Ganhos com contratos futuros

Você pode ganhar dinheiro com boi, soja e etanol mesmo sem ser produtor, mas atenção aos riscos

Colaboração para o UOL, de São Paulo Suwaree Tangbovornpichet/iStock

Puxada pela recuperação da economia global após o choque da pandemia, a valorização das commodities seduz investidores interessados em ganhar dinheiro rápido operando contratos de produtos agrícolas.

Aqui, lucra não só quem aproveita o mercado em alta, mas também quem consegue antecipar viradas de ciclos, quando os preços mudam de direção. No entanto, como tudo que oferece potencial de ganhos rápidos, envolve riscos proporcionais e é preciso ter muito cuidado nesse tipo de operação.

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Fabiana Amaro Traina, coordenadora de mesa da Terra Investimentos

Instrumento serve para proteção e especulação de preços

Como acontece no cotidiano dos negócios, vendedores e compradores negociam condições e preços pelos quais um produto será vendido no futuro. Quando padronizado - ou seja, quando estão definidas as características e quantidades do produto -, esse tipo de contrato é negociado no chamado mercado futuro e pode ser acessado por investidores tão facilmente quanto qualquer outro ativo da bolsa de valores.

Por meio dos contratos futuros, tanto ativos tradicionais de bolsa, como ações de empresas e moedas, quanto produtos comercializados fora dela, caso de commodities como boi, soja e etanol, têm seus preços pré-determinados para, como o nome sugere, uma data futura.

Assim como permite a um produtor agrícola assegurar o preço de venda da safra que ainda não foi colhida, esse instrumento está à disposição de quem busca ganhos rápidos e potencialmente extraordinários, apenas com as variações de preços dos ativos, mesmo sem detê-los fisicamente.

Se o investidor entende que a tendência é de valorização do produto, ele vai se posicionar como comprador. Se entender que o produto deve se desvalorizar, entra na ponta vendedora, podendo, da mesma forma, lucrar por ter assegurado um preço de venda mais caro do que a venda no futuro.

Em resumo, se a estratégia for bem-sucedida, é possível ganhar dinheiro no mercado futuro tanto na alta quanto na baixa dos ativos.

Os mercados futuros não possuem teto. O ganho pode ser bastante alto, assim como a perda.
Fabiana Amaro Traina, coordenadora de mesa da Terra Investimentos

Garantias dependem do risco

Diferente, por exemplo, do mercado de opções, onde o investidor paga um valor a mais para ter o direito de comprar ou vender futuramente determinado ativo a um preço pré-definido, o investimento em futuros depende apenas da apresentação de garantias.

Elas podem ser depositadas em dinheiro, mas também em ativos financeiros da carteira do investidor em renda fixa, como títulos públicos, e em variável, como ações. Não é necessário, portanto, sair de um investimento para colocar recursos em contratos futuros.

No cálculo da garantia exigida pela bolsa para a operação de futuros, leva-se em conta a volatilidade do ativo, bem como o tamanho da operação e prazo até o vencimento do contrato - enfim, o risco da transação. Quanto maior for a volatilidade do mercado, maior será a exigência de garantia.

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André Pauletto, associado à Planejar

Modelo permite ganhar, mas também perder muito

De qualquer forma, as garantias exigidas serão sempre uma pequena fração do valor total do contrato, o que faz a operação em futuros ser extremamente alavancada - ou seja, usa poucos recursos para um grande ganho, ou perda. O investidor, não raro, consegue acessar contratos que valem dez vezes mais do que os bens dados em garantia.

Daí vem a possibilidade de lucros extraordinários, mas também de prejuízos pesadíssimos, já que, dada a desproporcionalidade em relação às garantias, variações mesmo pequenas nos preços dos ativos se traduzem em mudanças abruptas nos resultados da operação.

O planejador financeiro André Pauletto, associado à Associação Brasileira de Planejamento Financeiro (Planejar), dá como exemplo uma operação de boi gordo. Se o investidor compra um contrato futuro de boi gordo para novembro, ele está se expondo à oscilação de mercado equivalente a 330 arrobas, peso do boi, negociadas, cada uma, a 329 reais.

A exposição total, nesse caso, é de R$ 108,6 mil, mas a B3 exige, digamos, o depósito de apenas R$ 9.000 como garantia.

Nesse exemplo, bastaria a arroba do boi gordo cair 10% para o prejuízo, de R$ 10,86 mil, ser superior às garantias inicialmente exigidas pela bolsa. Por outro lado, se, ao invés de cair, a arroba tiver valorização de 20%, o ganho será de R$ 21,7 mil, portanto mais do que o dobro em relação aos R$ 9 mil apresentados como garantia.

O risco pode ser de perda de todo o valor utilizado como garantia.
André Pauletto, planejador financeiro

Quanto mais líquido for o ativo e menor for seu risco, maior será o valor atribuído à garantia. Títulos públicos, de alta liquidez e baixo risco de crédito, apresentam valor maior atribuído em garantia do que ações, que possuem maior risco e muitas vezes podem apresentar problemas de liquidez.
Vitor Duarte, CIO da Suno Asset

Além de diversificação, é preciso muito estudo para entrar na posição. O investidor deve gerenciar periodicamente a exposição para ter certeza que possui margem suficiente para oferecer à corretora. Do contrário, pode perder toda a posição e ter um grande prejuízo financeiro, fora as multas e punições administrativas das corretoras.
Caio Parreira Leal, especialista em planejamento financeiro associado à Planejar

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Gustavo Cruz, estrategista da RB Investimentos

Perdas ilimitadas exigem gerenciamento de risco

O investidor que entra no mercado futuro como especulador - isto é, sem o propósito de buscar proteção de seu patrimônio como fazem os produtores rurais - não sabe quanto pode perder na operação.

Voltando à comparação anterior, se a perda de um negócio com opções é limitada ao valor pago por elas, nos futuros, o potencial de perda é desconhecido.

Por isso, é importante saber dosar a exposição e o investimento nesses ativos, de modo que seja compatível à sua tolerância a risco, assim como avaliar a adoção de travas de perdas, como o chamado stop loss, no qual o investidor programa o desmonte e fim da operação caso ela chegue a determinado prejuízo.

A depender das perdas acumuladas na operação ou do aumento da instabilidade do mercado, a bolsa poderá exigir novos depósitos de garantia, a famosa chamada de margem, que pode significar prejuízo ainda maior do que o previsto inicialmente pelo investidor.

No entanto, antes disso acontecer, em geral a posição será zerada pelo próprio departamento da corretora responsável por acompanhar a tomada de risco.

Recomendamos apenas que o perfil agressivo opere futuros, pois se trata de um mercado que exige grau maior de conhecimento, com a experiência de mercado contando bastante. O que não deveria ocorrer é um investidor possuir quase a totalidade de seu patrimônio nesse tipo de operação.
Gustavo Cruz, estrategista da RB Investimentos

O ideal é estudar o mercado antes de iniciar uma posição, analisar os dados históricos, e contar com um bom assessor. É muito recomendável usar um stop loss sempre. São muitos fatores externos que influenciam o mercado de commodities. Portanto, às vezes as oscilações são agressivas.
Fabiana Amaro Traina, coordenadora de mesa da Terra Investimentos

É imprescindível também realizar testes de estresse no patrimônio para determinar as implicações que as operações no mercado futuro podem ter na carteira. O investidor deve esboçar os impactos que possam ser sofridos em decorrência de mudanças nos preços e cenário econômico, analisando desde as conjunturas mais prováveis e equilibradas até as mais desafiadoras.
Vitor Duarte, CIO da Suno Asset

Investidor precisa ter apetite alto por risco para operar

Operar no mercado futuro não é para qualquer tipo de investidor. Além do risco envolvido, para ter sucesso na operação é preciso ter boa leitura de diversas variáveis que rodeiam o ativo em questão - das mudanças de clima à geopolítica, passando por particularidades como o risco de pragas em lavouras, quando o investimento é em uma commodity agrícola.

O mapeamento do padrão de comportamento de preços, a análise gráfica, também é um aliado na identificação de tendências - de queda ou de alta.

Certas commodities, sobretudo de prazos mais curtos, são facilmente negociadas no Brasil, como boi gordo, milho e etanol. No entanto, outras, como açúcar e soja, têm baixa liquidez local e baixa velocidade de compra ou vendam, obrigando o interessado a fazer o investimento por meio de corretoras que operam em bolsas internacionais, o que aumenta a dificuldade do investimento.

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Vitor Duarte, CIO da Suno Asset

É necessário estudar muito

Como as ferramentas de análise são dominadas por poucos, é recomendável estudar muito e buscar o apoio de especialistas e assessores de investimento antes de entrar nesse tipo de operação, ainda que nunca exista garantia de sucesso no mercado financeiro.

Só é possível operar esses contratos se o investidor tiver cadastro de perfil agressivo na corretora. Do contrário, é preciso assinar um termo de ciência de risco de operações de bolsas e derivativos.

Porém, uma vez habilitado - e, claro, com as garantias disponíveis - o investidor não tem dificuldade em montar a posição de sua carteira. Basta inserir o código do contrato, o chamado ticker, na plataforma de negociação, definir em qual ponta estará na operação - compra ou venda - e confirmar a ordem.

O código, como pode ser visto abaixo no caso dos futuros agrícolas, é composto por três letras que representam o ativo do contrato, seguidas pela letra do mês de vencimento e pelos dois últimos algarismos do ano.

Código do ativo

  • Café Arábica - ICF
  • Boi Gordo - BGI
  • Milho - CCM
  • Soja - SOJ
  • Etanol - ETN

Vencimentos

Por exemplo, o código do boi gordo com vencimento em novembro de 2021 ficaria assim: BGIX21.

  • Janeiro - F
  • Fevereiro - G
  • Março - H
  • Abril - J
  • Maio - K
  • Junho - M
  • Julho - N
  • Agosto - Q
  • Setembro - U
  • Outubro - V
  • Novembro - X
  • Dezembro - Z
Por exemplo, o código do boi gordo com vencimento em novembro de 2021 ficaria assim: BGIX21.

As variáveis que influenciam na oferta e demanda de uma commodity vão afetar diretamente seu preço. Portanto, é importante observar todo o contexto, desde riscos climáticos, que afetarão a produtividade das safras, e problemas sanitários a custos de insumos, demanda interna e externa.

André Pauletto, Planejador financeiro

O ideal é possui uma posição restrita, pequena em relação ao percentual da carteira, e, para alguns casos, utilizar stop loss especialmente se você estiver vendido, dado que a perda máxima é infinita.

Caio Parreira Leal, Especialista em planejamento financeiro associado à Planejar

É recomendado também, para gestão do risco, que o investidor determine uma exposição de sua carteira a operações alavancadas como essas a um nível máximo de, por exemplo, 10% de seu portfólio.

Vitor Duarte, CIO da Suno Asset

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