Mercado de adubos em alta

Com grãos valorizados, setor de fertilizantes nunca vendeu tanto e espera novo recorde para este ano

Vinicius Galera Colaboração para o UOL, de São Paulo iStock/fotokostic

O aumento no preço das commodities beneficiou de maneira inédita o mercado de fertilizantes no Brasil. O setor fechou o ano de 2020 com vendas de 40,5 milhões de toneladas, um recorde e alta de 12% em relação ao ano anterior. Agora já projeta uma nova marca histórica.

O bom momento é resultado de uma conjunção de fatores como a demanda cada vez maior por alimentos, o câmbio e, agora, o avanço da vacinação e a consequente injeção monetária nos mercados importadores das nossas commodities agrícolas.

A conta nesse mercado é simples. Quanto mais o país produz, mais a produção agropecuária demanda insumos. O aumento da produtividade verificado nas últimas décadas, muito superior ao da expansão da área plantada, torna o cenário mais propício para o setor de fertilizantes.

O único senão, ainda, é a dependência do produto importado, que, diga-se, preocupa mais o governo do que os próprios atores do mercado.

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Eduardo Monteiro, presidente da Anda e vice-presidente comercial da Mosaic

Crescimento fora da curva

Em 2020, a Associação Nacional para Difusão de Adubos (Anda) registrou um crescimento de 12% no mercado de fertilizantes em relação ao ano anterior. Um crescimento fora da curva, de acordo com o presidente da associação e vice-presidente comercial da Mosaic Fertilizantes, Eduardo Monteiro.

Neste ano ele diz observar uma situação ainda mais propícia. Com o cenário atual, as expectativas não poderiam ser melhores. "Não será de se estranhar se neste ano registrarmos um crescimento de dois dígitos e o mercado superar 44 milhões de toneladas", disse.

Nas últimas décadas, as principais produções estão sendo mais demandas pelos mercados. Estudos do Ministério da Agricultura mostram que, entre 1979 e 2019, a produção brasileira cresceu 385% enquanto a área plantada aumentou 33%. Ou seja, a produtividade cresceu mais de dez vezes.

Eduardo explica que os preços dos grãos subiram e o dos fertilizantes também. "A gestão da agricultura no Brasil é muito atrelada a uma gestão de riscos. No momento em que o produtor vende a safra ele procura 'travar' seus custos de sementes, defensivos e fertilizantes", diz.

Ou seja, enquanto vende uma safra ele passa a comprar insumos para o plantio da safra seguinte.

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Complexo da Yara Fertilizantes

Fertilizante mais em conta

As compras de fertilizantes nunca estiveram tão antecipadas. De acordo com estimativas das principais indústrias do setor como a Mosaic e a Yara, até agora já foram comercializados cerca de 65% do volume demandado ao longo do ano. Normalmente, nessa época, as vendas ainda estão num patamar entre 30 e 40%.

Para comprar uma tonelada de fertilizantes, o produtor precisa produzir 15 sacas de soja, principal produto do agronegócio nacional. Segundo Eduardo Monteiro, "é um número bastante razoável, está até um pouco abaixo da média". Segundo ele, os preços da soja estão bastante atrativos e isso teve impacto nos preços dos fertilizantes.

No milho a relação é ainda mais extrema, girando hoje ao redor de 30 sacas para comprar uma tonelada de fertilizante. Em 2018, a relação chegava a 40 sacas por tonelada. "Era muito mais caro. O preço do milho subiu muito, mas a relação de troca se torna muito favorável para o produtor".

Os preços estimulam a comercialização antecipada. E isso pode gerar um problema, segundo o executivo. "Há um risco de concentração no transporte e fila nos portos". O Brasil é historicamente dependente da exportação. Para evitar transtornos como filas e impactos no custo logístico, a Mosaic diz que vem orientando seus clientes a retiraram os volumes de fertilizantes já comprados o quanto antes. "É uma forma de garantir que o produto esteja disponível no momento exato".

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Maicon Cossa, vice-presidente comercial da Yara Fertilizantes Brasil

Produtores investem em novas áreas e tecnologias

Além dos grãos, Eduardo Monteiro, da Mosaic, também cita o café, o algodão e a cana como exemplos de produtos que estão indo bem. A perspectiva de crescimento do mercado de adubos, segundo ele, está relacionada ao crescimento das tecnologias. "Em uma situação favorável, em que os preços estão bons, os produtores investem em tecnologia", diz.

O executivo faz questão de lembrar que a expansão da agricultura não tem tanta relação com a abertura de novas áreas, mas da conversão de áreas já existentes de pastagem em agricultura. "Esses dois pilares estão impulsionando muito o crescimento do nosso mercado."

O vice-presidente comercial da Yara Brasil, Maicon Costa, também projeta um crescimento de algo em torno de 5% no mercado dos insumos. "A rentabilidade das diversas culturas, notadamente dos grãos, que vivem um momento especialmente positivo, tem aumentado."

De acordo com Maicon, um ponto importante no desenvolvimento do mercado de fertilizantes é a mudança no perfil da compra. "O produtor tem saído de produtos básicos para produtos com nível tecnológico maior, que vão gerar mais produtividade e renda."

O executivo diz que o crescimento do mercado de fertilizantes especiais está muito acelerado, com taxas duas vezes maiores do que os produtos convencionais.

Exemplo desses produtos são os fertilizantes foliares, aplicados, como o nome diz, já nas folhas e associados ao que o executivo chama de "ajuste fino" da planta. "O produtor está buscando um toque de qualidade na produção".

Governo tem preocupação com dependência externa

De acordo com estimativas do governo federal, apenas cerca de 20% dos fertilizantes utilizados no Brasil são produzidos por aqui. O país importa sobretudo Fósforo e Potássio, base dos fertilizantes mais utilizados, conhecidos pela sigla NPK (de Nitrogênio, Fósforo e Potássio).

Em março, a Secretaria de Assuntos Estratégicos passou a coordenar uma discussão envolvendo ministérios e agentes da cadeia do setor para a criação de um programa nacional de fertilizantes. O grupo de trabalho ainda tem cerca de 60 dias para apresentar o plano ao presidente da República.

O diretor executivo da Associação Nacional para a Difusão de Adubos, Ricardo Tortorella, explica que, inicialmente, isso não é um problema, mas diz que o governo atual está preocupado com a alta dependência da importação.

"Nós estamos falando com outros setores, que estão avaliando se consideram a dependência alta ou baixa. O Brasil é muito rico nessa produção. Para nós é importante que se discuta, que se tenha uma política pública direcionada ao agronegócio, que é muito importante como componente do PIB", diz Tortorella.

O Brasil nunca foi autossuficiente na produção, mas ele lembra que, quanto mais produz alimentos, maior a taxa de importação de fertilizantes.

"Não existe o problema da dependência, o problema é depender em um grau tido como muito grande. Qual é a dependência ideal? Metade de importação e metade de exportação? Precisamos achar o equilíbrio ideal. Hoje, depois de décadas, a discussão está acontecendo. A discussão é saudável."

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