Máquinas com inteligência

Nas fazendas, tratores tomam decisões sozinhos e sensores lembram agricultor quando irrigar plantação

Viviane Taguchi Colaboração para o UOL, de São Paulo Divulgação Grupo CNH

Esqueça o cenário bucólico da roça. Nas fazendas brasileiras, a nova rotina é futurista. A tecnologia embutida em máquinas e equipamentos está movimentando todos os setores da cadeia de produção: de tratores, que pensam e tomam direções e decisões, sozinhos, a sensores que medem a umidade do solo, metro a metro, e até "ligam" para o fazendeiro para avisar quando é hora de irrigar parte da plantação.

Nas lavouras, em todo o mundo, mas principalmente na América do Sul, a agricultura de precisão (ou agricultura 4.0) tem terreno fértil para crescer e oferece formas mais ágeis, seguras e econômicas de produzir alimentos.

O mercado global de agricultura de precisão, que se baseia em informações temporais e espaciais associadas a tecnologias para melhorar a produção, é estimado em US$ 7 bilhões em 2021, mas deve alcançar US$ 12,8 bilhões em 2025, alta de quase 83%, apontou uma pesquisa realizada pela empresa norte-americana Market & Markets.

O ritmo de crescimento é de 12,7% ao ano, e os países em desenvolvimento, como o Brasil, Paraguai e Argentina, estão no topo da lista.

Entre os principais motivos que levam à expansão do setor estão investimentos em mecanização, aumento da oferta de mão de obra qualificada e a demanda por alimentos produzidos com menos produtos químicos.

No Brasil, há ainda investimentos em conectividade, como as antenas 5G que estão sendo instaladas em pontos estratégicos para atender ao agronegócio, e a explosão das agtechs, startups com foco em agropecuária, que já somam 1.574, de acordo com o Radar Agtech divulgado no começo de junho.

Valtra
Cabine de uma máquina agricola embutida com computadores de bordo que processam as informações coletadas por GPS e sensores.

Agricultor tem "visão de raio-x"

A agricultura de precisão é uma estratégia de gestão que reúne, processa e analisa dados sobre a produção e os combina com outras informações para apoiar as decisões de gerenciamento da fazenda, para melhorar a produtividade e a eficiência no uso de insumos. Através de equipamentos acoplados nas máquinas, como GPS e sensores, o agricultor tem uma "visão de raio-x" da propriedade para tomar suas decisões.

Marcos Ferraz, presidente da Associação Brasileira de Agricultura de Precisão (Asbrap), explica que a agricultura de precisão tem, por princípio, considerar que uma propriedade não é uniforme e que cada área tem diferentes características físicas e químicas que exigem manejos diferentes.

"A estratégia possibilita o uso racional de insumos como fertilizantes, a aplicação em quantidade, local e tempo adequados", afirmou. "No mesmo talhão de terra podem existir pontos com necessidades diferentes e, com a agricultura de precisão, sabemos onde estão estes pontos e o que aquele pedacinho de terra precisa."

Segundo ele, é possível economizar, reduzir o impacto ambiental, a compactação do solo (quando o trator passa várias vezes no mesmo lugar e deixa a terra improdutiva) e aumentar a produtividade por hectare. "Com base nos mapeamentos fornecidos pelas ferramentas da agricultura de precisão, é possível controlar a distribuição de sementes, o uso da água, a velocidade e a direção dos tratores."

Embrapa
Silvia Massuhá, da Embrapa Informática: operadores podem focar sua atenção em mapas e informações de dados fornecidos pela tecnologia da máquina

Máquinas regulam quantidade de sementes e pulverização

Os equipamentos embutidos nas máquinas agrícolas podem ser itens de fábrica ou incorporados aos veículos e são capazes de captar informações importantes da lavoura. Sensores fazem uma leitura do terreno, enviam as informações coletadas para um computador de bordo, que analisa tudo, cruza os dados com softwares agronômicos e acadêmicos e, depois, oferecem ao produtor rural alternativas de manejo.

Atualmente, de acordo com a Embrapa Informática, 78% das máquinas agrícolas novas têm ferramentas tecnológicas para auxiliar o produtor na fase de preparo do solo, 72% para a análise de solo, 69% para regulagem automática de equipamentos, 66% para o plantio e para soltar apenas o número certo de sementes, 64% regulam a pulverização, 60% auxiliam na colheita.

Segundo o órgão, 49% das máquinas no campo já têm GPS, que permite ao veículo se deslocar pela lavoura sem a intervenção do piloto, e 36,9% têm piloto automático.

"O operador da máquina continua sendo um elemento essencial no trabalho no campo, mas agora ele pode ficar de olho em outros detalhes da lavoura, e não mais concentrado em guiar e controlar as operações da máquina", afirma a pesquisadora Silvia Massuhá, da Embrapa.

Esse profissional agora é treinado para interpretar os dados fornecidos. Segundo ela, entre esses dados são mapas de irrigação, áreas degradadas, fertilização, semeadura e outros.

Senar/CNA
Através de apps e softwares, produtor consegue controlar tudo o que acontece na lavoura através de um smartphone ou um notebook

Antenas 5G permitem controlar fazenda por celular

A fazenda do futuro já existe - e não é uma só. Nelas, o produtor tem controle de tudo o que acontece na lavoura por um celular ou computador e, em 10 anos, o sistema fará parte do cotidiano brasileiro no campo. "A agricultura vai dar um salto de produtividade graças às tecnologias", disse Marcos Ferraz, da Asbrap. "Os gargalos que fazem o setor crescer estão sendo solucionados rapidamente."

Até pouco tempo, a conectividade nas zonas rurais era o maior problema para a agricultura. Em 2020, o governo modificou leis do setor de telecomunicações. Agora, empresas de telefonia, associadas a indústrias de máquinas agrícolas, estão investindo no campo. Em maio, em Rondonópolis (MT), foi instalada a primeira antena 5G com foco no agronegócio, a segunda do país, e na semana passada, outra antena 5G, voltada para os agricultores, foi inaugurada em Sorocaba (SP).

O equipamento dará suporte a testes e protótipos de produtos e serviços, startups e universidades que desenvolvem inovações para o agronegócio. A antena tem serviço de transmissão em alta velocidade e, segundo o Ministério da Ciência e Tecnologia, das 20 antenas que serão instaladas, oito estarão em áreas rurais. Segundo a pasta, apenas 23% das zonas rurais brasileiras têm conectividade e o leilão da internet 5G no Brasil deve acontecer em dois meses.

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Máquina futurista custa até R$ 2 milhões

Hoje, a maioria dos softwares acoplados às máquinas é autônomo e não precisa estar conectada à rede. Além da falta de conectividade nas áreas rurais do país, que facilitariam o uso de tecnologias ligadas à internet, a agricultura de precisão esbarra em outros gargalos como os custos iniciais de investimento (uma máquina equipada com todos os recursos pode custar entre R$ 1,5 milhão e R$ 2 milhões).

A consultoria McKinsey & Company apontou que o principal impedimento para o uso maior de tecnologias é o alto custo de aquisição (52%) enquanto a falta de entendimento sobre o funcionamento dos sistemas é o motivo de 20% dos produtores não adotarem a agricultura de precisão.

Assim, a falta de profissionais capacitados para repassar o conhecimento aos produtores rurais é outro fator que pesa. Segundo Marcos, da associação de agricultura de precisão, as indústrias que vendem as máquinas agrícolas capacitam vendedores e clientes, mas ainda é pouco, pois o avanço dos sistemas é ágil, assim como surgem tecnologias novas todos os dias.

"Ainda enfrentamos dificuldade na execução e no conhecimento para a utilização plena das tecnologias", disse. "É preciso que os profissionais, desde o vendedor da máquina até o engenheiro agrônomo e o operador, saibam usar essas tecnologias para tirar delas o maior e melhor proveito."

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Drones: ferramentas de precisão conseguem elevar a produtividade diária de uma colheita

Novos profissionais: operador de drones e agrônomo digital

Para lidar com este novo mercado, novos profissionais estão migrando para o agronegócio. São profissões que até então, estavam restritas aos centros urbanos mais modernos.

O Sebrae, em parceria com Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS) divulgou o resultado de uma pesquisa que aponta oito novas profissões para o agronegócio: técnico em agricultura digital, técnico em agronegócio digital, agrônomo digital, operador de drones, designer de máquinas agrícolas, cientista de dados agrícolas e engenheiro de automação agrícola.

Esses profissionais já atuam nas indústrias e, mais recentemente, nas agtechs (startups com foco em soluções para o agronegócio).

Um estudo da Embrapa, realizado em parceria com a empresa Homo Ludens Research and Consulting e a SP Ventures, indicou que, em 2020, foi criada uma agtech por dia no Brasil. Hoje, já são 1574 startups desenvolvendo soluções digitalizadas para o campo.

Dessas empresas, 199 são focadas em soluções digitais para atender demandas das cadeias produtivas na etapa antes da fazenda, 657 delas desenvolvem inovações para dentro da fazenda e 718 trabalham com tecnologias para a fase depois da fazenda.

No campo acadêmico, já existem cursos superiores com foco em agricultura de precisão e especializações, para agrônomos, no setor.

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