Investir em cannabis?

Fundos temáticos têm produtos exóticos para investir, como cannabis ou urânio, dentro da lei

Paula Pacheco Colaboração para o UOL, em São Paulo Robson Ventura/Folhapress

Cannabis? Água? Urânio? Produtos para millennials? Sim, estas são algumas das alternativas mais recentes de investimentos para os brasileiros. O crescimento da oferta de produtos temáticos abre novas possibilidades de ganhos para os investidores. Mas como saber até que ponto as novidades têm bons fundamentos e representam oportunidade de ganho ou se são ondas que podem deixar frustrações?

Analistas ouvidos pelo UOL explicam como saber se essas novidades são seguras, quanto se deve aderir para "surfar a onda" e qual é o momento de se desfazer de um ativo que ainda está sob o impacto novidadeiro.

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Para os gestores, o desafio ao estruturar fundos temáticos é monitorar grandes tendências

Novidades na Bolsa

As opções temáticas têm aumentado à medida que o mercado financeiro tem mostrado mais amadurecimento. A onda de lançamentos também está relacionada ao aumento do interesse pela renda variável, no Brasil e no exterior, como alternativa para quem busca maior retorno em tempos de juros em patamares mais baixos.

Uma forma de acessar os novos produtos são os ETFs (Exchange Traded Fund), ou fundos de índice. São ativos negociados na B3 em que o investidor aplica em diferentes empresas ou em um índice. Por exemplo, o Ibovespa ou S&P 500.

Para os gestores, o desafio ao estruturar fundos temáticos é monitorar grandes tendências (internacionais e locais) e seus impactos em setores que compõem esses produtos, tanto do ponto de vista dos megainvestidores quanto no dia a dia da economia.

Cannabis e urânio

Com R$ 100 de valor inicial, é possível se tornar investidor na indústria de cannabis (a planta a partir da qual se produz maconha). O investimento é feito legalmente, por meio da aquisição de ETFs.

Em alta em mercados como o americano, o setor tem avançado principalmente graças aos avanços na biomedicina e à legalização de diferentes formas de consumo.

Em 2020, a indústria movimentou US$ 21 bilhões, uma alta de 48% em relação ao ano anterior. A projeção da consultoria especializada BDSA aponta para um faturamento de US$ 55,9 bilhões em 2026.

Alternativas no setor de energia também estão no radar. Um exemplo é o urânio, um mineral escasso e principal matéria-prima da energia nuclear.

O investimento em empresas globais dessa indústria -mineração, refino, fornecedoras de equipamentos para essas atividades- está disponível por meio de ETFs, com aporte inicial a partir de R$ 100.

Classificado como investimento de risco, sua rentabilidade chegou a 33,24% no ano (até 06/09).

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ESG: É possível encontrar aportes a partir de R$ 1

Sustentabilidade com lucro

É o caso de fundos baseados no ESG (sigla em inglês para definir a incorporação do conceito social, ambiental e de governança à estratégia das empresas). Tendência cada vez mais relevante para os grandes investidores, nacionais e internacionais, o ESG tem pautado também os estruturadores de produtos financeiros.

A oferta de produtos atrelados ao ESG é crescente e com diferentes composições. É possível encontrar aportes a partir de R$ 1, fundos com diversificação de países e de empresas.

Outro exemplo de estruturação de fundos temáticos vem do setor de tecnologia. Hoje, os investidores brasileiros já encontram desde fundos compostos por ações de empresas de robótica até ETFs que replicam o indicador S&P/B3 Ingenius Index, composto por empresas do mundo todo e de segmentos como comércio eletrônico, mídia e tecnologia, com valor inicial a partir de R$ 10.

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Roupa nova e Seu Jorge

Outros dois lançamentos recentes confirmam que a onda dos investimentos temáticos está apenas no começo. Em 31 de agosto, foi anunciado o início dos negócios com ações de empresas internacionais de biotechs. O produto foi estruturado de olho nos desenvolvimentos da indústria de biotecnologia, em particular depois da pandemia.

Dias antes, foi lançado um produto ainda mais inusitado. Ligado à indústria do entretenimento, o Fundo de Investimento em Direitos Creditórios (FIDC NP) foi estruturado para investir na compra de shows de um grupo de artistas brasileiros. A captação inicial chegou a R$ 260 milhões e a primeira fase tem nomes como Roupa Nova, Daniel e Mauricio Manieri e Seu Jorge.

Nesse fundo, foi adquirido o direito de exploração do show dos artistas e a possibilidade de complementar as receitas com serviços de bar e patrocínios.

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Bia Moraes, educadora financeira da Ativa Investimentos

De olho nos riscos

Como em qualquer outro tipo de ativo, o investidor precisa se cercar de cuidados antes de colocar seus recursos em um produto temático. Não basta ter afinidade com a área. É preciso buscar informações sobre o tema e levar em consideração que, como ainda são, em muitos casos, assuntos novos do ponto de vista do mercado de capitais, acompanhar o seu comportamento pode não ser tão simples.

Entenda quem está oferecendo esse tipo de investimento, se é uma casa séria e se os produtos são regulados. Procure saber a opinião do gestor que está estudando o mercado, ainda mais quando estamos tratando de fundos pouco falados.
Bia Moraes, educadora financeira da Ativa Investimentos

Romero Oliveira, assessor de investimentos da Valor Investimentos, tem duas recomendações. A primeira delas é conversar com um especialista antes de decidir por um produto financeiro temático. A segunda dica é quanto ao valor que deve ser destinado.

Invariavelmente deve ser uma parcela pequena da carteira, de 2% a 3% do portfólio total). É um percentual que, caso haja uma grande valorização, não vai te deixar mais rico. Se acontecer o movimento contrário, as perdas não vão incomodar tanto. É importante avaliar qual é o seu apetite por riscos.
Romero Oliveira

Bia Moraes afirma que o percentual ideal deve ser definido segundo o perfil de risco. A especialista lembra que esses são fundos que sofrem mais com a volatilidade, por isso ela recomenda que mesmo para quem tem um perfil mais agressivo a exposição não ultrapasse os 5% da carteira.

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Roberto Agi, porta-voz da Alta Vista Investimentos

Exposição a mercados internacionais

Ao optar por fundos temáticos, o investidor tem a oportunidade de pulverizar seus aportes em diferentes mercados internacionais, diminuindo o peso do rico político e monetário nacional, além de chegar a produtos estrangeiros sem ter de abrir uma conta no exterior e aumentar as chances de ganho ao ter acesso a empresas globais.

No entanto, ao contrário dos fundos tradicionais, que levam em consideração aspectos atuais de uma empresa (como tamanho e liquidez do papel) na hora de projetar sua valorização no curto e no médio prazo, quando se trata de um produto temático o que se observa é a relevância desses temas no futuro - que pode ser a descoberta de um remédio para tratar a covid ou a solução para as emissões de CO2, ou seja, sem data para acontecer.

Assessor de investimentos da Valor Investimentos, Romero Oliveira lembra que essas características dos produtos temáticos os tornam mais atraentes para quem tem um perfil mais agressivo e não se incomoda com uma maior volatilidade. Dependendo das características, pode ser a oportunidade de até pulverizar os riscos ao ter parte do patrimônio ancorado em ativos no exterior.

A recomendação de Roberto Agi, porta-voz da Alta Vista Investimentos, vai na mesma direção. O investidor, ao decidir por fundos temáticos, ou não óbvios, como os que são atrelados ao carbono, cannabis ou saúde, deve levar em consideração a importância de não estarem correlacionados a ativos nos quais já há aportes. Além disso, diz, é preciso cuidado para não aderir apenas porque estão em alta.

Se forem fundos negociados no mercado internacional, o investidor tem a oportunidade de ficar menos exposto ao risco Brasil e, por outro lado, estar mais exposto a teses que talvez estejam melhor posicionadas num momento de retomada da economia.

Romero Oliveira, Assessor de investimentos da Valor Investimentos

Mesmo que os fundos temáticos se mostrem promissores, não devem atrair compradores apenas pela euforia e um comportamento pontual de alta. Entrar na fase do oba-oba, no ciclo de alta, e depois ver os ativos perderem valor pode gerar uma grande frustração.

Roberto Agi, Porta-voz da Alta Vista Investimentos

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