UOL - Quais as diferenças que o senhor vê entre o mercado brasileiro e o estrangeiro?
Pedro Meduna - Infelizmente no Brasil ainda não temos uma estrutura de transporte público bem desenvolvido. A história da Cabify é bastante curiosa porque o nosso fundador é um espanhol de uma cidade pequena.
Ele viu que existia uma possibilidade de facilitar a locomoção usando a tecnologia. Mas, seis meses após lançar o aplicativo em Madri, ele veio para a América Latina. Isso porque, o metrô e os ônibus funcionavam tão bem em Madri, que, para uma empresa como a Cabify, o maior potencial estava na América Latina.
No Brasil, as pessoas fazem trajetos mais longos, principalmente em regiões sem metrô. Se o metrô fosse um pouquinho mais avançado, ele iria de metrô todo o trajeto.
O futuro passa por uma integração de modais. Esperamos ter um transporte público eficiente e que as pessoas usem a Cabify ou outras funções tecnológicas que queremos trazer para o Brasil, via aplicativo, como uma opção a mais para ir de um ponto A para um ponto B.
Como estão se preparando para carros autônomos e drones?
O carro autônomo é uma realidade. Tive a oportunidade de ver um deles em uma conferência em São Francisco. Quando você pega um carro do aeroporto para o centro, vê as pessoas mexendo em seus iPads, com a direção se movimentando.
Como presidente de operações no Brasil, eu digo que o país ainda vai tardar um pouco para receber os carros autônomos porque é preciso estrutura e regulamentação.
E consertar muito asfalto ainda?
Ainda falta bastante. A única certeza que temos é que a tecnologia autônoma vai vir e a outra é a elétrica. A matriz de energia vai mudar e vamos ver mais carros autônomos e mais carros elétricos, o que é bom, porque vai de acordo com a visão de sustentabilidade que a Cabify tem.
O crescimento dos trabalhos por aplicativo está diretamente relacionado ao crescimento da informalidade?
Diretamente não. Gosto de separar a informalidade do modelo autônomo que estamos desenvolvendo no Brasil. Se você me perguntar sobre futuro das relações de trabalho, eu acredito que as pessoas terão trabalhos autônomos.
Nossos pais tiveram de um a três empregos, nossa geração de quatro a sete. Nossos filhos terão sete empregos ao mesmo tempo. Porque as pessoas serão cada vez mais donas de seu tempo.
Acredito que o crescimento dos aplicativos de mobilidade no Brasil passa por um excesso de oferta por causa da crise pela qual o Brasil passou, mas do lado da demanda acho que as pessoas estão percebendo que é mais barato mesmo. A explosão de oferta é uma soma de vários fatores, inclusive a crise e o fato de o transporte público ainda não ser tão desenvolvido.
Um comportamento do usuário é muito interessante: muitas pessoas optam por usar aplicativo na quarta, quinta e sexta porque ele pensa que segunda e terça ele pode caminhar, mas depois merece mais comodidade.
Qual a sua opinião a respeito das cidades que adotaram uma regulamentação mais rígida para a operação de aplicativos?
A minha visão é bem simples. Como toda nova economia e toda nova tecnologia que está revolucionando indústrias de diversos segmentos, é importante que surjam novas regulamentações e que haja esse diálogo.
É óbvio que, se você fizer uma regulamentação muito restritiva, haverá efeitos que você nem imagina. Pode aumentar a chance de haver um monopólio, porque o investimento terá que ser muito grande.
Em linhas gerais, nós somos a favor da discussão. No caso brasileiro, já fizemos bastantes avanços. Os reguladores entendem a importância que o setor tem para a economia brasileira, uma melhor mobilidade nos centros melhora muita coisa, reduz trânsito, melhora o crescimento econômico da cidade.
O que o senhor acha de o governo querer cobrar impostos de motoristas e empregadores de apps para fins de aposentadoria?
Eu entendo que o motorista de aplicativo precisa, como todos os outros brasileiros, encontrar formas de contribuir [para a Previdência], mas precisa ser feito escutando os dois lados. É preciso ser feito de maneira gradual, enxergando que os motoristas são, microempreendedores, e facilitando as coisas.
No caso deles, é diferente de um funcionário que tem retenção na fonte. Eles são empreendedores, autônomos, querem contribuir, mas é preciso ser feito de uma maneira que facilite e não crie um impeditivo.
Qual a importância do Brasil para a matriz hoje?
O Brasil é um dos nossos quatro maiores mercados, onde existe uma grande oportunidade, mas também onde há maior competição. Tentamos, em linha com a visão do grupo, rentabilizar o máximo possível. Queremos ser valorizados pelos clientes que focam segurança e qualidade de serviço.
O que o senhor acha da reforma tributária?
A reforma tributária precisa simplificar. Os empresários brasileiros estão cansados da alta carga tributária, mas ao mesmo tempo temos muitos desafios de investimentos. O Brasil cobra muito imposto e investe mal. O governo pode trabalhar nos dois lados.
Deve investir um pouco melhor a arrecadação, mas, no lado da captação, precisa simplificar e ser mais transparente. Em linhas gerais, quando conseguimos simplificar a tributação, trazer mais transparência, acabar com a guerra dos estados, com tributações diferentes. Quanto mais simplificar essa parte e do outro lado, investir melhor, vamos crescer como nação.
O que o senhor achou da reforma da Previdência?
Vínhamos de uma antiga Previdência que partia do pressuposto que tinha muita gente trabalhando e as pessoas estavam vivendo pouco. Mas as pessoas começaram a viver mais e a nascer menos.
Matematicamente se não tivessem feito, o Brasil ia para o buraco. Não iríamos conseguir arrecadar o suficiente para cobrir os custos de Previdência. De maneira prática, foi uma das maiores reformas de Previdência feitas em uma nação democrática. É um fato para se orgulhar.