UOL - Durante a pandemia, houve alguma mudança no comportamento do consumidor?
Lupercio Fernandes de Moraes - É pouco tempo para avaliar esse tipo de comportamento. O que houve na pandemia foi uma mudança de canal de compra. O que era feito no varejo físico passou para o online. Mas a compra online, dependendo do segmento, como é o nosso caso, não compensa nem de longe as vendas.
Eu preciso do mundo físico porque a minha categoria está no inconsciente coletivo no mundo físico.
No Brasil, temos [um consumo de] 5,5 litros de sorvete per capita contra 20 litros nos Estados Unidos, 22 litros nos países nórdicos, 18 litros na Itália. É um mercado que ainda engatinha nos volumes. O sorvete no Brasil está muito vinculado à praia.
Nos últimos 15 anos, o consumo per capita saiu de 3,5 litros para 5,5 litros porque 30 milhões de pessoas saíram da classe D para C. O sorvete passou a entrar na cesta de consumo dessas famílias, assim como o creme de barbear, iogurte, até o segundo governo Lula [Luiz Inácio Lula da Silva, presidente de 2003 a 2011]. Depois disso, estagnou o consumo de sorvete no Brasil. O sorvete acaba sendo um luxo para a classe mais pobre.
Quais são as mudanças no comportamento do consumidor nos últimos anos?
Nestes últimos anos, fundamentalmente, o que vem mudando é o hábito de alimentação saudável. Há sinalizações, uma ainda embrionária, mas que a indústria está olhando, que é a questão do veganismo. Essa é uma questão mais conceitual, mas que acaba se tornando uma consequência alimentar.
Uma outra questão é a saudabilidade. O mercado alimentar vem evoluindo muito forte, até por uma questão regulatória, com mais informações nos rótulos.
A Rochinha possui esse conceito de saudável?
A Rochinha é uma empresa que tem 38 anos e sempre produziu picolés de fruta natural. Esse sempre foi o modelo de negócios da empresa. Durante 25 anos, a família proprietária [José e Rosalinha Lopes] tinha como canal de distribuição somente as praias do litoral de São Paulo. Era um produto de praia feito de maneira artesanal com fruta.
Uma das razões que adquirimos a empresa foi justamente porque carregava esses atributos na sua marca: era vista pelo consumidor de alta renda como uma marca de produto saudável, de fruta pura, que tinha uma memória afetiva enorme com os consumidores.
Desenvolvemos linhas vegana, zero açúcar. A maior razão da compra da empresa talvez tenha sido porque ela já tinha esses valores, e esse é o caminho que o mercado está trilhando sem dúvida nenhuma.
O consumidor da Rochinha, que comprava o picolé na praia, não estranhou essa mudança para um mercado mais premium?
Esse é o barato da história. Rochinha é um caso de uma família lutadora, que "ralou" para construir o patrimônio que construiu, que fez a primeira expansão da marca com todos os méritos de maneira absolutamente empírica. Era uma sorveteria popular do bairro, como eram todas, mas estava em um território altamente sofisticado.
Nasceu no litoral norte de São Paulo, um dos balneários mais sofisticados do Estado. O primeiro foi o Guarujá nos anos 50, 60. Nos anos 90, surgiu o litoral norte que ninguém conhecia Juqueí, Maresias, Camburi, Baleia. Quando as pessoas começaram a frequentar, o Rochinha estava lá, com um carrinho na praia, com uma embalagem simples, mas com um sorvete cheio de coco, abacate feito com abacate, milho verde feito com milho verde, limão com limão espremido.
A família não tinha essa noção clara de que estavam vendendo cada vez mais para o turista que chegava de helicóptero na praia da Baleia. Essa é a memória dos clientes da Rochinha. Eu tenho 53 anos. A primeira vez que fui para lá tinha 17, para surfar com os amigos. Depois eu casei e minhas filhas cresceram comendo Rochinha.
Eu tenho que ter um posicionamento de saudabilidade, sustentar aquela emoção da praia. Só que esse produto quando entra em escala é mais caro do que o da concorrência.
Qual é a produção da Rochinha?
Mais ou menos 50 mil litros de sorvete por mês.
Qual o seu sabor favorito do Rochinha?
É segredo. O sabor que mais vende é o de coco. É a alma da marca. Temos cinco sabores com coco.