Sinal verde para os FIIs

Fundos imobiliários estão mais baratos após novela sobre isenção; veja dicas e estratégias para investir

Colaboração para o UOL, em São Paulo

Não é de hoje que os fundos de investimento imobiliário (FIIs) vêm sendo negociados a preços atraentes. Agora, as oportunidades aumentaram a partir de uma decisão da CVM que assegurou rendimentos livres de Imposto de Renda mesmo quando os FIIs têm prejuízo contábil, ou seja, quando os custos ficam acima da receita captada.

Mas, até a decisão ser tomada, foram quase quatro meses de indefinição sobre a isenção de proventos de certos FIIs. Isso fez com que bons fundos imobiliários tivessem descontos, e muitos ainda não retornaram aos valores de antes. Para o investidor, é a chance de pagar pechinchas em um dos mercados considerados mais atraentes da Bolsa neste momento.

Novela estrelada pela CVM gerou descontos nos fundos

A indefinição sobre os FIIs teve início no fim de janeiro, quando a CVM (Comissão de Valores Mobiliários), responsável por ditar as regras dos investimentos em Bolsa, decidiu que apenas o lucro contábil dos fundos imobiliários poderia ser distribuído na forma de dividendos, que não pagam Imposto de Renda.

Assim, se um fundo tivesse dinheiro em caixa para remunerar os seus cotistas, haveria, então, cobrança de impostos nos valores distribuídos que ultrapassassem o lucro contábil ou quando os FIIs tivessem prejuízo contábil.

Houve reação à divulgação da regra e com isso abriu-se uma indefinição. Com o suspense, alguns deles passaram a ser negociados abaixo do que deveriam valer, considerando seus patrimônios e potencial de valorização.

Para entender como essa resolução da CVM impactou os fundos imobiliários, é preciso compreender como esse mercado funciona e está organizado.

Ao investirem, principalmente, em prédios de escritórios (lajes corporativas), shopping centers e centros de distribuição (galpões logísticos), os fundos fazem dinheiro com o aluguel e, eventualmente, a venda desses imóveis. O resultado, já com os descontos das taxas pagas a gestores e administradores dos fundos, é distribuído todo mês aos investidores dos FIIs em dividendos, que podem ser comparados à renda de um aluguel.

Nem todos os fundos investem, no entanto, diretamente nos imóveis. Muitos, na verdade, compram na Bolsa cotas de fundos imobiliários. São os chamados FoFs, sigla em inglês para os fundos de fundos (Funds of Funds).

A diferença entre as categorias tem reflexo nos balanços contábeis porque os FoFs não são exatamente donos dos imóveis, cujos preços são mais estáveis, mas, sim, de cotas que oscilam a depender do humor dos investidores da Bolsa. Isso faz com que, em momentos de nervosismo no mercado, resulte em prejuízo na hora em que o patrimônio é reavaliado.

Assim, os FoFs foram os mais castigados pelo anúncio da CVM. Embora os rendimentos pagos pelos fundos de sua carteira não tenham parado de entrar no caixa, muitos deles apresentam prejuízo contábil, dada a desvalorização de suas cotas no mercado.

Em 17 de maio, contudo, a CVM voltou atrás, autorizando novamente esses fundos a distribuir dividendos isentos, abrindo assim o caminho para a recuperação das perdas no período em que a insegurança jurídica assustou os investidores.

Acreditamos que após o último posicionamento da CVM, a questão foi definitivamente apurada e consolidada. O assunto pode ser considerado como resolvido.
Alcides Gimenes Lopes Junior, gestor da JPP Capital

A decisão da CVM não deve ser revertida e vai trazer mais segurança jurídica, além de maior transparência por parte dos fundos em relação à distribuição dos dividendos.
Vitor Bidetti, sócio-fundador e CEO da Integral BREI

Para consultores financeiros consultados pelo UOL, mesmo que o mercado de fundos imobiliários já tenha, em geral, voltado ao patamar de antes desse "vai ou não vai" do regulador, ainda é possível encontrar FIIs que continuam com preços mais baratos, sobretudo entre os tais fundos de fundos.

Isso traz ao investidor a oportunidade de não só buscar ganhos de curto prazo com a correção de preços das cotas, como entrar nesses ativos com maior segurança — afinal, já estão descontados — e com maior retorno dos dividendos em relação ao investimento.

Os FOFs, que já estavam subprecificados, sofreram mais do que a média durante o caso. Agora que a questão foi solucionada, eles voltam a se posicionar como um segmento com diversas opções e forte desconto.

Ricardo Figueiredo, especialista em fundos de investimento imobiliário da Spiti

A decisão final da CVM abre espaço para uma forte recuperação dos FoFs. Muitos dos ativos dentro de suas carteiras continuam subvalorizados.

Regis Dall'Agnese, diretor da RB Capital Asset

Distorções de curto prazo, somadas a fundamentos positivos de diversos segmentos imobiliários, representam a chance de pagar preços atraentes em ativos que podem render a longo prazo.

Vitor Bidetti, sócio-fundador e CEO da Integral BREI

Fundos estão valendo menos do que seus patrimônios

Diversos fundos de tijolo — aqueles que investem em imóveis físicos, e não em títulos que financiam a construção de imóveis — estão valendo hoje menos de que os seus patrimônios, em um sinal de que podem estar baratos. A diferença chega a variar entre 10% e 30%.

O momento é oportuno para o investidor, sempre dependendo, claro, de seu perfil.

Percebemos os FIIs de tijolo ainda com bastante desconto em relação ao valor patrimonial. Isso sinaliza uma oportunidade para o investidor que mira o médio e longo prazo. Ele tem a chance de comprar portfólios e excelentes ativos com 10% a 30% de desconto em relação ao que valem.
Stephanie Camacho, sócia e relações com investidores da RBR Asset

Mesmo com a escalada dos juros, os fundos imobiliários também não deixaram de entregar retorno atraente a quem abre mão da segurança dos investimentos de menor risco em renda fixa. Em geral, o prêmio pago pelo risco de investir nos FIIs está acima da média histórica.

O retorno obtido com os dividendos de fundos que investem em escritórios, por exemplo, está atualmente 3 pontos percentuais acima do pago por títulos do governo que garantem ao investidor renda fixa com correção da inflação. Conforme dados da Spiti, uma casa de análises, esse número é mais do que a diferença média, ao redor de dois pontos, dos últimos quatro anos.

Trocando em miúdos, a cada R$ 100 mil investidos, os fundos de lajes corporativas pagam por mês R$ 250 a mais do que os títulos do Tesouro, tendo como base de comparação o Tesouro IPCA+ com vencimento em 2035.

Os FIIs deveriam ser o primeiro passo do investidor no mundo da renda variável, pois apresentam menor volatilidade do que as ações. Acho saudável que representem entre 10% e 15% da carteira global do investidor. A boa notícia é que os principais grupos de FIIs de tijolos hoje negociam com spread [diferença com as taxas do Tesouro IPCA+] acima da média histórica.

Ricardo Figueiredo, especialista em fundos de investimento imobiliário da Spiti

O momento oferece ótimas oportunidades, poucas vezes encontradas no mercado de fundos imobiliários. Por isso, temos como adequado uma exposição maior que a habitual para essa classe de ativos, sempre respeitando o perfil de risco do investidor.

Alcides Gimenes Lopes Junior, gestor da JPP Capital

Fundos de tijolo em geral, FoFs e fundos de crédito estão todos com spreads muito atrativos. Quando os juros voltarem a cair, serão ainda mais representativos em termos de retorno real e de ganho de capital para os investidores.

Regis Dall'Agnese, diretor da RB Capital Asset

Diversificação é aliada contra o sobe e desce dos fundos

Embora muita gente acredite que comprar imóveis significa retorno garantido, o investidor precisa ter claro que está colocando os pés no terreno da renda variável ao entrar em fundos imobiliários.

A depender de riscos políticos e crises internacionais, os investimentos podem subir e cair todo dia na Bolsa, ainda que não na mesma intensidade das ações.

Além disso, é preciso saber que os dividendos distribuídos pelos FIIs não são tão previsíveis como a renda de um aluguel, já que também mudam mês a mês dependendo de variáveis como imóveis vagos, inadimplência dos inquilinos e reajustes contratuais.

Então, como em todo investimento, a diversificação é aliada na busca por um portfólio imobiliário menos vulnerável a instabilidades. Se não for possível escapar dos riscos que acabam pegando todo o mercado, o investidor pode, ao menos, enfrentar os riscos particulares do negócio imobiliário combinando fundos que atuam em diferentes setores.

Ao juntar FIIs de cada um dos principais segmentos (lajes corporativas, shoppings e galpões logísticos), vale investir mais naqueles com maior potencial de valorização nas cotas, ou cujos dividendos são maiores, evitando a concentração em apenas um deles.

Entrar em mais de um fundo dentro de um mesmo segmento também é válido, uma vez que, embora estejam no mesmo mercado, os imóveis terão regiões, inquilinos e tipos de contratos diferentes.

A alocação ideal depende de cada investidor e de suas preferências. Cada segmento está em um momento diferente de ciclo, e cabe ao investidor analisar quais têm maior potencial de crescimento, além de suas dinâmicas de risco e retorno.
Vitor Bidetti, sócio-fundador e CEO da Integral BREI

Os FoFs, por investirem em uma grande variedade de fundos e segmentos, são uma opção interessante a quem não tem dinheiro ou tempo para entrar em muitos fundos imobiliários. Mas mesmo nesse caso, cabe considerar mais de um FoF para não ficar amarrado a um único gestor e estratégia de investimento.

De maneira geral, os FIIs apresentam oportunidades de investimentos, visto os altos descontos patrimoniais e suas características de proteção natural contra a inflação. O cenário atual dos FIIs indica um ciclo no médio prazo de valorização e ganho de capital.

Vitor Bidetti, sócio-fundador e CEO da Integral BREI

Fundos de papel ajudam a reduzir volatilidade

Os fundos que investem em títulos que financiam as construções de imóveis, chamados de fundos de papel ou fundos de crédito, também são um ingrediente a ser avaliado pelo investidor na construção de uma carteira de ativos imobiliários equilibrada.

Como esses títulos pagam juros em qualquer situação do mercado (ou seja, são renda fixa), os fundos de papel são mais regulares na distribuição de dividendos, o que também leva a uma menor oscilação de suas cotas na Bolsa.

Assim, são fundos que ajudam a diminuir os altos e baixos dos investimentos imobiliários, oferecendo também diversificação por carregarem títulos de diferentes emissores (entre construtoras e bancos), e indexadores (inflação ou CDI). Também permitem acesso aos títulos mais rentáveis, já que os fundos conseguem entrar em ofertas reservadas a grandes investidores.

É prudente, no entanto, dar preferência a fundos que carregam em seus portfólios os títulos com as melhores notas de crédito, principalmente nesse momento em que o aumento dos juros eleva o risco de inadimplência no mercado de crédito privado.

Bons fundos de recebíveis imobiliários estão num momento excepcional em questão de risco versus retorno. O investidor tem a chance de acessar operações com estruturas de garantia real muito bem localizadas, pagando inflação mais 6% a 9% ao ano.

Stephanie Camacho, sócia e relações com investidores da RBR Asset

Fundos de crédito são uma opção interessante, mas vale um bom estudo sobre o portfólio de cada um. No curto prazo, naturalmente eles se beneficiam de correções da alta inflação e da taxa de juros. Mas há também o outro lado da moeda, que é o aumento dos riscos de inadimplência.

Fabio Carvalho, sócio da gestora Alianza

Fundos de crédito possuem volatilidade menor do que FIIs de tijolo. Portanto, ao serem incluídos em uma carteira de FIIs, reduzem a volatilidade do portfólio.

Ricardo Figueiredo, especialista em fundos de investimento imobiliário da Spiti

Evitar concentração e como alocar

O investidor pode calibrar o peso de cada um dos FIIs em sua carteira de acordo com o momento do mercado. No cenário atual de inflação persistente e alta dos juros, os fundos de crédito se tornaram o queridinho do mercado, e os que têm mesmo entregado os melhores retornos.

No entanto, os fundos que investem em shoppings e escritórios voltaram a ganhar espaço em portfólios de gestoras, dada a maior mobilidade nas cidades após as pessoas se vacinarem contra a covid. Esses fundos, segundo especialistas, merecem a atenção do investidor porque também estão entre as opções do mercado imobiliário com o melhor preço de entrada.

É preciso observar, no entanto, que os fundos de tijolos ainda podem passar por instabilidade de curto prazo, uma vez que os juros da renda fixa podem subir mais do que o esperado, reduzindo assim a atratividade dos FIIs.

Em função das pressões inflacionárias e da alta de juros, gostamos hoje dos fundos de papel, mas acreditamos em uma migração para fundos de shoppings e lajes corporativas de alto padrão.

Alcides Gimenes Lopes Junior, gestor da JPP Capital

As alocações dependem muito do momento de mercado, da situação de cada categoria de ativos e de oportunidades específicas. Não é um processo estanque, mas sim dinâmico e precisa ser revisado regularmente.

Regis Dall'Agnese, diretor da RB Capital Asset

Cada investidor deve avaliar como se sente mais confortável na distribuição de seus investimentos. Não há uma fórmula mágica. Mas um fundamento é certo: ativos descontados sempre tendem a voltar para os seus preços justos.

Fabio Carvalho, sócio da gestora Alianza

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