal] de uma hora para a outra", disse. "Essa é uma agenda pesada, que não deve ser instalada instantaneamente. São necessários ajustes longos, pequenas reformas."

Lisboa repetiu avaliação feita na semana passada em entrevista ao "Valor", em que criticou "retrocessos" fiscais promovidos pelo presidente Michel Temer. "Esse sempre foi um governo dois para cá, dois para lá", disse nesta quinta-feira. "Mas agora tudo mudou. A agenda boa que estava avançando parou."

Ele ainda criticou as administrações de Estados como o Rio de Janeiro, Minas Gerais e Rio Grande do Sul, acusando-as de não encararem devidamente os seus problemas fiscais, mas disse que "tem governador fazendo o dever de casa, nos lugares mais surpreendentes".

"Se a gente começa a limpar a casa, tem espaço para crescer muito", afirmou.

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