Pix revela tudo

Com Pix, bancos conhecem os seus hábitos de consumo, e isso vale ouro, diz fornecedor de parte da tecnologia

Beth Mathias Colaboração para o UOL, em São Paulo Divulgação
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Gilson Magalhães, presidente da Red Hat Brasil, empresa fornecedora de parte da tecnologia do Pix, diz em entrevista exclusiva na série UOL Líderes que, com a nova tecnologia, a informação vale ouro, pois os bancos têm acesso aos hábitos de consumo de seus clientes.

Ele conta que o Pix é uma tecnologia usada há algum tempo, mas em poucos países ela é coordenada pelo Banco Central, como é o caso do Brasil.

O executivo afirma que a tecnologia do Pix é segura e confiável e os problemas que aconteceram até agora são de menor porte, mas faz um alerta: as pessoas devem proteger seus dados e prestar atenção às permissões de acesso a informações quando fazem transações no mundo digital.

Magalhães comenta também os problemas na educação brasileira e por que precisamos esperar para ter o 5G com segurança.

Ouça a íntegra da entrevista com Gilson Magalhães, presidente da Red Hat, no podcast UOL Líderes. Também pode assistir à entrevista em vídeo no canal do UOL no YouTube. Continue nesta página para ler os destaques da conversa.

De olho nos dados das pessoas

UOL - Qual é o negócio da Red Hat?

Gilson Magalhães - Somos uma das mais importantes tecnologias do planeta. Vendemos um software que, em tese, é grátis.

Mas como vocês monetizam o negócio vendendo um produto grátis?

Criamos um software que tem suporte 24 horas e 7 dias por semana. Damos manutenção preventiva, corrigimos erros em tempo recorde e garantimos que o software fique conectado o tempo todo.

Quais são os projetos que vocês têm hoje no Brasil e o que pode destacar?

Estamos praticamente em todas as indústrias, na maioria dos bancos, em muitos projetos do governo, entre eles, a tecnologia do Pix.

Essa tecnologia foi criada do zero ou foi inspirada em alguma outra?

Ela é inspirada em outras tecnologias e faz parte de um debate da própria indústria financeira, que é o pagamento instantâneo. Isso para um país como o nosso é sensacional porque há um índice de não bancarizados muito elevado.

Com o Pix, respeitando as leis de proteção, o banco tem acesso às informações de consumo, hábitos das pessoas. Esses dados podem ser usados, de forma regulada, para determinar novos negócios, [revelar] as praças mais aquecidas para um determinado tipo de demanda. A informação vira ouro.

A Red Hat é assim

  • Fundação

    1993 (mundo) 2006 (Brasil)

  • Funcionários

    Mais de 17 mil (mundo) 450 (Brasil)

  • Presença no mundo

    35 países

  • Escritórios

    90 (mundo) 4 (Brasil)

Pagamento será digital, do vendedor de coco ao mendigo

UOL - Como funciona a tecnologia do Pix?

Gilson Magalhães - O Banco Central resolveu entrar no negócio de meios de pagamento e levar uma alternativa para o cidadão brasileiro de baixíssimo custo. O processo é rápido e seguro.

O potencial dessa tecnologia é extraordinário. Em breve, iremos à praia e o vendedor de coco terá apenas um QR Code. O pagamento será transferido automaticamente sem que seja necessário levar dinheiro à praia. Na China, há a possibilidade de um mendigo usar o QR Code para receber esmola.

Há outros países que utilizam a tecnologia do Pix?

O Pix é uma tecnologia usada há algum tempo, mas patrocinada por um Banco Central e gerenciada desta forma são poucos países do mundo. Nós, de fato, estamos à frente.

É um sistema seguro? Há relatos de problemas enfrentados nesse início de operação.

No Banco Central, o sistema é absolutamente seguro. A transação chega e é possível garantir que não houve duplicidade, mas, quando a mensagem vai para o agente [banco], pode haver algum tipo de problema técnico ou discrepância porque o modelo está em amadurecimento.

Os bancos estão aprendendo progressivamente, gerando novas versões, e aos poucos esses erros são reduzidos.

Auxílio emergencial levou mais de 23 milhões à bancarização

UOL - Como levar tecnologia a todo o país com realidades tão diferentes?

Gilson Magalhães - São os bancos que chegam até o cliente, mas aconteceu uma coisa muito interessante no ano passado. O "corona voucher" fez com que um contingente enorme de pessoas precisasse, de alguma forma, instalar o aplicativo ou mesmo se inscrever em uma agência para ter acesso.

A 'banquerização' do Brasil foi extraordinária, números mais ou menos apontam que mais de 23 milhões de pessoas passaram a ter acesso a uma conta. Avançamos em um ano coisa que não avançávamos nos últimos 15 anos. Ela é muito melhor do que carregar dinheiro.

"Corona voucher" seriam os auxílios emergenciais?

Exatamente. O auxílio emergencial que foi dado à população teve esse apelido.

Estamos caminhando para o fim do papel-moeda?

Não vai acabar tão cedo. É preciso uma geração inteira para desapegar da segurança que o papel-moeda gera. A nova geração, de 15 ou 16 anos, acredito que nem vai saber mais o que estará impresso no papel-moeda brasileiro porque não vai fazer sentido para eles. É o que indicam os números e o comportamento que temos visto.

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Em breve, iremos à praia e o vendedor de coco terá apenas um QR Code. O pagamento será transferido automaticamente sem que seja necessário levar dinheiro à praia.

Gilson Magalhães, presidente da Red Hat Brasil

Informação é mais importante que petróleo

UOL - O open banking, com toda a abertura de dados dos consumidores, não é prejudicial à segurança das pessoas?

Gilson Magalhães - A população precisa ser educada. A Lei de Proteção de Dados do Brasil é moderna, inteligente e, se aplicada, protege, mas precisa ser fiscalizada.

O mundo está vivendo um momento extraordinário do uso de tecnologia, mas arriscado. Ele é muito bom e é sem volta. O risco do mau uso dos dados existe e a recomendação é ter cuidado. É importante saber exatamente o que está cedendo para aquela empresa na internet, porque o dado é o tesouro do futuro e as pessoas não entendem quanto é precioso, é mais do que o petróleo jamais foi.

Com tantos problemas na educação básica brasileira, como educar a população para uma tecnologia tão avançada como a do Pix?

A tecnologia da informação deixou claro que irá transformar o futuro e nós precisamos liderar ou estaremos condenados a sermos liderados. Nunca foi tão grande o fosso digital. O novo currículo das crianças deve incluir lógica, programação de computação. O software passa a ser mandatório no currículo e no aprendizado das crianças.

5G desafia todas as estruturas de tecnologia

UOL - Como anda a implantação do 5G no país? Não estamos atrasados em relação ao resto do mundo?

Gilson Magalhães - Essa tecnologia exige trocar tudo o que temos. Ela desafia as estruturas porque a velocidade é muito alta e necessária uma infraestrutura para trafegar os dados compatíveis com o que virá do usuário.

Não é apenas uma ou duas vezes mais rápida do que a 4G, a escala é muito maior. Não é simplesmente substituir a antena. Com essa velocidade, a avenida para o carro autônomo, para a internet das coisas, para os sensores e o drones automáticos estará pronta. É uma questão de preparar essas pistas tecnológicas.

O Brasil até que está avançado, mas é preciso ter segurança. Imagine sensores captando tudo, saber por onde as pessoas circulam, em que lojas vão, quando vão. Se alguém tiver acesso a todas essas informações, terá o domínio sobre praticamente todas as indústrias.

Não acredito que estejamos atrasados. Há [no mundo] experimentos locais, em ambientes ou cidades. Não tenho notícia da predominância do 5G em algum lugar.

Não há politização?

Não creio. O debate necessário. São muitas questões, como as tecnológicas, regulatórias, de comportamento.

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