Quando comprar dólar?

Dólar muda até com espirro do presidente e é difícil prever data para comprar, diz CEO da corretora Confidence

Beth Matias Colaboração para o UOL, de São Paulo
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Ana Tena, CEO da corretora e banco Travelex Confidence, diz em entrevista exclusiva na série UOL Líderes que não é possível prever a melhor data para comprar dólar. Com variações constantes, o dólar no Brasil oscila "até com o espirro do presidente", brinca a CEO.

Na entrevista, a executiva dá algumas dicas para quem precisa transferir dinheiro ao exterior ou viajar para vários países com moedas diferentes. Ela revela que ainda existem "travellers cheques" (cheques de viagem) esquecidos em cofres de famílias e que podem ser descontados.

À frente de uma das maiores corretoras do país, a CEO fala sobre o preconceito contra as mulheres no mercado financeiro e a importância de as empresas darem oportunidades de gênero iguais.

Ouça a íntegra da entrevista com Ana Tena, CEO da corretora Travelex Confidence, no podcast UOL Líderes, abaixo. Também pode assistir à entrevista em vídeo no canal do UOL no YouTube.

Câmbio difícil de prever

UOL - Qual é melhor forma de conseguir uma cotação mais baixa na hora de comprar uma moeda para usar no exterior?

Ana Tena - Brincamos que no Brasil um economista pode perder o seu cargo ao falar do valor do câmbio. São tantas variáveis que qualquer espirro do presidente causa oscilação.

O interessado deve acompanhar a cotação da moeda, mas deve fazer um preço médio. Tivemos 30% de desvalorização neste ano. O melhor aqui no Brasil realmente é fazer uma compra espaçada que assegure um valor médio [comprar um pouco de dólar por vez para não pagar a cotação no pico].

Por que houve essa desvalorização tão acentuada do real?

Tivemos vários fatores, mas nem os economistas no Brasil conseguem responder a essa pergunta. Basicamente temos procura e oferta da moeda. A procura está maior porque não há segurança para investir e a rentabilidade está baixa. Daí a desvalorização vem.

Aumentou a especulação?

Ainda mais agora. Houve um grande avanço com a regulamentação de Banco Central em relação às contas no exterior. Não há problema em ter uma conta no exterior desde que esteja registrada e seja declarada.

O fato é que pessoas que passaram a sua vida inteira fazendo o seu fundo de pensão para viver com essa renda, quando percebem que esse dinheiro não está sendo mais suficiente para manter o padrão de vida, buscam essa rentabilidade em outros países.

E as remessas internacionais aumentaram?

Não só remessas internacionais de pessoas físicas e pessoas jurídicas, mas também do e-commerce, de produtos ou de serviços. São pessoas que compram música ou uma aula de japonês online e precisam transferir, por exemplo, ienes, para efetuar o pagamento.

A Travelex Confidence é assim

  • Fundação

    1996 (corretora); 2010 (banco)

  • Funcionários

    700 (grupo)

  • Países em que está presente

    60

  • Tipos de moeda estrangeira que comercializa

    20

  • Unidades (Brasil)

    110 (grupo)

  • Clientes

    6,1 milhões (grupo)

  • Faturamento (2020)

    R$ 44 bilhões (grupo)

  • Concorrentes

    Bancos e fintechs que operam com câmbio

  • Diversidade (Brasil)

    61% dos funcionários são mulheres; 51% dos líderes são mulheres.

Sobe-e-desce é a nova regra

UOL - A instabilidade da Bolsa e essas incertezas em relação ao câmbio devem continuar depois da pandemia?

Ana Tena - Como país emergente, com grande déficit fiscal, com uma política ainda não bem definida, sempre teremos volatilidade [sobe-e-desce de cotações].

As guerras comerciais geram volatilidade em todos os mercados, mas principalmente nos emergentes.

Essa é a nova regra e esse ambiente volátil veio para ficar. Ele só está cada vez mais acirrado e em modificação constante. O longo prazo agora é de três anos.

Muitos empresários apoiaram a eleição do presidente Jair Bolsonaro. O governo está dentro do esperado?

Evidente que não está, porque o mundo não está dentro do esperado. Os projetos eram apoiados pela iniciativa privada -privatização, desburocratização. Esses foram os projetos, mas o mundo mudou também. Temos críticas porque o que a gente esperava não está acontecendo.

Agora, não é também totalmente sem razão. Estamos enfrentando coisas que não estavam previstas. Mas temos que pensar para frente, em como levar esse Brasil para frente. Reclamar não muda.

É muito fácil ficar sempre reclamando e não propor efetivamente mudanças que comecem no segmento privado.

Como vocês enfrentaram as dificuldades do setor turístico?

Na parte de turismo, fomos totalmente afetados. Tivemos renegociação com todos os nossos fornecedores e com todas as empresas de varejo, mas conseguimos manter as receitas na ordem de 50% do faturamento pré-pandemia.

Melhor comprar sempre dólar ou a moeda local do país de destino?

UOL - Ainda há negociações com travellers checks?

Ana Tena - Há quem ainda tenha os travellers checks [cheques de viagem usados antes do cartão de crédito internacional e cartões pré-pagos; os cheques valiam uma quantia determinada e eram trocados pela moeda local do país].

São pessoas que fizeram uma poupança com eles e guardaram em seus cofres. Alguns guias de viagem também recebem de operadoras de turismo internacionais cheques avulsos, enviados pelos Correios.

Não é um mercado que cresce, mas é um mercado que ainda existe.

O que é melhor: transferência cambial ou a compra de papel-moeda?

Fazer uma transferência é sempre mais barato do que comprar o papel-moeda. Isso porque o papel tem um custo de importação.

Quando for viajar para países diferentes, é melhor comprar dólares/euros e trocar localmente ou comprar diretamente as moedas que for usar?

O melhor é sempre tentar comprar a moeda do local para onde você vai viajar. Caso contrário, você fará dois câmbios e terá muito deságio.

Lá fora, os spreads [diferença entre o preço de compra e venda] são muito mais altos do que aqui no Brasil. Quando você faz uma troca no exterior, os spreads chegam a 18%.

Qual é o perfil do brasileiro? Gosta mais do papel-moeda ou dos cartões?

Com a taxa de 6% nos cartões de crédito, o papel-moeda é o preferido. Principalmente como segurança em caso de o cartão dar algum problema ou em regiões onde não há uma rede de internet.

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Temos que pensar para frente, em como levar esse Brasil para frente. Reclamar não muda. É muito fácil ficar sempre reclamando e não propor efetivamente mudanças.

Ana Tena, CEO da corretora e banco Travelex Confidence

Processos de seleção precisam ter 50% de mulheres

UOL - Os perfis de investimento de homens e mulheres são diferentes?

Ana Tena - Em sua maioria sim, porque as mulheres vêm de um tempo em que não estavam acostumadas a se proteger, a se planejar, elas delegavam isso aos homens. Mas isso vem mudando. As nossas filhas não são mais iguais a nós, têm a necessidade de independência, de não querer depender de ninguém.

Há apenas 26% de mulheres investindo na Bolsa. Como incentivá-las?

A pauta é educação financeira, falando abertamente tanto de oportunidades como de riscos para que as pessoas possam entrar nesse mercado.

Ainda há muito preconceito em relação às mulheres nesse mercado?

Não só neste mercado. Na empresa, temos quase 800 funcionários, e 61% são mulheres. Na área gerencial somos 51%, mas o preconceito sempre existe.

Minha filha é loira e quando foi procurar emprego em um grande banco na área de finanças, perguntaram se ela não preferia marketing.

Preconceito é um fato e é por isso que falamos dele, para que seja lembrado e modificado. Se houvesse equidade e imparcialidade, não estaríamos discutindo diversidade.

Que dicas a senhora daria para outras empresas que querem aumentar a participação da mulher no mercado de trabalho?

É preciso forçar a entrada. Precisamos tentar trazer pelo menos metade dos currículos de mulheres. E que não seja enviesado. Se você tem a maioria de homens e a escolha é por indicação, você sempre vai trazer mais homens. Precisamos ter oportunidades de acesso iguais.

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