Investir em empresa engajada

Cresce interesse por fundos baseados nos pilares ESG, com preocupação ambiental, social e de governança

Paula Pacheco Colaboração para o UOL, em São Paulo Getty Images/iStockphoto

A sociedade tem cada vez mais se mobilizado em torno de temas sociais e ambientais, seja nas redes sociais ou na forma que escolhem as marcas de seus produtos.

Na esteira desse novo comportamento, cresce o interesse por investimentos que seguem os chamados princípios ESG —iniciais, em inglês, para ambiental, social e de governança.

São voltados a quem busca investimentos sustentáveis e socialmente responsáveis em empresas que incluem em sua missão o respeito tanto a normas ambientais quanto de gestão.

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Tendência de melhor desempenho

  • Por quê?

    Em tese, empresas que valorizam as práticas ESG podem ter melhores resultados do que aquelas que viram as costas para o tema. São duas as principais razões.

  • 1.

    Primeiro, porque as companhias que se pautam por boas práticas sociais, sustentáveis e de gestão têm menos chance de esvaziar o caixa em disputas legais relacionadas a queixas trabalhistas, danos ambientais, fraudes ou envolvimento com corrupção.

  • 2.

    Além disso, há uma identificação cada vez maior entre os consumidores, principalmente das gerações X e Y, e esses assuntos. A preocupação crescente em saber como uma empresa produz e o que está sendo levado para dentro de casa podem impactar tanto na decisão de compra (ou seja, no faturamento da companhia) quanto na escolha do melhor investimento.

  • Até na crise

    Quem acompanha de perto o mercado financeiro acredita que esse perfil de investimento pode ser mais atraente em tempos de crise mundial, como se vê agora, com a pandemia do novo coronavírus.

Mercado engatinhando no Brasil

No Brasil, ainda são poucos os fundos lastreados em ESG, mas esse perfil tem mudado. No mundo, a indústria é gigante. Estimativa da Climate Bonds Initiative (CBI) aponta para uma previsão de US$ 257,5 bilhões em emissões de títulos de dívidas voltados ao ESG, um crescimento de 36% em comparação ao desempenho de 2019.

Os compromissos das empresas podem passar por temas como uso de recursos naturais, remuneração de executivos ou combate à fraude.

Esse tema ainda está em evolução no Brasil. Hoje já é possível contar com mais informações sobre o que as empresas têm feito e novas metodologias vão surgindo para facilitar esse acompanhamento

Sandra Blanco, estrategista-chefe da Órama Investimentos

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Grande potencial de crescimento

Na União Europeia, passa a valer a partir de 2021 uma nova regra para fundos que quiserem se vender como ESG. Foi criado um sistema de classificação das finanças sustentáveis. Quem não atender aos critérios preestabelecidos, fica de fora da chamada "taxonomia verde", o que deverá levar muitos gestores a fazerem uma revisão de seus fundos.

Os tomadores de decisão do mercado de capitais estão atentos a esse movimento. Em evento do Banco Central sobre responsabilidade socioambiental, Larry Fink, CEO da BlackRock, uma das maiores gestoras de recursos do mundo, disse em videoconferência que fatores ligados a ESG serão integrados em todos os investimentos nas próximas décadas. E lembrou que os riscos climáticos já são mal precificados pelo mercado.

Gestor de patrimônio da Vitreo, George Wachsmann acredita que o mercado de capitais brasileiro ainda vive uma mudança geracional e que cada vez será mais comum aos novos investidores incluírem em suas carteiras fundos alinhados ao ESG.

O ESG é um filtro que vai ajudar as pessoas a tomarem decisões sobre consumo e investimentos. Quem não tiver isso em mente será cada vez mais cobrado pela sociedade.
George Wachsmann, gestor de patrimônio da Vitreo

Professor de Finanças do Insper, Ricardo Rocha avalia que o investidor pessoa física vai se interessar cada vez mais por esse perfil de ativo. Hoje, na sua opinião, o envolvimento com temas ambientais, sociais ou de governança já tem um peso na tomada de decisão.

Duas empresas podem ter um rating triple A. Se os investidores tiverem certeza de que uma é totalmente sustentável e a outra deixar dúvidas, a primeira levará vantagem porque vai apresentar menos risco.
Ricardo Rocha, professor de Finanças do Insper

Como são os fundos ESG

Os perfis dos fundos de ESG são variados. O valor mínimo de investimento é de R$ 100, mas os gestores têm recomendado a diversificação nessa modalidade também para quem tem mais recursos.

No caso de fundos de ações, a recomendação é não movimentar os recursos antes de 12 meses, por ser uma aplicação com perfil de longo prazo.

Cabe aos gestores que escolhem a alocação dos recursos o monitoramento das empresas que compõem os fundos ESG para saber se de fato os compromissos assumidos estão sendo cumpridos ou estão apenas no papel. Mas os investidores podem tomar alguns cuidados (leia mais adiante).

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Funciona na base da autodeclaração

Não existe no Brasil algum tipo de auditoria independente que certifique que uma empresa é ESG. Funciona na base da autodeclaração, normalmente embasada na publicação de relatórios socioambientais.

Por isso, até mesmo companhias que atuam em setores mais expostos a problemas ambientais, sociais e de governança podem declarar que adotam os princípios ESG, como petroleiras, frigoríficos, aéreas e mineradoras.

Fundador e sócio da Fama Investimentos, Fabio Alperowitch explica que essa pode ser uma forma de o investidor pessoa física analisar se o fundo que está sendo oferecido como ESG tem, de fato, empresas que abraçam esses compromissos.

O mercado financeiro elegeu duas métricas para considerar as empresas ESG, a sua emissão de carbono e a equidade de gênero. Mas se o investidor focar apenas em CO2 e a participação feminina em uma empresa, que são dois assuntos do momento, corre o risco de não identificar outras transgressões.

Fabio Alperowitch, fundador e sócio da Fama Investimentos

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Outras formas de investir em boas práticas

Apesar de poucas opções para os investidores brasileiros, há um movimento no mercado que mostra a atratividade do tema. No último dia 8 de setembro, a Bolsa brasileira B3 e a S&P Dow Jones (maior provedor de índices do mundo) lançaram o índice S&P/B3 Brasil ESG. O indexador adota critérios baseados no ESG para selecionar empresas brasileiras para sua carteira.

Índice de Sustentabilidade da Bolsa

A B3 tem experiências anteriores na área, que também são alternativas para quem busca um investimento ancorado em boas práticas. Em 2005, adotou o Índice de Sustentabilidade Empresarial (ISE), que analisa as empresas listadas na bolsa sob o critério de sustentabilidade corporativa.

Hoje, integram o ISE um total de 36 ações, de 30 empresas. Só integra a carteira a companhia que cumprir um pacote de exigências atreladas à sustentabilidade corporativa com base em governança, justiça social, eficiência econômica e equilíbrio ambiental.

Para o sócio da Fama, no entanto, esses critérios estão defasados e carecem de atualizações.

Índice Carbono Eficiente

Existe ainda Índice Carbono Eficiente (ICO2), composto por ações das empresas que integram o índice IBrX-50 e que adotam práticas transparentes quanto à emissão de gases de efeito estufa.

Outros ETFs

Entre os ETFs (fundos baseados em índices) atrelados à sustentabilidade e governança corporativa há ainda o Índice de Ações com Governança Corporativa Diferenciada (IGC); Índice de Governança Corporativa Trade (IGCT); Índice de Governança Corporativa - Novo Mercado (IGC-NM); Índice de Ações com Tag Along Diferenciado (ITAG); e Índice CDP Brasil - Resiliência Climática (ICDPR-70).

Saiba o que avaliar antes de entrar em um fundo ESG

  • 1.

    O fundo não deve ter empresas de setores que tradicionalmente não têm atividades sustentáveis, como aquelas que atuam nos setores de mineração, petroquímica e de frigorífico

  • 2.

    O investidor deve investigar se aquele produto foi montado para ser ESG ou se era um fundo já estruturado e que apenas mudou de nome, ou seja, passou apenas por uma maquiagem

  • 3.

    Vale investigar qual é o nível de conhecimento do gestor sobre ESG. Como o tema entrou "na moda", muitos produtos têm surgido no mercado, mas não necessariamente estão nas mãos de gestores experientes na área

  • 4.

    Como no Brasil os índices de sustentabilidade do mercado de capitais, no geral, são antigos e defasados, a sugestão é evitar investir em ETFs (fundos de índices) atrelados ao tema

  • 5.

    O investidor pode investigar se as empresas que fazem parte de um fundo ESG são signatárias do PRI, ou Princípios para o Investimento Responsável, da Organização das Nações Unidas (ONU) e há quanto tempo isso aconteceu. Se foi algo muito recente, pode ser indício de que aquela companhia ainda não tem o tema incorporado à sua cultura

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