Investimentos variados

Fundos multimercado investem em várias áreas, mas é preciso saber escolher conforme seu perfil

Colaboração para o UOL, em São Paulo Olivier Le Moal/iStock

Os fundos multimercado são uma opção para quem quer diversificar seus investimentos, mas não tem tempo para ficar pesquisando e mudando suas aplicações toda hora. Por aplicarem em diversos em diversas modalidades, eles são mais flexíveis e trazem oportunidades de um bom ganho.

Mas é preciso escolher bem o fundo para que combine com seu perfil. Se você for um investidor conservador, pode se assustar com a volatilidade (sobe e desce). E mais riscos mesmo. Entenda a seguir como funcionam os fundos multimercado e como escolher o melhor para você.

Possibilidade de investir em vários produtos

Os fundos multimercado dão carta branca para os gestores profissionais decidirem quando entrar e sair de qualquer tipo de investimento e adotar posições alavancadas que podem resultar em ganhos extraordinários se tudo der certo. Também pode haver perdas maiores. Alavancagem é a operação com mais dinheiro do que o aplicador tem para investir. Se tiver prejuízo, tem de cobrir o buraco.

O multimercado realiza investimentos em diferentes áreas: títulos de renda fixa, ações, moedas internacionais, contratos futuros, cotas de outros fundos, entre diversas outras possibilidades de investimento.

É diferente, por exemplo, dos fundos de renda fixa e dos fundos cambiais, que têm a maioria das aplicações carimbada em papéis como títulos públicos e ativos em moedas estrangeiras.

Um exemplo para ilustrar a diferença: num cenário em que os juros da dívida pública estejam pagando menos, e as ações subindo, um fundo multimercado pode fazer a migração de um ativo para outro, algo impossível para o gestor de um fundo de renda fixa, cujo mandato o obriga a manter concentração mínima nos títulos do Tesouro Nacional.

Liberdade para ganhar e perder

Os multimercados propiciam, dessa forma, flexibilidade na definição de como os recursos do fundo serão empregados. Essa liberdade permite a adoção das medidas necessárias para proteger o capital num ambiente de turbulência. Por outro lado, também libera o gestor a expor mais o fundo na busca por melhores retornos a seus investidores.

Trata-se, assim, de um terreno muitas vezes aberto à adoção de estratégias de alto risco, de forma que, longe de representar uma solução mágica, os multimercados devem ser avaliados com bastante cuidado pelo investidor.

Olivier Le Moal/iStock

O primeiro cuidado a se tomar ao avaliar um fundo multimercado é não basear a decisão apenas olhando o retorno passado recente. O ideal é usar um conjunto de informações para, a partir da análise conjunta desses dados, ter uma boa avaliação da qualidade do fundo.

Patricia Palomo, planejadora financeira CFP e conselheira da Planejar

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Estratégia deve ser primeiro ponto de atenção

Ainda que tenham em comum a flexibilidade de investir em diferentes classes de ativos, os fundos multimercado não são todos iguais. Existem diferenças de alocação, que pode ser pré-definida entre as classes de ativos (os chamados fundos balanceados, nos quais também não são admitidas operações alavancadas) ou variar de acordo com as condições de mercados (fundos dinâmicos).

Eles também se diferem nas estratégias, podendo ser classificados como:

  • Livres: fundos que não seguem uma estratégia específica. Entregam ao gestor liberdade total para adotar a estratégia que ele entender ser a mais adequada ao momento
  • Estratégia específica: realizam investimentos com risco específico de mercados como commodities ou futuros de índices
  • Macro: as decisões de investimento são baseadas em cenários macroeconômicos de médio e longo prazo
  • Trading: explora oportunidades de ganhos em movimentos de curto prazo
  • Long and short: fundos que compram ativos ao mesmo tempo em que montam posições vendidas, podendo ter exposição à operação casada limitada a 5% (neutro) ou sem limite (direcional)
  • Juros e moedas: sem exposição em ações, buscam retornos de longo prazo em ativos de renda fixa com risco de juros, de índice de preços e de moeda estrangeira
  • Capital protegido: atuam com proteção total ou parcial do principal investido
  • Investimento no exterior: fundos com pelo menos 40% do patrimônio investido em ativos financeiros do exterior

É fundamental o investidor estar ciente de como o fundo atua para saber onde está pisando e realizar uma seleção a partir de estratégias alinhadas a suas expectativas.

Vale ressaltar que todas as informações importantes para a escolha de um fundo estão disponíveis a qualquer pessoa na ampla documentação e material de divulgação abertos ao público na internet.

A consulta pode começar pela "lâmina", uma espécie de folheto no qual são apresentados, de forma resumida, a política de investimento do fundo, seus gestores, taxas de administração e estatísticas. Essas e outras informações podem ser posteriormente examinadas em maior detalhe pelo investidor no regulamento e no prospecto do fundo.

É necessário ler o regulamento para saber exatamente no que o fundo pode e não pode investir. Esse é o principal cuidado que o investidor precisa ter. Existem fundos multimercado que só operam ações, outros, câmbio, juros e Bolsa, ou investem no exterior. As possibilidades são diversas e confundem o investidor.

Luiz Cesta, chefe da área de análise da Monett

Ao selecionar fundos multimercado, o investidor deve analisar, principalmente, qual é a classe predominante do fundo: se é renda fixa, renda variável ou juros e moedas, por exemplo. Além da classe, o investidor deve compreender qual é a estratégia seguida pelo fundo.

Eliz Sapucaia, da equipe de análise da Terra Investimentos

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Retorno passado não é garantia, mas indica consistência do fundo

A rentabilidade é um critério válido na seleção de fundos multimercado, mas desde que não parta de uma observação baseada apenas no desempenho mais recente —dos últimos 12 meses, por exemplo— ou no retorno acumulado desde o lançamento do fundo.

Segundo assessores de investimento, sinais mais sólidos sobre a consistência dos resultados entregues pelo fundo demandam uma análise mais abrangente do histórico de retornos, ainda que nunca se deva esquecer que os resultados do passado não necessariamente se repetirão no futuro.

Uma boa dica é fragmentar a série histórica em intervalos temporais —como 12, 24 ou 36 meses. A partir daí, é possível averiguar se a rentabilidade é fruto de um período específico ou se, de fato, o fundo consegue entregar retornos superiores ao prometido na maioria das vezes.

Outro ponto de atenção é em como o fundo se comporta em períodos de estresse do mercado e como se dá a sua recuperação posterior. Ao identificar o maior mergulho já dado pelo fundo, o chamado "drawdown", e a demora dele em retomar o patamar anterior, o investidor pode refletir sobre como reagiria se um evento do tipo se repetisse no futuro.

O drawdown é importante para a avaliação do investidor pessoa física porque detalha a perda máxima que um fundo incorreu em seu histórico, e então se compara com a aptidão a risco do investidor.

Luiz Cesta, chefe da área de análise da Monett

Além da queda de retorno incorrida pelo fundo, é importante observar como foi a recuperação depois da queda. Ela foi rápida ou foi lenta? O investidor teria paciência para esperar o tempo de recuperação necessário de acordo com os últimos drawdowns do fundo?

Patricia Palomo, planejadora financeira CFP e conselheira da Planejar

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Retorno pode dizer pouco se fundo for muito volátil

Fundos que realizam investimentos mais arrojados, como operações alavancadas —nas quais o potencial de perdas é desconhecido na falta de mecanismos de trava— tendem a ser menos regulares em seu desempenho.

A volatilidade deve ser, assim, outro ingrediente a ser colocado na análise de risco, já que o resultado impressionante de um fundo pode ter sido obtido após muita oscilação entre altos e baixos. E investidores que priorizam a segurança geralmente têm dificuldade em lidar com tanto vaivém.

É preciso avaliar se o retorno entregue pelo fundo compensa o risco assumido. Afinal, outras opções de investimento podem dar o mesmo resultado por menos estresse. A avaliação aqui deixa de ser, portanto, apenas sobre os resultados e passa a se dar sobre a melhor relação entre risco e retorno.

Resultado de quanto um fundo rende acima de uma taxa de referência a cada unidade de risco tomado, o índice Sharpe —indicador apresentado nas lâminas dos fundos— é a principal referência nessa análise. Os maiores índices de Sharpe mostram ao investidor os fundos com potencial de gerar mais ganhos em relação aos riscos assumidos, ao passo que índices negativos acendem o sinal vermelho, pois indicam que o fundo remunerou no período analisado menos do que investimentos de baixo risco em renda fixa.

O cuidado na seleção deve ser, primeiro, em relação à volatilidade porque o investidor, principalmente o mais conservador, não está acostumado à volatilidade e muitas vezes é seduzido por bons momentos que o fundo mostra.

Lucas Radd, superintendente de portfólio e advisory no Inter

Um fundo que tenha apresentado maior retorno do que outro não necessariamente é melhor quando se considera a eficiência. O fundo mais eficiente é aquele que consegue oferecer o maior retorno possível correndo o menor risco possível.

Patricia Palomo, planejadora financeira CFP e conselheira da Planejar

Riscos silenciosos são muitas vezes ignorados

Mesmo que os índices de Sharpe apresentem resultados altíssimos, os seus resultados não podem ser considerados como definitivos. O indicador, ao se basear na volatilidade, acaba deixando passar em branco outros riscos. É o caso do risco de crédito, um dos "riscos silenciosos" muitas vezes desprezados por investidores.

Fundos multimercado que detêm títulos emitidos por empresas podem oferecer excelentes retornos e baixa volatilidade —portanto, um ótimo Sharpe. Porém, basta uma onda de calote nos títulos carregados para seus rendimentos ruírem.

Estender a análise em direção à carteira do fundo, olhando para a qualidade dos ativos, sua diversificação e alocação, é uma tarefa a ser encarada pelo investidor que quer mesmo estar por dentro dos riscos que irá assumir ao entrar num multimercado.

O mais importante para o investidor é observar a consistência dos retornos ao longo do tempo, ver como o fundo se comporta em períodos adversos e períodos normais.

Fernando Barbedo, diretor de administração de recursos de terceiros da sim;paul

A volatilidade não traduz todos os riscos envolvidos. Um exemplo são os fundos de crédito privado, que podem apresentar baixíssima volatilidade e Sharpe elevado, mas este indicador não quantifica o risco de crédito.

João Lux, head comercial da CM Capital

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Volatilidade alta, exposição baixa

Quanto maior for a volatilidade de um fundo, menor deve ser a exposição do investidor, sendo que fundos mais arrojados de alta volatilidade, ainda que possam entregar bons retornos no longo prazo, são contraindicados a investidores conservadores.

Hoje, a indicação de consultores financeiros a investidores conservadores é manter exposição de não mais do que 15% em fundos multimercado, porém desde que a volatilidade deles seja de no máximo 3% ao ano —ou seja, um fundo de baixa volatilidade.

Para investidores de perfil moderado, mais propensos a encarar o sobe e desce dos investimentos, é possível elevar a participação para até metade da carteira (50%), ou 25% se o fundo for muito volátil (volatilidade de 13% ao ano).

De início, o investidor conservador deve evitar expor uma parcela relevante do seu patrimônio em fundos com alta volatilidade histórica, independente da classe. Em relação aos multimercados, os que devem ser bem dosados são os fundos com alto nível de alavancagem e alta exposição em ações ou derivativos (exceto para proteção), além dos que possuem títulos de crédito privado com baixa classificação de rating.

Felipe Wada, diretor de Fundo de Fundos da Infinity Asset

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Resgate pode levar meses

Quem entra em fundos multimercado deve estar atento ao período, que pode ser longo, para resgatar o investimento.

Variando de caso a caso, o pagamento pode ser feito no dia seguinte, porém, não raro, também pode se dar após dez, 30 ou até mesmo 90 dias do pedido de resgate.

Pode acontecer de o fundo estar posicionado em ativos de pouca liquidez, de maneira que é preciso tempo para o gestor encontrar um comprador às posições do cotista que está deixando o fundo.

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Tamanho do fundo traz vantagens e desvantagens

Na avaliação do tamanho, fundos com os maiores patrimônios têm maior capacidade financeira de diversificar investimentos e sua popularidade pode ser um bom sinal de que suas aplicações são bem-sucedidas.

Por outro lado, os grandes fundos sofrem com limitações para investir em ativos pouco negociados mas de alto potencial de valorização —como boas ações small caps—, dado que a escala de suas movimentações levaria à distorção de preços. Um grande fundo obrigado a liquidar small caps da carteira para saldar resgates de cotistas derrubaria o valor dessas ações, prejudicando os demais investidores que continuassem no fundo.

Nesse ponto, os fundos menores têm maior flexibilidade de entrar em operações menores, porém, podem encontrar maior dificuldade em reter bons gestores, em razão da menor receita paga por eles, assim como podem ver o patrimônio ficar ainda menor se um cotista relevante deixar o fundo.

Assim, recomenda-se observar se o patrimônio do fundo é distribuído entre vários cotistas, de forma que a saída de qualquer um deles não tenha impacto relevante na estratégia, como obrigar o gestor a liquidar posições antes da hora por falta de caixa suficiente para pagar o investidor dissidente. Quanto mais o capital estiver pulverizado entre investidores do fundo, melhor.

Sitthiphong/iStock

Olho em quem vai cuidar do dinheiro

Por fim, porém não menos importante, investidores que entram em fundos devem se preocupar em conhecer seus gestores. Se toda a decisão de investimento será transferida, nada mais coerente do que saber quem tomará conta do dinheiro.

Além do básico, como conferir se a gestora e o administrador do fundo estão devidamente credenciados em órgãos fiscalizadores como a Comissão de Valores Mobiliários (CVM) e a Anbima, cabe pesquisar os currículos dos gestores e os resultados de trabalhos anteriores realizados por eles.

Mesmo se o fundo for novo, é possível analisar o histórico dos gestores. Inclusive, é natural que gestores de fundos novos coloquem informações sobre sua performance anterior, mesmo que seja em outro fundo.

Eliz Sapucaia, da equipe de análise da Terra Investimentos

É comum fundos que apresentaram histórico de retorno muito bom com uma determinada equipe passarem a ter outro comportamento após parte relevante dessa equipe deixar a gestão. Observar quem são as peças-chave da instituição e qual estrutura para mantê-las na equipe também é relevante na hora de escolher um fundo para investir.

Patricia Palomo, planejadora financeira CFP e conselheira da Planejar

O ideal é estudar o histórico do gestor, da equipe de análises, há quanto tempo trabalham juntos...

Lucas Radd, superintendente de portfólio e advisory no Inter

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