Como ganhar com juros

Os juros em alta permitem fazer dinheiro com Tesouro ou CDB, mais seguros que Bolsa, mas veja antes se vale

Paula Pacheco Colaboração para o UOL, em São Paulo Kirill Smyslov/iStock
Renato S. Cerqueira/Futura Press/Folhapress
Bolsa de Valores: na época de baixa da Selic, investidores buscaram a renda variável

A Selic, taxa básica de juros, vinha nos últimos anos desestimulando os investimentos em renda fixa, como Tesouro Direto e CDB. O reflexo dessa tendência foi o interesse crescente pela renda variável, como fundos imobiliários e ações em Bolsa.

A B3, Bolsa de Valores de São Paulo, por exemplo, registrou por cinco anos consecutivos um aumento expressivo no número de pessoas físicas investindo. Em 2020, essas contas cadastradas na Bolsa paulista cresceram 92%, num total de 3,2 milhões.

Agora a taxa básica de juros está em trajetória de alta desde em março. O interesse pela renda variável diminuiu.

Desde que o Copom (Comitê de Política Monetária), do Banco Central, decidiu subir os juros, os investidores e gestores tiveram de reposicionar as carteiras de ativos para adequar a estratégica de ganhos a uma nova realidade.

De março até agora já foram três aumentos seguidos da Selic. Na última reunião, em junho, o comitê elevou de 3,5% ao ano para 4,25%.

Dá para ganhar dinheiro?

Especialistas ouvidos pelo UOL explicam que a nova fase da Selic, ajustada por conta do comportamento da inflação do país, pode gerar oportunidades de ganho com produtos de renda fixa, com perfil mais conservador.

O aumento dos juros permite ao investidor dar um passo atrás e montar uma posição de renda fixa mais relevante. Praticamente todas as opções de renda fixa podem apresentar boa performance. Com a inflação mais alta, títulos prefixados, com base em juros futuros, apresentam taxas bastante atrativas.
André Alvarenga Chede, planejador financeiro

megaflopp/iS
Quanto ter aplicado em renda fixa na carteira? Especialistas divergem

Expectativa ainda de alta

Segundo o último Relatório Focus, do Banco Central, de 16 de julho, que traz as projeções de analistas financeiros, a expectativa ainda é de aumento da Selic.

Para este ano, os especialistas ouvidos pela autoridade monetária trabalham com uma estimativa de 6,75% para a taxa. Em 2022, a previsão segue em alta, chegando a 7%, para depois recuar um pouco no ano seguinte, chegando a 6,50%.

Ainda de acordo com o Focus, 2021 deve terminar com o IPCA (Índice de Preços ao Consumidor Amplo, medida usada para calcular a inflação) em 6,31%, com tendência de queda para 2022 e 2023 - respectivamente, 3,75% e 3,25%. Se esse cenário se confirmar, a renda fixa seguirá como um ativo estratégico para os investidores.

André Alvarenga Chede, planejador financeiro, avalia que a Selic se manterá na ascendente. Para o planejador financeiro, seu ponto de equilíbrio está na casa dos 6%. Por isso, diz, o investidor que deu à sua carteira um perfil mais arrojado deve buscar um equilíbrio que garanta uma fatia dos recursos em uma reserva mais conservadora.

No entanto, Chede alerta que mesmo com a previsão de alta da Selic, a renda fixa não deve ser o produto principal da carteira porque sua expectativa de ganho não apresenta grandes perspectivas.

A orientação de Mehanna Mehanna, sócio da Phi Investimentos, é que o investidor tenha de 40% a 45% das aplicações em títulos de longo prazo indexados à inflação, que vão permitir que se obtenha ganhos com juros reais. Cerca de 30% devem ficar em prefixados no médio prazo e de 25% a 30% no pós-fixado.

A ata do Copom deixa claro que a preocupação é com o controle da inflação, por isso os juros estão subindo. Para entender como fazer a modificação da carteira de investimentos diante desse cenário é preciso avaliar ativos que se beneficiem da inflação alta, já que à medida que ela subir os juros vão acompanhar.

Thiago Andrade, Sócio da Athena-BGA Investimentos

Um dos aprendizados durante a pandemia foi a importância da diversificação de carteira, não apenas para não queimar parte do patrimônio caso surja alguma eventualidade, mas para ter reserva de oportunidade e aproveitar desequilíbrios de mercado. Agora, por exemplo, é o momento da renda fixa atrelada a índices inflacionários, que protege os recursos de uma queda da bolsa e possibilita aproveitar a alta de juros.

Mehanna Mehanna, Sócio da Phi Investimentos

Corrida pela renda fixa

Essa combinação de IPCA e Selic em curva ascendente já se reflete nas decisões dos investidores. Dados da Associação Brasileira das Entidades dos Mercados Financeiro e de Capitais (Anbima) mostram que os fundos de renda fixa apresentaram em junho um crescimento de patrimônio pelo sétimo mês consecutivo. No acumulado do primeiro semestre, a captação líquida somou R$ 98,9 bilhões.

"Com a taxa de juros a 2% ao ano, todo mundo foi para a Bolsa. Muita gente se precipitou em decretar a morte da renda fixa. São movimentos cíclicos. Muitos colocaram muito dinheiro na Bolsa e esqueceram que a renda fixa estava pagando 10% ao ano, sem risco", afirma Thiago Andrade, sócio da Athena-BGA Investimentos.

Entre os produtos de renda fixa, estão o Tesouro IPCA, os CDBs indexados à inflação, Tesouro Direto, as Letras de Crédito Imobiliário (LCI) e do Agronegócio (LCA).

Na hora de contratar qualquer um desses produtos, no entanto, é preciso saber se há chance de alcançar uma rentabilidade acima da inflação. Do contrário, o ganho pode ser corroído.

g-stockstudio/iStock
Investidor: veja onde aplicar em renda fixa

Quais são as opções de investimento classificadas como renda fixa

  • Poupança: em 2020, rentabilidade foi de 2,11% ao ano, enquanto a inflação ficou acima de 4%. Ou seja, a rentabilidade real foi negativa. Entre maio de 2020 e de 2021, a poupança teve o menor rendimento real em 30 anos. No acumulado no primeiro semestre deste ano, a valorização foi de 0,87%, contra uma inflação de 3,77%. O rendimento é atrelado à Selic (70% da taxa básica de juros). "Com o aumento da taxa, é natural que a poupança passe a ficar cada vez mais interessante. Pela isenção de imposto e a facilidade de aplicação e resgate, além da segurança, acaba sendo uma boa alternativa para reserva de caixa, oportunidade e emergência, que não prioriza rentabilidade", diz Mehanna.
  • Tesouro Selic: trata-se de um produto com bastante liquidez e que acompanha a evolução da Selic, assim como a poupança. Portanto, a rentabilidade deve subir com a alta dos juros. Dentre os dois produtos, Mehanna recomenda o Tesouro Selic para quem busca investimento de longo prazo.
  • Outros títulos do Tesouro Direto: as taxas já estão atrativas, em relação à rentabilidade de um ano atrás, mas podem subir ainda mais. O Tesouro prefixado hoje paga uma taxa de 8,5% a 9% ao ano, dependendo do vencimento de cada título. Já o Tesouro IPCA está com uma taxa em torno de 4% a 4,3%, mais a inflação. "Com a retomada da alta dos juros, o Tesouro continua sendo uma boa alternativa para quem quer um investimento conservador, acessível e líquido. O prefixado vale para um investimento de médio prazo", avalia Mehanna. Já o Tesouro IPCA é mais indicado para um objetivo de longo prazo, por exemplo, previdenciário.
  • CDB: é um título de renda fixa privado. Como é emitido por uma instituição financeira, é coberto pelo FGC (Fundo Garantidor de Crédito), que protege o patrimônio de clientes que investem até R$ 250 mil, caso o banco ou instituição financeira quebre. Para o investidor pessoa física que vai investir até esse valor e quer se arriscar um pouco mais, em troca de uma rentabilidade maior, o CDB pode ser interessante. As taxas variam segundo a qualidade do banco emissor e o prazo de vencimento. Hoje há taxas no mercado em torno de 10% a 11% para prazos de três a cinco anos de investimentos.
  • LCI e LCA: assim como o CDB, são títulos de crédito privado emitidos por instituições financeiras e com cobertura do FGC. A diferença é que o banco precisa usar o dinheiro do investidor para financiamentos de setores específicos: imobiliário, no caso da LCI, e agropecuário, no caso da LCA. Também é isento de IR para pessoa física. Hoje, os dois têm taxas que vão de 104% a 107% do CDI. Há LCIs e LCAs prefixadas com taxas de 8% a 9%, conforme o prazo, que vai de três a sete anos. "Entre LCI e CDB do mesmo emissor, avalie a rentabilidade para tomar a decisão, levando em consideração o IR", recomenda o especialista.
  • Debêntures: título privado emitido por empresas, não é protegido pelo FGC. A rentabilidade depende da nota de crédito da empresa emissora e do vencimento da debênture. Em termos de rentabilidade, uma boa debênture está pagando próximo ao que paga o Tesouro IPCA ou um pouco acima. A vantagem está no incentivo fiscal. As debêntures mais distribuídas no mercado são de setores incentivados, que têm isenção de Imposto de Renda para pessoa física. Dentro de uma carteira conservadora, é uma oportunidade para assumir um pouco mais de risco, em troca de uma rentabilidade melhor e com incentivo fiscal. Para o investidor que quer pulverizar melhor esse risco, há os fundos de debêntures incentivadas, com valores a partir de R$ 1.000. "Para quem quer uma proteção inflacionária numa visão de longo prazo e busca uma rentabilidade um pouco melhor, as debentures compõem esse papel na carteira. Também vale para quem quer fluxo de pagamento recorrente, já quem tem muita debênture que paga juros semestralmente", diz Mehanna.
Topo