Robô tira leite e pesa gado

Sensores sabem quanto o animal comeu ou andou e vacas são ordenhadas por robôs

Vinicius Galera Colaboração para o UOL, em São Paulo jess311/iStock
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Cocho eletrônico mede quanto animais comeram

O gado nem suspeita, mas, enquanto rumina ou observa a paisagem, pode ter cada um dos seus movimentos monitorados. Quanto comeu, bebeu, andou, ficou parado, para onde foi e até mesmo do que precisa. Essa avaliação constante é parte de um conjunto de tecnologias integradas conhecidas como pecuária de precisão.

"Basicamente, o conceito trata de utilizar tecnologias disponíveis para tornar o manejo do animal individualizado", afirma o pesquisador da Embrapa Pecuária Sudeste, Alberto Bernardi.

Na prática, significa particularizar o manejo do bovino, e não de todo o rebanho, para que o pecuarista possa ter mais rendimento e lucro.

Os sensores que medem pesagem, temperatura e comportamento tornam possível fornecer para cada animal a quantidade desejada de alimentação, além de fazer um diagnóstico da saúde.

A tecnologia ainda é usada em geral por produtores mais endinheirados. Mas a tendência é que, tanto as inovações disponíveis quanto aquelas ainda em desenvolvimento se tornem mais baratas conforme sejam disseminadas.

Entre abril e junho do ano passado, a Embrapa realizou um estudo em parceria com o Serviço Brasileiro de Apoio às Micro e Pequenas Empresas (Sebrae) e com o Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (INPE) sobre o retrato da agricultura digital brasileira. Dos 754 produtores ouvidos, 335 disseram trabalhar com pecuária (bovinos, suínos e aves) e, entre eles, apenas 18% declararam não fazer uso de nenhuma ferramenta digital em suas criações.

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Hoje, os brincos eletrônicos, com chips, carregam informações importantes sobre o gado

Tecnologias representam ajuste fino na produção

Há algum tempo, brincos de identificação e pesagens eram o que havia de mais avançado para os pecuaristas reconhecerem os animais e observá-los. Hoje, os brincos eletrônicos, com chips, permitem a conexão com outros equipamentos.

"Informações como data de nascimento, pesagem, tratos nos animais, tudo isso está no brinco", afirma Alberto Bernardi, da Embrapa. "Mas o brinco vai avançar ainda mais. Já se fala em padrões de reconhecimento e de estimativa de peso do animal por imagem", diz.

Os drones também estão abrindo muitas possibilidades. "Com eles, é possível fazer levantamentos de rebanho e criar algoritmos. Há desde câmeras mais simples até as mais sofisticadas que permitem o manejo de animais e da pastagem."

O pesquisador explica que, a partir do reconhecimento, os sensores conectados fornecem dados antes impensáveis como termografias, frequência cardíaca e nível de estresse.

Mas Alberto alerta que as tecnologias são mais efetivas quando o pecuarista tem uma produção alinhada com boas práticas. "Não adianta implementar tecnologia de ponta se o produtor não tiver o tripé alimentação, condições sanitárias adequadas e boa genética. As tecnologias muitas vezes representam um ajuste fino na produção."

Balanças automáticas permitem tomada de decisão mais rápida

A principal vantagem da pecuária de precisão é o aumento do rendimento dos rebanhos. A melhor utilização dos recursos, segundo os especialistas, pode ser revertida em ganhos sustentáveis.

Exemplo de tecnologia disponível são as balanças de pesagem automáticas. Normalmente, os animais criados no pasto são pesados uma vez ao ano. Nos confinamentos, como são chamados os sistemas em que os animais são criados em lotes com dimensão determinada, a pesagem é feita quando eles chegam ou saem para o abate.

O PersonalBov é um sistema de balanças automáticas estáticas ou dinâmicas em que não é preciso levar os animais até as mangueiras para a pesagem. Enquanto se dirigem ou se alimentam nos cochos, os animais passam ou ficam sobre balanças que geram relatórios. Com eles, é possível saber se estão se alimentando corretamente, se estão ganhando peso ou se apresentam problemas ou doenças.

Isso gera muito mais lucro nas fazendas, explica o fundador e administrador da PersonalBov, João Carlos Siqueira. "As tomadas de decisão são muito mais rápidas e os produtores conseguem fazer uma rotatividade maior com os animais."

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Vacas vão voluntariamente para a ordenha

Robôs ordenham vacas sem intervenção humana

Na ordenha voluntária, as vacas são condicionadas a saírem do pasto e se dirigirem à sala de ordenha, onde um robô assume a tarefa de tirar o leite.

O sistema, desenvolvido na Europa, já está em operação no Brasil há alguns anos. Alexandre Toloi, gerente responsável pela área de ordenha voluntária da DeLaval Brasil, explica que o método permite que a vaca expresse comportamentos normais em sua rotina. "Ela pode deitar, comer, beber e, voluntariamente, ir ao sistema onde será ordenhada." A DeLaval é uma empresa de origem sueca voltada para a fabricação de equipamentos e soluções para a pecuária leiteira.

Basicamente, esse voluntarismo funciona a partir da redução da ração ou energia disponível na pista de alimentação. O animal então vai procurar ração no robô, uma espécie de estábulo que fecha à sua entrada, identifica se o animal pode receber a ração, fornece o complemento alimentar e extrai o leite por meio de bicos ou "teteiras" automáticos. Os bicos se encaixam sozinhos nas vacas.

A ordenha voluntária permite aumentar a conversão alimentar em produção de leite.

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Robô faz centenas de ordenhas por dia

Qualidade de vida para produtores e bem-estar para os animais

Quanto menos interferência do homem, mais eficiente é o sistema, garante Alexandre Toloi, da DeLaval. Um robô como o oferecido pela empresa tem capacidade para fazer 200 ordenhas por dia. "Além da conversão alimentar, o sistema ainda beneficia a mão de obra nas fazendas."

No Brasil, os equipamentos são mais comuns nas regiões Sudeste e Sul, caracterizada por propriedades familiares. Sem a preocupação direta com as ordenhas, a estrutura, segundo Alexandre, libera mais tempo para as pessoas dedicarem a outras atividades.

"O que paga a conta é quanto o robô consegue entregar. A DeLaval tem robôs que entregam mais de 2.800 litros de leite na média, mas já registramos no Brasil números acima de 3.000 litros".

O sistema está crescendo e tende a mudar a cara da pecuária leiteira. "Sempre que vem a mudança, o primeiro impacto que a sociedade imagina é o desemprego, mas é o contrário. As fazendas que estão operando reduziram a rotatividade da mão de obra, aumentaram a qualidade de vida de proprietários e empregados, a produtividade e a remuneração do negócio".

Alexandre garante que com o sistema os animais ficam mais tranquilos porque não sofrem com o estresse dos ordenhadores.

Tecnologias atraem jovens para o campo

Uma das características da precisão é a multidisciplinaridade. Alberto Bernardi, da Embrapa Pecuária Sudeste, diz que a equipe responsável na unidade é composta por agrônomos, veterinários, zootecnistas e biólogos. "Hoje não é mais possível não termos conhecimentos mínimos de informática e eletrônica. Eu posso até não desenvolver um brinco, mas eu preciso enxergar o sistema como um todo e saber como e onde utilizá-lo."

O mesmo princípio se aplica aos produtores. "Se você não utilizar o dado e transformá-lo em informação convertida para o manejo e intervenção no rebanho você não estará fazendo pecuária de precisão", diz.

É nesse aspecto que há a valorização do produtor, pois a decisão precisará ser mais embasada. E aí entra uma possível solução para uma preocupação de muita gente da área rural: a sucessão familiar ou a permanência e o retorno dos jovens no campo.

"Muitas vezes os filhos dos proprietários não querem dar continuidade ao serviço do pai, mas quando eles percebem que podem controlar um drone, ter máquinas conectadas, controlar um robô de ordenha ou gerar relatórios por imagem, isso tudo pode atraí-lo de volta ao campo."

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