A reforma e os FIIs

Fundos imobiliários podem sair da reforma tributária ainda mais lucrativos, dizem especialistas

Raphael Coraccini Colaboração para o UOL, em São Paulo Getty Images/iStockphoto/Zephyr18

A proposta do governo de taxar os dividendos distribuídos pelos fundos de investimento imobiliário causou uma correria no mercado, no final de junho, na direção contrária aos FIIs. O IFix, índice da B3 que mede o desempenho desses fundos, chegou a cair 3% no dia seguinte à apresentação da proposta.

Em menos de dois dias, porém, alguns fundos já haviam recuperado seu valor, o que mostrou que o desânimo do mercado com essas opções não era definitivo.

O relatório do deputado federal Celso Sabino sobre o projeto ajudou a recuperar a animação dos investidores com a perspectiva de garantir a isenção dos dividendos e ainda manter uma redução na tributação sobre ganhos de capital.

Analistas ouvidos pelo UOL apontam que as mudanças propostas pelo relator do projeto na Câmara podem deixar os investimentos ainda mais lucrativos, mas há algum receio ainda com relação a eventuais mudanças no texto final.

"A gente não pode ter certeza de nada em relação ao Congresso", diz Caio Braz, sócio da Urca Capital Partners, assessoria especializada em gestão de recursos.

A votação está travada na Câmara por causa, principalmente, dos impactos que a redução do Imposto de Renda para Pessoa Jurídica traria sobre o orçamento público.

Entenda o que está se desenhando no cenário político e como as decisões do governo e do Congresso podem impactar a rentabilidade dos fundos imobiliários.

Como se ganha dinheiro como um fundo imobiliário

Os fundos imobiliários são investimentos em renda variável que servem para captação de recursos por construtoras e incorporadoras junto a investidores de pequeno, médio e grande porte. O mercado divide hoje os FIIs em três segmentos: fundos de papéis, de tijolos e fundos de fundos.

Os fundos de tijolos compram imóveis prontos e lucram sobre a comercialização deles ou sobre o pagamento de aluguéis. Os fundos de papéis são classificados como investimentos em renda fixa e tratam da emissão de um título de crédito lastreado em um negócio imobiliário.

O cotista de um FII tem duas possibilidades de lucrar. A principal delas é pelo ganho com dividendos das operações do fundo. Isso quer dizer que, se o fundo aluga ou vende um imóvel, ele paga as despesas e o que sobra é o lucro do fundo, que é distribuído entre os cotistas. A distribuição disso costuma ser mensal e não está sujeita a nenhuma tributação.

Outra maneira de ganhar dinheiro com os fundos imobiliários é comprar e vender cotas como se fossem ações. Porém, essas operações, diferentemente dos dividendos, são tributadas na fonte. Atualmente, a tributação é de 20%.

Normalmente, os fundos imobiliários são um instrumento feito para ganho passivo de renda. Você põe o dinheiro e fica recebendo os dividendos mensalmente. Dá para comparar com os proventos relacionados a um imóvel próprio, que você compra e recebe aluguéis periodicamente do locatário.
Matheus Bueno, advogado especialista em direito tributário e mercado imobiliário

Anatoliy Sizov/iStock
Fundos imobiliários têm benefícios em relação à tributação que outros fundos não têm

Como funciona hoje a tributação para investimentos em FIIs?

Nos fundos em geral, o investidor só paga imposto na hora em que seu dinheiro chega ao bolso. Mas os fundos imobiliários têm benefícios em relação à tributação que outros fundos não têm, como explica Matheus Bueno, advogado especializado em direito tributário e mercado imobiliário.

Se tiver 50 cotistas ou mais e distribuir 95% do seu resultado, o fundo imobiliário tem direito a isenção de imposto na distribuição dos dividendos. Só existe tributação quando o cotista vende sua participação no fundo para obter ganho de capital, aproveitando a valorização das cotas do FII.

O texto de reforma tributária do relator na Câmara, o deputado Celso Sabino (PSDB-PA), foi bem recebido pelos investidores de FIIs, revertendo o desânimo depois da proposta do governo.

Veja quais são as mudanças possíveis nos FIIs:

Texto do governo

  • Tributação de IR sobre dividendos de fundos imobiliários sobe de 0 para 15%
  • Redução da tributação de IR cobrado sobre os ganhos das cotas dos fundos imobiliário de 20% para 15%.

Texto do relator

  • Mantém a proposta de redução da tributação de IR sobre ganhos de capital
  • Extingue a proposta de tributação dos dividendos, que se mantêm não tributáveis

No cenário atual, o rendimento é isento. Mas, ao vender as cotas do FII, o investidor não está recebendo dinheiro do fundo, e, sim, de quem comprou as cotas. Nesses casos, existe uma afetação sobre o que a gente chama de ganho de capital.

Matheus Bueno, advogado especializado em direito tributário e mercado imobiliário

Sitthiphong/iStock
Guedes propôs taxação de 15% sobre dividendos, mas proposta foi retirada do texto

Como a reforma tributária pode afetar os dividendos?

O texto apresentado pelo relator do projeto da reforma tributária na Câmara dos Deputados, Celso Sabino (PSDB-PA), tem como principal ponto relacionado aos FIIs a manutenção da isenção de imposto sobre os dividendos recebidos pelos cotistas de fundos imobiliários.

O projeto original da reforma, apresentado pelo ministro da Economia Paulo Guedes, propunha uma taxação de 15% sobre os dividendos. Essa proposta foi retirada do texto do relator, e essa mudança deve ser aceita pelo governo.

Sérgio Belleza, consultor de investimentos e especialista no mercado imobiliário, destaca que, se o projeto atual for aprovado, portanto, os dividendos pagos pelos fundos imobiliários aos seus cotistas seguem sem taxação.

"Para quem investe em FIIs, o texto atual não muda nada. Continua com isenção na distribuição de rendimento nessas condições, de pessoa física que detenha até 10% das cotas do fundo", diz ele.

No projeto encaminhado pelo Ministério da Economia, a proposta era a de reduzir a taxação em operações de vendas de cotas dos fundos imobiliários, o que foi mantido no texto do relator encaminhado à presidência da Câmara.

Portanto, a proposta atual se mostra benéfica aos investidores de fundos imobiliários porque, além de garantir a isenção de impostos sobre dividendos, reduz a taxação sobre ganhos de capital de 20% para 15%.

Existem muitos fundos de fundos que se beneficiariam bastante disso porque faz parte da estratégia deles auferir ganho de capital com outras cotas de fundos. Isso alavancaria bastante a rentabilidade.

Caio Braz, Sócio da Urca Capital Partners

A redução de 20% para 15% (sobre ganho de capital) seria adequada porque é o que o mercado de renda variável pratica, e os FIIs são renda variável

Sérgio Belleza, Consultor e especialista em mercado imobiliário

Tenho FIIs; o que devo fazer diante da proposta de reforma tributária?

Para Caio Braz, os FIIs estão em processo de recuperação da rentabilidade depois da queda que sucedeu a apresentação do projeto da reforma tributária pelo governo. Isso indica que a melhor opção é manter as cotas de FII na carteira.

O investidor que detém cotas, segundo Braz, não deve se animar demasiadamente com a possibilidade de obter ganhos de capital maiores com a redução da tributação.

O mais indicado é continuar visando pagamentos de dividendos porque, pare ele, o investidor pequeno e médio, tende a ter apenas "ganhos marginais" com a venda de cotas, que deve beneficiar principalmente grandes investidores.

Em geral, investidor de fundo imobiliário não deveria buscar ganho de capital, deveria buscar renda. Existem algumas exceções relacionadas a fundos que vão focar no grande capital no mercado imobiliário, mas esse não deve ser o foco principal do público dos FIIs.
Caio Braz, sócio da Urca Capital Partners

O índice IFix, que mede o desempenho de fundos imobiliários na B3, sofreu uma queda considerável depois da apresentação do projeto do governo. Para Braz, aquele momento breve de pânico no mercado significou uma boa oportunidade para comprar FIIs na baixa.

Braz afirma que em geral, em momentos de irracionalidade, os bons ativos acabam se desvalorizando sem nenhum motivo aparente, como foi o caso, e abrem uma oportunidade de compra. Para o analista, a baixa histórica do índice já foi recuperada, mas o preço ainda está favorável para quem quer comprar.

Essa oportunidade de comprar FIIs muito mais baratos passou um pouco porque os fundos caíram, mas alguns deles já se recuperaram. Mas se você está procurando um ativo de longo prazo que é bom, como esses fundos, ainda é o momento para comprá-los mais baratos.

Caio Braz, Sócio da Urca Capital Partners

Caso haja a tributação, os FIIs deixam de ser interessantes?

Os fundos imobiliários, antes de 2005, operavam com uma tributação maior do que a proposta de taxação apresentada pelo governo. Havia alíquotas de 20% sobre os dividendos e sobre o ganho de capital, o que tornava o investimento menos interessante do que viria a ser, mas nunca significou um mau investimento. Algo semelhante pode ser dito na hipótese pouco provável de haver nova tributação.

Com uma taxação de 15% sobre os dividendos, os FIIs "certamente perdem rentabilidade", diz Matheus Bueno. "Em tese, reduz a atratividade deles e, com menor demanda, haveria menos fundos disponíveis, menos dinheiro para o setor imobiliário e falta de incentivo para essa parte da economia", completa o advogado.

Ainda que a rentabilidade desse tipo de investimento caísse, ela não seria desprezível, diz Caio Braz. Para ele, uma eventual taxação não aconteceria da noite para o dia e os fundos imobiliários teriam capacidade de arrumar uma saída para continuar sendo um bom investimento. "Os fundos não se tornariam ruins apenas pela taxação", avalia Braz.

Para ele, num cenário de tributação de 15%, os fundos imobiliários ainda seriam boas opções levando em conta as características do investimento e a perspectiva de recuperação econômica do mercado.

"Os FIIs são bons investimentos para quem busca uma renda estável e protegida da inflação, essa é a principal justificativa para investir em fundos imobiliários", diz o especialista.

Topo